28 Setembro 2022
O rosto de Jesus em um ícone antigo.
Publicamos um extrato do Prefácio do Pontífice ao ensaio biográfico sobre Cristo escrito por Andrea Tornielli, diretor editorial das mídias vaticanas. Um texto que nos lembra a importância do reconhecimento mútuo.
O texto do Papa Francisco é publicado por La Repubblica, 25-09-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Vita di Gesù. Con il commento di papa Francesco
Um aspecto decisivo que sempre me impressiona na leitura do Evangelho é a importância dos olhares, um detalhe sobre o qual também esta Vita di Gesù (Vida de Jesus, em tradução livre) se detém muitas vezes. Alguns olhares se cruzam: pensemos em Zaqueu, subindo na árvore de maneira um tanto grotesca, que deseja olhar para Jesus sem ser visto, mas é olhado pelo Senhor, que lhe diz que irá para sua casa. Pensemos no cego de Jericó: ele não podia ver, mas buscava o olhar de Deus, queria ser olhado por Jesus, e até encontrar aquele rosto pousado sobre ele, não parou de gritar, de perguntar, de suplicar. Em cada página do Evangelho há olhares, é o modo como as pessoas encontram Jesus. Há também os olhares dos doutores da Lei, daqueles que tentavam testá-lo, e também os olhares maravilhados daqueles que não entendiam.
É importante o olhar, são importantes os olhares. Não basta ler, não basta ouvir, o lindo é entrar pessoalmente nos episódios evangélicos, compondo o olhar de Jesus na mente e no coração. Imaginar, por exemplo, seus olhos pousar-se, entre tantas outras pessoas, sobre uma pobre viúva que dá uma pequena esmola ao Templo: o olhar de Jesus perscrutava os mestres da Lei que passeavam no Templo para serem notados e se mostrarem perfeitos, mas então foi atraído por aquela viúva que dá duas moedas, duas pequenas moedas, mais do que todos porque era tudo o que tinha. Aquele olhar é a canonização da generosidade. Vamos pensar em Jairo, que vai pedir ajuda para a filha, que está num estado muito grave, e quando está na frente do Mestre vêm dizer-lhe que ela está morta.
Olha para Jesus e Jesus olha para ele e o tranquiliza. Jesus tem uma capacidade única de olhar nos olhos. E enquanto Jairo diz a Jesus que agora é inútil ir para sua casa, Jesus continua e traz sua filha de volta à vida. Mas tudo começou pelo olhar. A viúva de Naim certamente também olhou para o Senhor quando ele se aproximou com seus discípulos. O que aquela mulher aflita e angustiada poderia pedir com os olhos? Certamente não a vida de seu filho, porque ela tinha certeza de que ele estava morto e que nada nem ninguém poderiam trazê-lo de volta à vida. No entanto, ela estava pedindo algo com aquele seu olhar.
Jesus, olhando para ela e sua dor, ficou profundamente comovido. Ele se aproxima do cortejo fúnebre e ressuscita seu filho morto entregando-o de volta para sua mãe. Outras vezes nos encontramos diante de olhares incapazes, que a princípio não conseguem ver o Senhor: por exemplo, os discípulos de Emaús. Seus olhos estavam como velados. Pensemos em Madalena, quando ela vai ao sepulcro, e pensa que Jesus ressuscitado seja o jardineiro. E então, o Senhor se manifesta: o mesmo acontece conosco, quando pegamos o Evangelho na mão, lemos algo e ao nosso olhar em determinado momento o Senhor se revela, se manifesta, e sentimos a experiência espiritual única do espanto, que nos faz encontrar Jesus.
Abordemos então os episódios da vida de Jesus com olhos cheios de contemplação. É verdade que a fé começa com a escuta, mas o encontro começa com a visão. Portanto, é importante ouvir e ver Jesus nos Evangelhos. O ver une-se mais facilmente à memória, que faz crescer a vida cristã: é, como ensina São João, mas em geral toda a Sagrada Escritura, a memória das coisas que vimos e ouvimos.
Este livro, esta Vida de Jesus, escrita utilizando as palavras dos Evangelhos, pode ajudar-nos a entrar em contato com Ele, para que não permaneça apenas uma grande personagem, um protagonista da história, um líder religioso ou mestre de moral, mas se torne para cada um, todos os dias, o Senhor. O Senhor da vida. Desejo que o leitor veja Jesus, encontre Jesus e receba a graça - que é um dom do Espírito Santo - de se deixar atrair por Ele.
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Papa Francisco: “A força de Jesus está no olhar” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU