19 Fevereiro 2025
"A esperança transforma a vida, não é um tratado teológico, mas tem sólidos fundamentos teológicos, não é um simples panfleto escrito porque a esperança é o tema do momento, mas é um guia precioso para aqueles que não querem reduzir o jubileu a um mero turismo religioso".
O artigo é de Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Stampa, 15-02-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Esta é uma época caracterizada por um forte senso de precariedade do presente e da incerteza do futuro, uma época em que o desconhecido que está diante de nós nos assusta por sua imprevisibilidade e, ao mesmo tempo, pelos horizontes apertados que o caracterizam: o nosso é um “mundo em fuga”, como Anthony Giddens o definiu, um mundo que parece escapar ao nosso controle e nos impede de entender para onde estamos indo. Essa situação provoca uma profunda angústia, que também parece ser confirmada por uma rápida olhada nas situações de guerra, miséria e opressão que ocorrem em várias partes do mundo.
Por outro lado, não se deve esquecer que este é também o tempo vivido por aqueles que, como tantos homens e mulheres de minha geração, viveram uma grande temporada de esperança humana e cristã; hoje, porém, as ideologias políticas para alguns e as utopias sociais para outros desvaneceram, enquanto as expectativas despertadas nos cristãos pelo Concílio Vaticano II parecem em grande parte ter sido frustradas.
As esperanças em um mundo mais marcado pela paz e pela justiça, em uma igreja mais evangélica, parecem serem desmentidas; ao contrário, em nossa vida cotidiana somos obrigados a suportar, com certa impotência, a disseminação da barbárie, que também invade a esfera privada: a banalização dos temas da justiça e da legalidade, a justificação da desigualdade, a glorificação do mais forte, a rejeição de qualquer horizonte comunitário, a exaltação da competição selvagem, a lei da força substituindo a força da lei, e assim por diante.
Este é um momento de grande depressão, e no mundo, como a maioria dos sociólogos observa, há uma falta de esperança, o impulso em direção ao futuro é fraquíssimo. Devemos confessar: não apenas a fé em Deus desapareceu, mas também a confiança entre nós, humanos, e quando a confiança uns nos outros desaparece, a esperança no futuro, na sociedade, desaparece e, pouco a pouco, também vemos o amor desaparecer.
Mas o ser humano, diferentemente de todos os animais, sabe ter esperança. Homo viator spe erectus. Gosto de pensar nessa frase em latim que, em minha opinião, também enfatiza que o ser humano tem peso e estatura que se erguem em nome da esperança: de pé, ele olhou para frente e para cima! Todos perseguem a esperança todos os dias, e justamente porque a esperança é uma experiência universal, é necessário buscar e verificar como ela se expressa e com que conteúdos pode ser realizada.
Rino Fisichella, teólogo e pró-prefeito do Dicastério para a Evangelização, dedica-se a essa busca no ensaio La speranza trasforma la vita [A esperança transforma a vida]. A reflexão do autor parte do pressuposto de que é experiência comum do homem ter esperança, independentemente de ser crente ou ateu: “O homem tem esperança porque a esperança é, acima de tudo, um sentimento que é vivido e percebido como fenômeno humano; é fruto da experiência e, como tal, se impõe por si só para além dos esquemas preestabelecidos”. A esperança é percebida como uma expectativa e um desejo pelo bem, desperta sentimentos de confiança e alegria e traz em si as conotações de alguma certeza de realização. Quando se espera, o desejo é elevado a outro patamar, a ponto de perder todo o poder sobre o objeto esperado. A realização da esperança não nos pertence, não depende de nós, o ato de esperar nos destitui do que é esperado.
Assim, o tema da esperança está intrinsecamente ligado ao da ilusão e da decepção: “a decepção que se segue a toda ilusão não realizada”, escreve Fisichella, “torna-se o instrumento útil e necessário para orientar o nosso olhar para o que a esperança realmente oferece”. Daí a necessidade de colocar no centro a esperança além das esperanças. E esse é o tema do jubileu deste ano: o Papa Francisco, atento a perceber as mudanças dos tempos, convida os cristãos em primeiro lugar, mas também todos os seres humanos, a renovar a esperança. Fisichella repercorre a mensagem do apóstolo Paulo para quem a verdadeira esperança não decepciona, uma mensagem que o Papa assumiu para si, lembrando na Bula de proclamação do Jubileu que “a esperança cristã, efetivamente, não ilude nem decepciona, porque se fundamenta na certeza de que nada nem ninguém poderá nos separar do amor divino... A esperança, de fato, nasce do amor e se fundamenta no amor”. Sim, somente a esperança dá ao amor o tempo para florescer.
A esperança transforma a vida, não é um tratado teológico, mas tem sólidos fundamentos teológicos, não é um simples panfleto escrito porque a esperança é o tema do momento, mas é um guia precioso para aqueles que não querem reduzir o jubileu a um mero turismo religioso. O ensaio de Fisichella nos ajuda a abrir os olhos: vivemos de pequenas esperanças porque não ousamos esperar o inesperado. Heráclito sentenciou: “Quem não espera o inesperado, não o encontrará” (Fragmentos 18).
Não nos perguntamos mais o que podemos esperar, mas se ainda esperamos por algo, já que nossos desejos não são mais nossos, nossos corpos não são mais nossos, nossas vidas não são mais nossas: outros nos sugerem o que desejar, o que fazer dos nossos corpos, que vida viver. Só vemos o que nos é mostrado. Nossos olhos se tornam cegos, nossos ouvidos se fecham, nossas bocas não falam mais livremente. Achamos que somos livres e somos prisioneiros. Presos no medo de perder o que acreditamos possuir. As modas da política, os multiformes conformismos sociais, as ideologias fáceis que prometem tudo e não entregam nada, recortam para nós uma existência à qual nos submetemos de bom grado. Do esquecimento do século dos totalitarismos, do esquecimento do Gulag, de Auschwitz, de Hiroshima, insensivelmente, fomos escorregando para o hábito confortável que aceita os conflitos mais sangrentos, o genocídio, as mentiras de Estado, nos protegemos da catástrofe climática por trás das previsões meteorológicas. A guerra entrou na vida cotidiana de milhões de pessoas, voltou a ser uma hóspede regular nos noticiários, nos canais sociais, nas conversas entre amigos. Seu estrondo ecoa no fundo de nossos pensamentos. A esperança tomou o caminho do exílio. Em seu lugar, o medo ocupa a nossa casa comum.
O ensaio de Rino Fisichella mostra como os cristãos são aqueles que podem prestar conta da esperança que existe dentro deles. Eles não têm a exclusividade do esperar, mas compartilham a luta pela esperança que está na base de toda aventura humana. “Assim como talvez não haja, dizem os médicos, ninguém completamente são” observava Kierkegaard, “também se poderia dizer, conhecendo bem o homem, que nem um só existe que esteja isento de desespero”.
A esperança, diz Charles Péguy na famosa imagem, pega pela mão suas irmãs mais velhas, a fé e o amor, e dança diante delas: é a infância que sempre se renova, que sempre recomeça obstinadamente com a inaudita audácia dos pequenos, perpétuo renascimento, contínuo assombro. Sem esperança, a fé se torna ideologia, o amor posse e dominação. Sem esperança, mesmo a fé mais inabalável corre o risco de se apegar à intolerância, a caridade mais ardente se enfraquecer. “A fé da qual não nasce a esperança”, escreve a poetisa russa Olga A. Sedakova – o amor que permanece alheio à esperança, já é outra coisa, não se trata mais de imagens ou significados cristãos”.