11 Novembro 2022
“A Igreja é maior que as falhas de seus líderes. A Igreja é também, e sobretudo, aqueles fiéis que continuam contra todas as probabilidades a testemunhar a sua fidelidade ao Evangelho, rezando e servindo aos pequeninos, os doentes, os pobres, as vítimas de todo o tipo de abusos, injustiças e guerras”, escreve Dominique Greiner, teólogo moral e padre assuncionista, editor da revista La Croix, 10-11-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Eu tinha pensado originalmente em comentar o 6º Dia Mundial dos Pobres, que será celebrado neste domingo. Mas a angustiante confissão do cardeal francês Jean-Pierre Ricard, tornada pública na segunda-feira passada, distraiu-me dessa intenção. O ex-arcebispo de Bordeaux, que foi presidente da Conferência Episcopal Francesa – CEF de 2001 a 2007, admitiu ter cometido uma conduta “repreensível” com uma menina de 14 anos há 35 anos.
Nossa compaixão deve ser, antes de tudo, pela vítima. E seria indecente minimizar os fatos enfatizando a idade deles. Agora sabemos, melhor do que antes, que o abuso sexual causa feridas profundas e duradouras, e que muitas vezes a vítima leva muito tempo para falar sobre o que aconteceu.
Através desta vítima em particular, todo o Povo de Deus na França também se sente traído mais uma vez, menos de três semanas após as revelações de abusos cometidos por dom Michel Santier, que foi bispo de Luçon e Créteil, e muito engajado com a Renovação Carismática. Como pode um homem com tal passado ter aceitado a nomeação para bispo, depois cardeal, e até mesmo membro da Congregação para a Doutrina da Fé – que julga, entre outras coisas, crimes de pedofilia no clero?
“Estamos cientes de que a confiança que o Povo de Deus deposita em seus pastores foi abalada e que para alguns – talvez até muitos – essa confiança está quebrada”, reconheceu na terça-feira dom Eric de Moulins-Beaufort, atual presidente da CEF. A credibilidade da Igreja está mais uma vez seriamente prejudicada.
O que se deve fazer e o que se deve dizer em tais circunstâncias depois de explodir de raiva e até de ser tentado a sair batendo a porta? Talvez devêssemos lembrar que a Igreja é maior que as falhas de seus líderes. A Igreja é também, e sobretudo, aqueles fiéis que continuam contra todas as probabilidades a testemunhar a sua fidelidade ao Evangelho, rezando e servindo aos pequeninos, os doentes, os pobres, as vítimas de todo o tipo de abusos, injustiças e guerras.
Uma amiga minha citou versos de uma canção escrita pelo padre e músico de Quebec Robert Lebel, que ela disse que ajuda a mantê-la em sua missão como capelão de hospital nestes tempos difíceis: “Ils sont nombreux les bienheureux, qui n’ont jamais fait parler d’eux… Ils sont nombreux, ces gens de rien, ces bienheureux du quotidien...” (“Muitos são os bem-aventurados, que jamais são falados... São as muitas pessoas do nada, que são os bem-aventurados do cotidiano”, em tradução livre).
Sim, são muitos os que nos ajudam a acreditar que Cristo não abandonou a sua Igreja. Não devemos decepcioná-los cedendo à tentação de abandonar a barca pega na tempestade. Isso também seria abandonar os pobres.
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A Barca da Igreja na tempestade. O Dia Mundial dos Pobres nos lembra que a Igreja é maior que os abusos e os bispos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU