27 Fevereiro 2020
"Talvez o jejum eucarístico imposto pela profilaxia do contágio possa nos levar a redescobrir o 'conhecimento por contato', cujas formas mais plenas aguardam dos cristãos católicos um investimento de cuidado e preocupação que não pode ser traduzido nas categorias clássicas do 'preceito' ou da 'assistir à missa'", escreve Andrea Grillo, teólogo italiano e professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, em Roma, em artigo publicado por Come se non, 24-02-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os eventos dos últimos dias, ligados à prevenção sanitária contra a possível epidemia do "COVID 19", envolveram também a Igreja católica, que tomou importantes decisões sobre suas "ações rituais", em particular a Eucaristia. Diante dessas decisões, devido à responsabilidade, alguns reagiram denunciando a "subserviência" eclesial à pressão da opinião pública.
Outros chegaram a dizer, recordando o passado, que, no caso de epidemias, as missas deveriam se multiplicar, não serem reduzidas ou suspensas. E se pensa assim, muitas vezes por causa de um imaginário eclesial profundamente clerical (os padres celebram a missa que deve defender o povo do contágio) e por uma devoção cristã totalmente individual (dispensada de participar do rito, mas apenas destinatária de seus efeitos).
Acredito, no entanto, que seja justo considerar um aspecto diferente da questão. Como se sabe, onde a missa não foi suspensa, foi disposto, entre outras coisas, que a comunhão seja distribuída "na mão" e não "na boca". Me espantou que ninguém fez nenhuma referência à "comunhão sob as duas espécies". Mesmo para suspender sua execução - que neste caso parece plenamente razoável - talvez uma referência fosse necessária. Eu tento explicar o porquê.
Os acontecimentos recentes, que impõem um regime de exceção, são uma oportunidade de refletir sobre o que fazemos normalmente, "de forma distraída". Vamos tentar considerar os três "pontos-chave" das normas excepcionais, que se referem à pia de água benta, ao sinal da paz, à forma da comunhão. Todos esses três "momentos" da celebração são considerados como "contagiosos". E isso é verdade. No entanto, a pergunta a ser feita, tendo em vista a retomada normal da vida cristã, é esta: mas são mesmo? Eles realmente constituem aquele contato que pode degenerar em contágio?
Vou contar um episódio relacionado à prática "obsessiva" de uma minha tia-avó distante. Ela dizia com orgulho que a primeira coisa que fazia ao voltar da missa era "lavar as mãos": porque tinha tido contato com as mãos de estranhos durante o ritual da paz. O mesmo poderia ser dito sobre a forma da comunhão. A forma "plena" - comer o único pão partido e beber o único cálice compartilhado - é a forma "tátil" da identidade cristã, que não apenas excluímos em caso de contágio, mas normalmente proibimos em nossa praxe ordinária, quando não existem no horizonte contágios ou epidemias, mas por falta de tato e contato eclesial. Como se temêssemos o contato antes mesmo que o contágio.
A resistência às normas excepcionais não faz sentido. Desde que seja, de fato, uma forma extraordinária de "suspensão do contato", por razões de saúde pública. Uma Igreja que "suspendesse o contato" por conveniência, por rapidez e por economia, seria, ao contrário, um caso sério a ser enfrentado, também graças a essa contingência sanitária.
A missa, de fato, é "conhecimento por contato". Foi assim que o grande teólogo Cipriano Vagaggini a definiu nos anos 1950. O que vivemos nela é um "tornar-se corpo de Cristo" na palavra ouvida e na mesa compartilhada. A intimidade eclesial encontra nos gestos eucarísticos seu código mais antigo e mais precioso. Que é código primitivo e primordial, de palavra e refeição. Cada família sabe que constrói sua própria communitas vitae como "communitas victus", como comunidade de alimento. Mas mesmo as famílias sabem que, no caso de uma epidemia de gripe, o "doente" terá, por algum tempo, também na família, o lugar para refeições separado e um "copo separado". Para retornar, mais tarde, à comunidade de pão e de cálice que torna a comunhão feliz e fecunda.
A missa é uma forma de comunhão "transgressiva", que descobre o poder de compartilhar palavras e refeições com lógicas não de parentesco: podemos comer no mesmo prato e beber no mesmo copo, mesmo que não sejamos "parentes". Mas, dessa maneira, confessamos que somos "filhos de um único pai" e "irmãos e irmãs em Cristo", precisamente nessa escandalosa forma comunitária de palavra e refeição. Uma comunhão "corpórea" e "tátil", "carnal" e "sensível" é originária para os cristãos. Eles podem suspendê-la por algum tempo, em caso de crise sanitária. Como é justo e responsável que seja feito. Mas para retornar com uma nova evidência e uma nova urgência, após a crise.
Talvez o jejum eucarístico imposto pela profilaxia do contágio possa nos levar a redescobrir o "conhecimento por contato", cujas formas mais plenas aguardam dos cristãos católicos um investimento de cuidado e preocupação que não pode ser traduzido nas categorias clássicas do "preceito" ou da "assistir à missa". Em vez disso, está em jogo um ato simbólico primordial, que constitui a Igreja em sua verdade de "discipulado do Senhor". Sua característica "comunitária", justamente quando deve ser suspensa por motivos públicos, alimenta um desejo que pode redescobrir, após a crise, sua forma mais plena e mais forte. Desde que o possível contágio não impeça para sempre o contato necessário.
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“Ite missa non est”: conhecimento por contato e profilaxia do contágio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU