27 Outubro 2021
O jesuíta Peter Knox, da África do Sul, conversa com Sebastian Gomes, diretor-executivo de America Media, dos jesuítas estadunidenses, sobre a mudança climática, a COP26 e o que os católicos podem fazer para responder aos chamados do Papa Francisco pela conversão ecológica.
A entrevista é de Sebastian Gomes, publicada por America, 26-10-2021. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Vamos começar com o mais básico. Estamos nos aproximando da COP26 em Glasgow. O que são esses encontros da COP? Quem participa? Qual é o tema deles?
COP é uma sigla para Conferência das Partes, e as partes são os países – a maioria é de países, mas há representação da União Europeia também – que assinaram as várias convenções das Nações Unidas. A cada ano, as partes se reúnem e discutem mais sobre seus compromissos e como estão evitando a mudança climática.
Há um objetivo ou meta a ser perseguido no final da COP26?
Primeiramente, nós estamos tentando manter o Acordo de Paris. O presidente da COP, Alok Sharma, quer que as partes se comprometam a produzir 100 bilhões por ano para financiamento do clima, mas isso não tem sido realmente viável. Nós escutamos no último mês que apenas 80 bilhões foram produzidos no ano passado (o ano financeiro de 2020). O Acordo de Paris era um amplo acordo, e todos o acharam muito bom, mas para implementá-lo há regras postas, como o relatório anual e fazer uma auditoria global dos gases de efeito estufa.
Nós estamos começando a ver os impactos da mudança climática ao redor do mundo. É uma urgência que esse encontro em Glasgow seja singular neste sentido?
Sim. Eu penso que foi gerado um certo acúmulo de urgência com a publicação do relatório do Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas (IPCC, pela sigla em inglês) no mês passado. Para citar o relatório: “A mudança climática já está afetando cada região climática do globo com a influência humana, contribuindo para muitas mudanças observadas em clima e temperaturas extremas. A mudança climática está espalhada, é rápida e se intensifica”. António Guterres, o secretário-geral da ONU, disse que esse relatório é “um alerta vermelho para a humanidade”. O alarme está soando alto. A evidência é irrefutável. Os gases de efeito estufa por causas humanas estão causando a mudança climática.
Glasgow não pode ser outro grande encontro internacional no qual as pessoas vêm e conversam. Há algo que ele tem que fazer e fazer muito rapidamente. E eu penso que não é apenas aplicado aos governos; eu penso que isso se aplica a nós como cidadãos comuns de nossos respectivos países. A mudança climática não é algo de um futuro distante. Não é algo que apenas nossas crianças terão que enfrentar. Está acontecendo agora. É real. E está se acelerando.
Você mencionou que todos devem participar disso. Uma pessoa que tem feito muito por isso é o Papa Francisco. Ele publicou sua inovadora encíclica em 2015, chamada Laudato Si': sobre o cuidado da Casa Comum, antes da cúpula de Paris. Como você pensa que o Papa Francisco vê seu papel hoje a nível global como um líder religioso tentando despertar nossas consciências para essa crise?
Eu sou muito grato pelo pontificado do Papa Francisco. Eu sou muito grato que ele tenha deixado claro que o cuidado com o meio ambiente é parte de nossa responsabilidade moral cristã. O mundo que Deus nos deu é realmente importante. Isso é parte de nosso ser cristão, é parte do nosso cuidado com as gerações futuras. Na Laudato Si', Francisco faz da solidariedade intergeracional uma pedra angular do ser cristão. Isso é algo que nós realmente temos que pensar – o mundo que nossas crianças vão viver.
O Papa Francisco trouxe líderes religiosos a Roma e disse “vamos falar sobre o meio ambiente antes da COP26”. Os líderes religiosos representam talvez 80% a 84% dos seres humanos neste planeta. Se nossos líderes religiosos estão falando para 84% do mundo, nós sabemos que isso é algo realmente, mas realmente sério.
O mundo estava assistindo e esperando que o Papa Francisco fosse a Glasgow para se manifestar à conferência. Eu sei que esse era o desejo dele também. Mas descobrimos recentemente que ele não participará mais. Você tem alguma ideia do porquê disso?
Quando o Papa Francisco falou com os líderes religiosos no último mês, ele disse que ele faria todo o esforço para ir a Glasgow dependendo de sua saúde.
Dado o estado de crise em que nos encontramos, parece que todos os partidos políticos dos últimos 20 a 30 anos implicados nisso não estão à altura do desafio que enfrentamos coletivamente. Você pode me falar sobre a importância de ter essa perspectiva intergeracional e como isso nos conecta de maneiras que realmente precisamos mais hoje e como enfrentarmos esta crise?
Eu acho que é uma questão de política. Mas acho que muitos jovens, Greta Thunberg, por exemplo, são apartidários. Eles não estão ligados à política partidária. São apenas jovens dizendo que se preocupam com nosso futuro – e isso abrange todo o espectro político. Eles estão muito, muito preocupados com isso. Quando olham para os incêndios florestais, quando olham para os grandes eventos climáticos, não se trata de política partidária. E temos que ir além da noção de que os partidos vão resolver os problemas. Temos que nos unir como países com compromisso. E isso exigirá sacrifícios para todos nós.
A geração dos meus pais fez tudo o que pôde para colocar minha geração em uma trajetória econômica muito boa. Nossos pais fizeram grandes sacrifícios, mas o planeta também fez grandes sacrifícios. E agora os mais jovens estão dizendo, ok, isso teve um grande custo. Queremos empregos. Queremos emprego para nós mesmos, mas estamos preparados para sacrificar o futuro de nosso planeta e de nossos filhos?
Que resultado você espera dessa conferência em Glasgow?
Espero que haja grande generosidade. Espero que muitos dos países que estão negociando lá tenham realmente lido esse relatório do IPCC e levem-no a sério. Espero que os Acordos de Paris sejam respeitados e que as pessoas não se retirem. Aceleremos o ritmo que Paris nos impôs, para que até o final do século cheguemos à neutralidade climática.
Que conselho você daria para vencer o desespero que pode nos assediar quando estamos diante da crise?
Desespero e ansiedade são o que Inácio chamaria de desolação. Não estamos em um bom espaço. Não estamos nos voltando para Deus. Não estamos cheios de esperança – e Deus é um Deus de esperança. Temos que continuar orando. Continuamos esperando o melhor. Acho que temos que ser proativos. Acho que cada um de nós deve fazer o possível em vez de desistir.
Temos que dizer: vou fazer alguma coisa. Vou escrever aos meus congressistas. Vou falar com meus políticos. Vou encorajar os jovens. Vou participar nas greves pelo clima. Não vou me permitir ficar passivo, mas vou continuar ativo como uma pessoa de fé e uma pessoa que acredita que Deus realmente quer nos salvar desta crise.
E Deus quer que nos salvemos da crise. Deus não fará absolutamente tudo por nós. Temos que nós mesmo sair e nos envolver com o plano de salvação de Deus.
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Por que a COP26 importa para os católicos? Entrevista com Peter Knox - Instituto Humanitas Unisinos - IHU