19 Março 2021
"Painelista no webinar, o bispo presidente da Igreja Episcopal dos EUA, reverendo Michael Curry, afirmou que o nacionalismo cristão abarca “o tipo mais virulento e perigoso”, que veem o seu país como o melhor por acreditarem que são 'os favoritos de Deus'", escreve Edelberto Behs, jornalista, que atuou na Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil – IECLB de 1974 a 1993, como repórter e editor do Jornal Evangélico e depois como assessor de imprensa.
O nacionalismo cristão é “absolutamente uma ameaça a uma sociedade pluralista e democrática” e precisa ser combatido para que não se repitam os eventos ocorridos nos EUA no dia 6 de janeiro, alertou em um webinar o professor de Sociologia da Indiana University, Andrew Whitehead. Embora tal espírito esteja presente em todos os setores da sociedade americana, os evangélicos são mais propensos do que qualquer outro grupo religioso a simpatizar e aceitá-lo.
Whitehead definiu o nacionalismo cristão como uma “estrutura cultural que idealiza e defende uma fusão do cristianismo com a vida cívica americana”. Neste caso, o cristianismo assume um caráter mais tribal do que espiritual. A diretora executiva do Baptist Joint Committee for Religious Liberty, Amanda Tyler, coordenou o painel do webinar. Na abertura, ela descreveu o nacionalismo cristão como “uma ideologia perturbadora que estava em ascensão e que ameaça a liberdade religiosa para todos”.
Painelista no webinar, o bispo presidente da Igreja Episcopal dos EUA, reverendo Michael Curry, afirmou que o nacionalismo cristão abarca “o tipo mais virulento e perigoso”, que veem o seu país como o melhor por acreditarem que são “os favoritos de Deus”. Esse tipo de nacionalismo é “perigoso para a saúde do cristianismo” e “beira à blasfêmia, à idolatria”, afirmou.
Em entrevista para o podcast para Líderes da Igreja, o pastor e escritor Tim Keller apontou que a defesa do Partido Republicano pela Igreja americana nas últimas década deu ao nacionalismo cristão “um lugar onde ele poderia incubar”. Embora concorde com a direita cristã na defesa da vida contra o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, Keller destacou que a maneira como muitos cristãos lidaram com questões polêmicas nos anos 80 e 90 alimentou o medo, o ressentimento e a raiva em suas comunidades.
Ele deu um exemplo: “Você sabe como eles levantaram dinheiro: por 20 anos, eles enviaram cartas falando sobre como ‘Você tem que nos enviar dinheiro porque os gays vão tentar vir e levar seus filhos embora, porque eles estão mal e porque os democratas e a esquerda vão destruir a sua liberdade religiosa”. Ou seja, “eles apenas disseram coisas horríveis e caluniaram as pessoas”. Isso manteve os evangélicos “espumando pela boca sobre como tudo está indo tão mal e deixando todo mundo com tanta raiva”, agregou.
Keller enfatizou que esse “não é, de forma alguma, o jeito cristão” de agir. O serviço caracteriza a atuação cristã, e foi assim que Jesus fez. Num mea culpa Keller assinalou que “nós alimentamos isso. E os nacionalistas cristãos usam isso. E, portanto, nós mesmos causamos isso”.
Em dezembro passado, a evangelista batista e professora de Bíblia Wanda Elizabeth “Beth” Moore postou mensagem em rede social observando que muitos conservadores cristãos estão equiparando o destino da América ao destino do reino de Deus, transformando um partido – obviamente o Partido Republicano – no partido de Deus e o outro – o Democrata – no partido de Satanás.
No livro Taking America Back for God: Christian Nationalism in the United States (Trazendo a América de volta para Deus: Nacionalismo Cristão nos Estados Unidos, em tradução livre), Whitehead e seu colega Samuel Perry escrevem: “O nacionalismo cristão apenas usa a Bíblia para impor sua agenda política conservadora. Ao afirmar que são verdadeiros seguidores de Cristo em um país que se baseia em princípios cristãos, os adeptos do nacionalismo cristão podem rotular seus oponentes políticos como ímpios e não americanos.”
Em artigo para o Christian Post, o escritor conservador e apresentador de rádio Michael Brown advertiu que igualar a América ao Reino de Deus ou fundir a cruz com a bandeira é um “terrível erro perigoso”. Amanda Tyler entende que os cristãos “têm uma responsabilidade especial de compreender e erradicar o nacionalismo cristão, não apenas em suas formas mais óbvias e extremas, mas nas manifestações penetrantes e profundamente enraizadas em nossa cultura, em nossas igrejas e em nós mesmos.”
Alguma coincidência com o quadro político-religioso brasileiro, onde um presidente da República usa o nome de Deus num slogan eleitoreiro, apoiado por pregadores, a maioria da família evangélica pentecostal, que enrolam o Evangelho na bandeira nacional e procuram tirar proveito disso?
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Nacionalistas cristãos confundem pátria com Reino de Deus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU