26 Julho 2019
O delegado da Polícia Federal (PF) Marcelo Augusto Xavier da Silva foi escolhido por Jair Bolsonaro para presidir a Fundação Nacional do Índio (Funai). Xavier é próximo de deputados da chamada bancada ruralista do Congresso, mas não é só isso que caracteriza a trajetória dele.
Quando delegado, sua atuação foi investigada em duas apurações internas da PF, e ele chegou a ser afastado de uma operação em terra indígena. Xavier também foi rejeitado numa primeira avaliação psicológica para o cargo de delegado da PF, embora tenha passado em outra, depois.
A reportagem é de André Shalders, publicada por BBC News Brasil, 25-07-2019.
O primeiro presidente da Funai na gestão do presidente Jair Bolsonaro (PSL) foi o general da reserva do Exército Franklimberg Ribeiro de Freitas. Ele foi removido do cargo em meados de junho. De ascendência indígena, Freitas disse em seu discurso de despedida que Bolsonaro estava mal assessorado sobre política indigenista, e atacou o pecuarista Luiz Antônio Nabhan Garcia, atual secretário de política fundiária do Ministério da Agricultura (Mapa) e ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR).
"Quem assessora o senhor presidente não tem conhecimento de como funciona o arcabouço jurídico que envolve a Funai (...). E quem assessora o senhor presidente é o senhor Nabhan. Que, quando fala sobre indígena, saliva ódio aos indígenas", disse o general da reserva.
A presidência da Funai estava vaga desde a saída de Ribeiro de Freitas. Agora, será ocupada por uma pessoa relacionada a Nabhan.
Em janeiro deste ano, Marcelo Augusto Xavier chegou a ser nomeado para trabalhar como assessor do pecuarista Nabhan no ministério - mas, como não foi cedido a tempo pela Polícia Federal, teve a sua nomeação anulada em abril, segundo contou o próprio Nabhan à BBC News Brasil.
Xavier foi nomeado para o cargo na última sexta-feira (19) e tomou posse nesta quarta (24).
No governo de Michel Temer (MDB), Marcelo Augusto Xavier foi ouvidor da Funai por alguns meses e, depois disso, assessor do ministro Carlos Marun (Secretaria de Governo) para assuntos ligados à questão agrária. Antes ainda, em 2016, trabalhou na CPI da Funai e do Incra a convite de deputados da bancada ruralista - o relatório final da CPI pediu o indiciamento de antropólogos, indígenas, servidores públicos da Funai e de integrantes de ONGs.
A retórica de Bolsonaro contra as demarcações de terras indígenas vem de antes da campanha eleitoral. "Se eu chegar lá (na Presidência da República), não vai ter um centímetro demarcado para reserva indígena ou para quilombola", disse ele em abril de 2017, numa palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro.
Para entidades ligadas aos indígenas, a nomeação de Xavier é parte da estratégia do governo para evitar novas demarcações de terras e embaraçar os trabalhos da Funai.
Ao mesmo tempo, o ex-deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT), que trabalhou com Xavier na CPI da Funai e do Incra da Câmara dos Deputados, diz que o delegado sempre teve um bom relacionamento com os indígenas - exceto aqueles ligados às ONGs. Xavier detém conhecimento profundo sobre a temática indígena, segundo Nilson Leitão. Outro ex-chefe de Xavier também elogia o seu trabalho. "Foi um bom assessor. Conhece a questão indígena", disse o ex-ministro Carlos Marun à BBC News Brasil. "Tem visão crítica quanto ao trabalho de algumas ONGs no assunto", acrescenta.
A reportagem da BBC News Brasil tentou contato com Marcelo Augusto Xavier por meio da assessoria de imprensa da Funai ao longo desta semana, mas não obteve resposta. A assessoria de imprensa da fundação diz que, como ele acaba de tomar posse, ainda não teve como tratar do assunto. A reportagem também procurou o delegado em seu e-mail institucional da Polícia Federal, mas não obteve resposta. Este texto será atualizado caso as respostas sejam enviadas.
Prestes a completar 43 anos, Xavier é técnico em Agropecuária e bacharel em Direito por uma universidade privada de São Paulo. Concluiu também uma pós-graduação em ciências criminais na Universidade Anhanguera Uniderp (MS).
Em nota oficial da Funai, ele disse que sua gestão na Funai terá por objetivo melhorar as "condições de vida" dos indígenas e "dar autonomia aos seus povos para decidirem".
"O modelo até então desempenhado (na Funai) não vinha sendo efetivo. Logo, serão bem-vindas sugestões que possam contribuir com as comunidades, e o quadro de servidores do órgão é imprescindível para isso. Seguindo a legalidade, precisamos focar em garantias de dignidade aos povos indígenas e na melhor aplicação dos recursos públicos", disse ele em nota oficial da fundação.
A íntegra da reportagem pode ser lida aqui.
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Reprovou no psicotécnico, investigou desafeto e atacou procurador: a trajetória do novo presidente da Funai - Instituto Humanitas Unisinos - IHU