21 Julho 2022
"Uma etapa importante da reforma litúrgica acabou de completar-se e exige uma releitura cuidadosa, no plano histórico e teológico. Disso emerge amplamente o percurso ideal e institucional que o Movimento Litúrgico e o Concílio Vaticano II inscreveram definitivamente e irreversivelmente na história da Igreja Católica contemporânea. Tudo isso exige hoje uma retomada audaz e paciente, teoricamente percebida e praticamente criativa", escreve o teólogo italiano Andrea Grillo, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, em artigo publicado por seu blog Come Se Non, 09-07-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Acaba de ser publicada, em edição brasileira, a tradução da reedição de "Para além de Pio V" (Queriniana 2022), atualizada após o MP Traditionis custodes. Aqui publico a introdução à edição brasileira, onde esclarece o complexo processo com o qual o livro foi construído, de 2007 até hoje, ao longo da trajetória da "crise" constituída pela vigência de Summorum Pontificum e de sua revogação. Como a história não para, hoje acrescentaríamos também a Carta Apostólica "Desiderio Desidervi" à fortuna crítica da questão.
Capa do livro Para além de Pio V: a reforma Litúrgica após a Traditionis Custodes
(Paulus, 2022, 160 p.), de Andrea Grillo
Foto: Divulgação | Editora Paulus
Passados mais de 5 anos após a edição italiana (que é de 2007), em 2013 este livro ganhou forma também em língua inglesa[1]. A primeira edição italiana saiu dois meses antes do Motu Proprio “Summorum Pontificum”, baseada nos pressentimentos e nos “rumores” que se faziam ouvir em Roma, já muitos meses antes. Então para a edição feita nos Estados Unidos, com tudo o que aconteceu naquele quinquênio, foi necessária uma atualização do texto. Os primeiros quatro capítulos permaneceram os mesmos de 2007, salvo ajustes marginais, enquanto foi acrescentado um quinto capítulo totalmente novo, que comentava o Motu Proprio de Bento XVI "Summorum Pontificum" de julho de 2007 e a Instrução "Universae Ecclesiae”, da Pontifícia Comissão Ecclesia Dei, de maio de 2011.
As questões que foram levantadas já antecipadamente no texto original encontravam nestes dois documentos do Magistério, papal e curial, ampla e objetiva confirmação. A exigência de uma hermenêutica adequada do Concílio Vaticano II e da Reforma Litúrgica encontrava nesses recentes desenvolvimentos uma alta problematicidade, para a qual a teologia poderia e deveria dar a própria responsável e necessária contribuição.
Por isso, o livro, mediante essa edição nos Estados Unidos da América, entrou no movimento de pensamento e de discussão que, no contexto estadunidense, tinha há pouco sido expresso em dois volumes de grande importância: por um lado, a reflexão conduzida por Massimo Faggioli em True Reform. Liturgy and Eclesiology in Sacrosanctum Concilium; por outro, a precisa reconstrução histórica e teológica de Patrick Regan, Advent to Pentecost. Comparing the Seasons of the Ordinary and Extraordinary Forms of the Roman Rite.
Esses dois volumes ofereciam uma contribuição séria e fecunda ao justificar o fato de que a Igreja Católica do terceiro milênio poderia entender-se não "segundo Pio V", nem "contra Pio V", mas seguramente "para além de Pio V". O fato, pois, de que a mesma editora dos Estados Unidos da América (Liturgical Press) unia esses dois livros com a versão estadunidense do meu, foi, por sua vez, um "sinal dos tempos" não ignorável.
Hoje, em 2021, uma nova etapa editorial, solicitada desta vez pela Igreja e pela cultura brasileira, corresponde a uma nova etapa do magistério e a uma nova fase do debate eclesial. Há poucas semanas, o Motu Proprio do Papa Francisco Traditionis Custodes, também ele acompanhado por uma carta explicativa aos bispos, superou o estado de exceção litúrgica introduzido pelo Summorum Pontificum: em certo sentido, quatorze anos depois, voltamos à situação originária na qual este livro surgiu.
O acréscimo de um novo capítulo em relação à edição estadunidense - e dois em relação àquela italiana - permite ao leitor voltar enriquecido à intuição inicial, depois de ter se nutrido dos debates posteriores a 2007 e da bela novidade que chegou novissime em 2021. Assim uma etapa importante da reforma litúrgica acabou de completar-se e exige uma releitura cuidadosa, no plano histórico e teológico. Disso emerge amplamente o percurso ideal e institucional que o Movimento Litúrgico e o Concílio Vaticano II inscreveram definitivamente e irreversivelmente na história da Igreja Católica contemporânea. Tudo isso exige hoje uma retomada audaz e paciente, teoricamente percebida e praticamente criativa.
O Autor
Savona, 28 de agosto de 2021
Festa de Santo Agostinho
[1] Cfr. Beyond Pius V. Conflicting Interpretations of the Liturgical Reform, Collegeville (MI), Liturgical Press, 2013.
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Para além de Pio V no Brasil. Artigo de Andrea Grillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU