01 Dezembro 2023
Durante a audiência com os membros da Comissão Teológica Internacional, Francisco entregou-lhes o discurso preparado e, de forma espontânea, reiterou a importância da contribuição das mulheres para a reflexão teológica: "Se não soubermos o que é a teologia da mulher, nunca entenderemos o que é a Igreja". No texto preparado, o Papa pede "uma teologia evangelizadora" em diálogo com a cultura e o povo.
A reportagem é publicada por Vatican News, 30-11-2023.
"A Igreja é mulher". E "um dos grandes pecados que cometemos é 'masculinizar' a Igreja". Devemos "desmasculinizá-la" e fazê-lo a partir da teologia. O Papa se reuniu com os membros da Comissão Teológica Internacional, o órgão criado por Paulo VI na então Congregação para a Doutrina da Fé em 1969 - uma proposta da primeira assembleia do Sínodo dos Bispos - para ajudá-la a examinar as questões doutrinárias mais importantes.
Recuperando-se da inflamação em seus pulmões, o Papa entregou o discurso preparado: "Há um belo discurso aqui com aspectos teológicos, mas do jeito que estou, é melhor não lê-lo", disse Francisco. De modo espontâneo, no entanto, o Santo Padre compartilhou alguns pensamentos para reiterar a importância da reflexão teológica e agradecer à Comissão por seu trabalho. O Papa fez questão de expressar uma observação: "perdoem minha sinceridade!" - devido à escassa presença de mulheres no grupo:
"Uma, duas, três, quatro mulheres: coitadas! Elas estão sozinhas! Ah, desculpe-me: cinco! Mas, quanto a isso, devemos seguir em frente."
As mulheres "têm uma capacidade de reflexão teológica diferente da que nós homens temos", enfatizou o Papa, lembrando seus estudos dos livros de "uma boa mulher alemã", a filósofa e escritora Hanna-Barbara Gerl, sobre Romano Guardini. "Ela havia estudado essa história e a teologia dessa mulher não é tão profunda, mas é bela, é criativa".
A "dimensão feminina da Igreja", acrescentou o Pontífice, ainda falando de improviso, "também estará no centro dos próximos trabalhos do C9", o grupo de cardeais que auxilia o Papa no governo da Igreja. O tópico é, portanto, central porque "a Igreja é mulher".
“Se não entendermos o que é uma mulher, o que é a teologia de uma mulher, nunca entenderemos o que é a Igreja. Um dos grandes pecados que cometemos foi "masculinizar" a Igreja.”
"Isso não é resolvido pela via ministerial; isso é outra coisa", enfatizou o Papa Francisco, referindo-se às discussões sobre o sacerdócio feminino. "É solucionado pela via mística, pela via real", afirmou. Em seguida, o Papa reforçou o "princípio petrino e o princípio mariano" da matriz balthasariana que lhe deu "tanta luz". "Pode-se discutir isso, mas os dois princípios estão lá. É mais importante o mariano do que o petrino, porque há a Igreja como noiva, a Igreja como mulher, sem se tornar masculina", observou Francisco.
“E vocês podem se perguntar: para que serve esse discurso? Não apenas para dizer que devemos ter mais mulheres aqui - este é um ponto - mas para ajudá-los a refletir. A Igreja é mulher, a Igreja é noiva. E essa é uma tarefa que peço a vocês, por favor. Desmasculinizem a Igreja.”
"Obrigado pelo que vocês fazem", reitera o Papa, ao final, recitando com os presentes um Pai Nosso "cada um em sua língua" e pedindo, como de costume, orações: "Rezem por mim. Rezem a favor, não contra, porque este trabalho não é fácil".
O Papa Francisco com os membros da Comissão Teológica Internacional. (Foto: Reprodução | Vatican Media)
No discurso entregue aos membros da comissão, o Papa reflete sobre "o chamado a dedicar toda a energia do coração e da mente a uma conversão missionária da Igreja". Francisco, destaca a mensagem contida em sua Carta dirigida ao novo prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé: "Precisamos de um modo de pensar que saiba apresentar de forma convincente um Deus que ama, que perdoa, que salva, que liberta, que promove as pessoas e as convoca para o serviço fraterno" (1º de julho de 2023).
O pedido do Papa aos membros da comissão é para que se encarreguem, de forma qualificada, por meio da proposta de uma teologia evangelizadora, na promoção do diálogo com o mundo da cultura.
“E é essencial que vocês, teólogos, façam isso em sintonia com o Povo de Deus, eu diria 'de baixo para cima', ou seja, com um olhar privilegiado para os pobres e os simples, e, ao mesmo tempo, se colocando 'de joelhos', porque a teologia nasce da adoração a Deus”.
Ao encorajar a continuação dos estudos sobre o Concílio de Nicéia, que no Jubileu de 2025 completará 1700 anos, Francisco compartilha três motivos que tornam a redescoberta de Niceia promissora. O primeiro é o motivo espiritual: “em Niceia, a fé foi professada em Jesus, o único Filho do Pai: Aquele que se tornou homem por nós e para nossa salvação é Deus de Deus, luz da luz. Cabe aos teólogos espalhar novos e surpreendentes lampejos da luz eterna de Cristo na casa da Igreja e na escuridão do mundo,” ressalta o Pontífice.
O segundo motivo é o sinodal. O Papa recorda que "o primeiro Concílio ecumênico foi celebrado na Niceia, no qual a Igreja pôde expressar sua natureza, sua fé, sua missão, para ser sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano".
"A sinodalidade é o caminho, o modo de traduzir em atitudes de comunhão e processos de participação a dinâmica trinitária com a qual Deus, por meio de Cristo e no sopro do Espírito Santo, vem ao encontro da humanidade. Aos teólogos é confiada a grande responsabilidade de liberar a riqueza dessa maravilhosa energia humanizadora".
E por fim, o terceiro motivo que o Papa apresenta é a ecumênica: “Como não lembrar a extraordinária relevância desse aniversário para a jornada rumo à plena unidade cristã? Não somente o Símbolo de Niceia une os discípulos de Jesus, mas precisamente em 2025, providencialmente, a data da celebração da Páscoa coincidirá para todas as denominações cristãs. Como seria belo se isso marcasse o início concreto de uma celebração sempre comum da Páscoa!”
Francisco finaliza agradecendo a comissão pelos esforços realizados e encoraja "a continuar os trabalhos para que a luz do Evangelho e da comunhão possa brilhar mais intensamente".
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Papa Francisco: a Igreja é “mulher”, devemos “desmasculinizá-la” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU