24 Julho 2020
"A conversão estrutural pressupõe a conversão pessoal: nunca como hoje está sendo necessário esse esforço comum de mudança de mentalidade, que deve envolver a formação de padres e leigos, para que juntos continuem a 'inventar o cristianismo'", escreve Francesco Cosentino, teólogo italiano e professor de Teologia Fundamental na Pontifícia Universidade Gregoriana, em artigo publicado por Settimana News, 23-07-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em um mundo em rápida mudança, a paróquia é chamada a renovar a si mesma e sua organização, valorizando o carisma de todos.
Há algum tempo, o padre alemão Thomas Frings resolveu fazer uma pausa em um mosteiro depois de uma longa experiência pastoral vivida como pároco. No empolgante texto Così non posso più fare il parroco [Assim não posso mais ser um pároco][1], Frings relata a vida cotidiana de um pároco, afirmando ser um padre feliz, mas enfatizando a urgência de uma mudança de rumo para uma Igreja organizada e estruturada, mas que, no entanto, se tornou incapaz de transmitir o frescor do Evangelho em um mundo profundamente mudado.
Há algum tempo, de fato, a instituição paroquial está em estado de sofrimento. Parece excessivamente fatigada, sobrecarregada por aparatos e estruturas que a tornam estática em um mundo que se tornou móvel, muitas vezes aprisionada em formas, estilos e linguagens que não servem mais para responder adequadamente às necessidades da evangelização.
Em suma, o "canteiro de obra paróquia" precisa ser reaberto para iniciar uma tentativa de renovação e, nesse sentido, pode ser lido o novo documento da Congregação para o Clero, intitulado A conversão pastoral da comunidade paroquial a serviço da missão evangelizadora da Igreja.
Uma primeira e obrigatória nota de método parece necessária para uma correta leitura e interpretação do documento. Como costuma acontecer no âmbito de uma cada vez mais difundida superficialidade da comunicação, muitas vezes os apêndices se tornam o centro; mas o documento, mesmo falando sobre isso, não nasceu primariamente para definir a questão dos tarifários dos sacramentos ou para "abrir" para a possibilidade de que, em certas circunstâncias, sejam os leigos a administrarem um sacramento ou celebrarem a Liturgia da Palavra, algo que, inclusive, já estava previsto há tempo pelo direito canônico.
Ao mesmo tempo, juntamente com a mens o documento, é preciso considerar a sua destinação universal. A Congregação, entrando em contato com as situações mais díspares de quase todo o mundo e reunindo a voz dos bispos de muitos países, está ciente de como alguns problemas de natureza eclesiológica ou pastoral sejam diferentes, dependendo da realidade concreta de cada situação. Isso é importante para evitar leituras parciais, tendenciosas e às vezes ideológicas.
Acima de tudo, a sabedoria teológica deveria ser treinada, mesmo caso nos encontrássemos diante de formulações não inteiramente convincentes, para considerar o "todo" e assumir que, em um documento da Santa Sé, confluem juntas uma série de elementos diferentes e muitas situações eclesiais que têm pontos de partidas diferentes entre si.
O documento da Congregação para o Clero surge da necessidade de buscar criativamente novos caminhos para que o evangelho seja proclamado sem lentidão, como almejado pelo Papa Francisco em várias ocasiões, também através de um repensamento/renovação da forma paroquial. A Instrução, portanto, pretende oferecer "ferramentas para uma reforma, também estrutural, orientada para um estilo de comunhão e colaboração" (A conversão pastoral, nº 2), em consonância com a transformação auspiciada pelo Papa Francisco na Evangelii gaudium, para que a paróquia se torne um canal missionário de evangelização e não um aparato que visa a autopreservação.
A instituição paroquial, de fato, conta com uma longa história e, no entanto, sua configuração não parece mais suportar o impacto de profundas mudanças sociais e culturais que ocorreram nas últimas décadas. Em especial, parece pouco adequado em comparação com os tempos, o intrínseco vínculo entre paróquia e território. De fato, o mundo contemporâneo é marcado por uma maior mobilidade que afeta os estilos de vida e as próprias "fronteiras" da existência. A vida das pessoas, principalmente nas grandes metrópoles e áreas urbanas, se desenvolve em constante movimento, no contexto de lugares, tempos, espaços e situações existenciais variegadas e plurais.
A paróquia, com suas estruturas, organismos, horários bem definidos, suas formas tradicionais, corre o risco de parecer muito estática e inamovível, enquanto no mundo de hoje "o vínculo com o território tende a ser cada vez menos percebido" e "os lugares de pertença tornam-se múltiplos" (n. 9).
Em um mundo tão profundamente mudado e em constante movimento, a paróquia é chamada "a encontrar outras modalidades de vizinhança e proximidade em respeito às atividades habituais" (nº 14), a fim de ir ao encontro das pessoas que, hoje, vivem em um "território existencial e relacional" mais amplo que o restrito âmbito geográfico em que residem.
