“Aquela dor sem palavras de meu pai salvado por Schindler”

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28 Janeiro 2021

Daniel Vogelmann é um dos “filhos do depois”, há mais de quarenta anos o guardião da memória de seu pai Schulim, deportado para Auschwitz e sobrevivente, o único italiano na lista de Oskar Schindler. No livro Dalla parte di Giona (e del rícino), em tradução livre, Do lado de Jonas (e do rícino), recém-publicado pela editora Giuntina, Daniel aborda o tema do perdão: “Jonas tinha um ideal de justiça e boas razões para não obedecer ao Senhor. Não bastava que os ninivitas (povo inimigo de Israel, ndr) se arrependessem de seus crimes: deviam pedir perdão às vítimas, o que era impossível, e só então Jonas considerava que Deus poderia perdoá-los”. Daniel, com forte sotaque florentino, tem 72 anos: poeta e escritor, é o fundador da Giuntina, editora especializada em judaísmo.

A entrevista com Daniel Vogelmann é de Luca Monticelli, publicada por La Stampa, 27-01-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

O que você acha de Emanuele Filiberto di Savoia que pediu perdão pelas leis raciais?

Era Vittorio Emanule III que devia pedir perdão, ou pelo menos Umberto II. Aprovamos que o neto tenha reconhecido as atitudes torpes da família, antes tarde do que nunca, mas os judeus não podem perdoar pelos outros.

Por que Vittorio Emanuele III os endossou?

Ele foi cúmplice de Mussolini desde o início. Ele levava uma boa vida, não ligava a mínima para os judeus. Vi a agonia do meu pai ao pensar na mulher e na filha assassinadas e queimadas em Auschwitz.

Quem era seu pai Schulim?

“Meu pai teve uma vida aventureira. Ele nasceu na Galiza em 1903, durante a Primeira Guerra Mundial ele estava em Viena, mas quando a família voltou para a Polônia seu pai decidiu ir para a Palestina sob o mandato britânico. Não vendo grandes perspectivas, voltou para a Europa. Ele foi para Florença, onde seu irmão ensinava o Talmud na faculdade judaica e encontrou trabalho na gráfica Giuntina. Ele se casou com Anna Disegni, filha do Rabino de Turim e eles tiveram uma filha de nome Sissel em 1935. Uma vida serena até 1938, depois ele tentou com sua família fugir para a Suíça, mas os três foram capturados e enviados para Auschwitz, Anna e Sissel morreram. Depois da guerra, ele voltou para Florença, onde comprou a gráfica. Casou-se novamente e em 1948 eu nasci.

Ele falava sobre Auschwitz?

Ele não me contava quase nada, acho que não queria me perturbar. E depois ele tinha recomeçado a viver, se casou novamente e estava tentando esquecer. Obviamente não inteiramente, já que tinha pesadelos à noite.

Como você ficou sabendo da lista de Schindler?

Depois do filme de Spielberg, um amigo meu viu um documentário no qual onde notou entre os nomes, escrito no jeito polonês Szulim Vogelmann. Entrei em contato com Yad Vashem (o museu do Holocausto em Jerusalém, ndr), que confirmou: ele foi o único judeu italiano na lista de Schindler. Por ser tipógrafo, eles o transferiram para o campo de Plaszow, onde imprimiam as libras esterlinas falsas com que os nazistas pensavam colocar o Banco da Inglaterra em crise. É de lá que ele conseguiu entrar para a fábrica de Schindler.

Seu pai foi deportado no mesmo trem que Liliana Segre.

Sim, mas eles não se conheciam. Talvez tenham se visto naquele dia, quem sabe.

Que relação você mantém com a senadora vitalícia?

Somos amigos de Liliana desde que ela cuidava do memorial na plataforma 21 em Milão. Conheci bem sua filha, com quem tenho em comum o estigma de ser filho do Holocausto, com todos os problemas que tivemos e temos.

Como você convive com essa dor?

“Foi muito pesado: traumas, depressão. Pensei muito nessa irmãzinha que nunca conheci, mas que sempre senti muito presente em casa, dediquei poemas a ela. Tive que encarregar-me do luto no lugar do meu pai: ele não o fez para continuar a viver.

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