O documento convida a superar uma pastoral cujo campo de ação é delimitado exclusivamente dentro dos limites territoriais da paróquia. Só assim não corre o risco de ficar aprisionada na mera repetição de atividades inerentes a uma pastoral das "coisas de sempre" e, em vez disso, torna-se capaz de viver o dinamismo da evangelização, abrindo-se de modo transversal ao território e implementando propostas pastorais diversificadas.
Trata-se de "identificar perspectivas que permitam a renovação das estruturas paroquiais ‘tradicionais’ de maneira missionária" (nº 20), mediante um renovado ímpeto na proclamação do Evangelho, propostas pastorais transparoquiais, espaços e lugares em que a comunidade cristã se torna generativa de laços fraternos, de vizinhança e de crescimento de boas relações humanas.
Esse tipo de conversão pastoral exige o que o documento chama de "um processo gradual de renovação das estruturas" e "modalidades diversificadas de confiar o cuidado pastoral e a participação no seu exercício, que envolvem todos os componentes do povo de Deus" (n. 43).
De fato, a paróquia tomada individualmente, suficiente por si mesma, que organiza por si a pastoral sem conexão com outras comunidades vizinhas e com a diocese, corre o risco de parecer anacrônica, estática, circunscrita em um critério jurídico-territorial que não encontra mais correspondência na vida real das pessoas, incapazes de alcançar a todos.
O documento, portanto, almeja que possa se desenvolver aquela reorganização pastoral da paróquia, já conhecida pelo nome de Unidades Pastorais, Zonas Pastorais ou Comunidade de paróquias. Não se trata, de forma banal, de unir paróquias por falta de padres ou de meios, mas sim, mais teologicamente, de repensar e programar juntos a pastoral e a evangelização, partindo de uma leitura mais ampla do território, conteúdos e objetivos comuns, programas pastorais comuns, propostas inovadoras e transversais de evangelização.
Mesmo que a paróquia continue promovendo uma pastoral ordinária, as prefeituras, os decanatos, os vicariatos e as forânias - hoje reduzidas a puras instituições formais - poderiam se tornar lugares para a elaboração de uma pastoral geral desse tipo, em ativa comunhão e colaboração, efetiva e concreta não apenas entre padres e leigos, mas também entre aquelas que hoje são paróquias distintas.
Assim, considerando que no fundamento do documento está a eclesiologia de comunhão do Vaticano II e os impulsos do magistério de Francisco sobre a necessidade de uma "Igreja em saída", a segunda parte do documento se limita a oferecer, em especial para os bispos, as modalidades canônicas através das quais realizar experimentações de Unidades ou Zonas pastorais.
Trata-se de realidades intermediárias entre a diocese e a paróquia individual, lideradas por um vigário episcopal ou pároco moderador, que deveriam ser erguidas levando em consideração as dimensões da diocese e sua realidade pastoral concreta, "com particular atenção ao território concreto ... para facilitar a relação de proximidade entre os párocos e outros agentes pastorais "(n. 46).
O documento, principalmente em sua parte canônica, pretende evitar dois riscos extremos, atualmente presentes em diferentes países do mundo: uma paróquia na qual o pároco e os outros presbíteros precisam cuidar de tudo e decidem sozinhos, relegando os outros componentes da comunidade ao papel marginal de executores; ou, inversamente, uma paróquia na qual a especificidade dos carismas é nivelada, a ponto de não ter mais um pastor encarregado do cuidar pastoral, mas uma equipe de pessoas - padres e leigos - que, como um conselho de administração, gerem uma empresa como funcionários.
Não se deve esquecer que a tentativa da Instrução é iniciar uma renovação das formas de cuidado pastoral, também por meio de uma reforma estrutural da comunidade, a serviço de uma nova evangelização.
A ideia subjacente é que, no centro da comunidade cristã e de sua ação, esteja o Espírito Santo, cuja unção pertence a todo o Povo de Deus, e que habilita todos os batizados, através de diferentes carismas e ministérios, a participar da missão eclesial. Nessa renovada coparticipação entre padres e leigos, considera-se necessário colocar sinais concretos para "a superação tanto de uma concepção autorreferencial da paróquia" quanto de uma "clericalização da pastoral" (n. 38).
Isso pode ser conseguido ajudando a paróquia a emancipar-se do modelo tridentino que a vê agir "sozinha", a se tornar lugar onde as diferentes vocações e os diferentes ministérios se harmonizam e dão vida a novas formas de anunciação da fé.
Naturalmente, a conversão estrutural pressupõe a conversão pessoal: nunca como hoje está sendo necessário esse esforço comum de mudança de mentalidade, que deve envolver a formação de padres e leigos, para que juntos continuem a "inventar o cristianismo"[2].
[1] Cfr. Th FRINGS, Così non posso più fare il parroco. Vi racconto perché, Àncora, Milano 2018.
[2] J. DELUMEAU, Scrutando l’aurora. Un cristianesimo per domani, Messaggero, Padova 2003, 176.
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Paróquia, hora de mudar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU