01 Julho 2019
Enquanto a cidade de Nova York se preparava para a Parada do Orgulho Gay – que neste ano marca o 50º aniversário das manifestações de Stonewall, que trouxeram à tona os direitos LGBTQ na consciência pública – os católicos se reuniram no dia 26 de junho na Fordham University para explorar o modo como a sua Igreja está lidando com os movimentos LGBTQ em todo o mundo.
A reportagem é de Peter Feuerherd, publicada por National Catholic Reporter, 28-06-2019. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ativistas católicos da Uganda, México e Filipinas descreveram o impacto que a Igreja tem sobre os direitos LGBTQ, como um obstáculo total em Uganda até os sinais de esperança no sul da fronteira com os EUA.
O evento “LGBTQ + Catholic Activism: A Global Conversation” foi copromovido pelo Departamento de Teologia da Fordham e pela Igreja de São Francisco Xavier, uma paróquia jesuíta de Manhattan. Ele foi moderado por Jamie Manson, colunista do NCR e editora de livros, e por Craig Ford, professor colaborador e pós-doutorando em Teologia da Fordham.
Ssenfuka Joanita Warry, diretora executiva da Freedom and Roam Uganda, um grupo dedicado à luta pelos direitos LGBTQ, disse que a situação no seu país é terrível e que a Igreja Católica não está ajudando.
“Você não quer que o seu filho saiba que você é gay na Uganda”, disse ela, descrevendo sua situação com uma parceira lésbica, criando três filhos da sua parceira.
O ex-marido de seu parceiro espalhou a notícia de que ela está em um relacionamento lésbico, um ato que Warry descreveu como ameaçador em um país onde a homossexualidade é frequentemente combatida com veemência. Ela e sua parceira tentaram guardar silêncio sobre sua orientação sexual em relação às três crianças que estão criando.
“Tem que ser tudo dentro do armário. Quando a criança descobre, há uma reação”, disse ela.
Bispos e padres ugandenses regularmente encorajam a discriminação contra as pessoas LGBTQ, tanto nas homilias quanto em declarações públicas. Mas Warry acha importante para ela continuar indo à missa como uma testemunha de que é possível ser lésbica e ter uma vida espiritual católica. Ela disse que seu objetivo é um dia ser sacerdotisa.
O Pe. Argel Tuason, presidente da Comissão de Espiritualidade e Desenvolvimento da Fé da Global Network of Rainbow Catholics, é um oblato beneditino do Monastery Without Walls. Ele descreveu sua vida como uma busca pela espiritualidade católica e pela comunidade, apesar da forte oposição da Igreja e da cultura filipina em geral.
Quando jovem, ele procurou o Caminho Neocatecumenal, um grupo católico com apelo aos jovens buscadores espirituais. Enquanto estava nesse grupo, Tuason se deparou com um painel de membros que, segundo ele, tentou exorcizar sua homossexualidade.
O objetivo, liderado por um padre argentino, era “rezar para expulsar a minha homossexualidade”, disse Tuason. No ritual, o sacerdote entoava: “Você acredita que o poder de Cristo pode mudá-lo?”.
Depois de uma série de negações, Tuason respondeu que sim, porque, disse, “me cansei” do questionamento insistente.
Ele abandonou a comunidade e disse que se sentiu desolado, sem uma família espiritual. Ele leu um livro escrito pelo padre jesuíta John McNeill em uma livraria, folheando as páginas rapidamente antes que a loja fechasse, porque não podia pagar pelo exemplar. McNeil, que morreu em 2015, foi um autor e psicoterapeuta que defendeu os direitos LGBTQ na Igreja. Tuason iniciou uma amizade via e-mail com McNeill, que foi forçado a sair da comunidade jesuíta em 1987 por seus escritos e palestras, vistos pelos superiores vaticanos como excessivamente favoráveis à homossexualidade.
Embora as dificuldades para os católicos gays sejam grandes na Uganda e nas Filipinas, há motivos para esperança no México, disse Carlos Navarro, que ajudou a criar a Mexico Network of Rainbow Catholics.
Cerca de metade dos 32 Estados do México legalizaram o casamento gay, e o próprio Navarro está casado com Eduardo, seu parceiro há 22 anos. “Estamos nos movendo e, no fim, chegaremos aos 32 Estados”, disse.
Embora a Igreja tem se oposto ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, seu grupo, disse Navarro, que já trabalhou na mídia católica na Cidade do México, está “usando as ferramentas da Igreja”, incluindo a citação das Escrituras, “para fazer com que a Igreja saiba que ela está enganada, que ela está errada”.
Navarro disse que se envolveu com a evangelização para católicos LGBTQ porque queria recriar o senso de comunidade espiritual que ele experimentou com um grupo de jovens na sua cidade natal de Puebla. A comunidade que ele fundou na Cidade do México agora tem cerca de 60 membros, de todas as classes sociais, incluindo gays e heterossexuais, que se reúnem duas vezes por mês. Um pároco convidou o grupo para formar um coral em sua paróquia.
“Não há dúvida de que é um coro gay”, contou. Mas a missa, em si mesma, é para todas as pessoas.
Essa sensação de inclusão é o que Navarro está tentando construir no México. Ele disse que outros grupos católicos LGBTQ têm um estilo mais agressivo. Mas, no longo prazo, disse ele, a inclusão é o que mudará as atitudes.
“A Igreja não é o inimigo”, disse ele. “Os heterossexuais não são o inimigo.” Ele disse que a Igreja vai mudar não por um decreto do papa, mas pelo exemplo das pessoas LGBTQ que são abertamente parte da sua vida.
Em Uganda, nas Filipinas e no México, a crescente presença de evangélicos, muitos financiados pelos Estados Unidos, representa uma ameaça mais agressiva aos direitos LGBTQ do que a Igreja Católica, disseram os painelistas. Eles se tornaram politicamente engajados, lutando contra a legislação que proíbe a discriminação.
Todos os três painelistas disseram que o Papa Francisco, cujas palavras de acolhida à comunidade LGBTQ foram muito divulgadas, poderia fazer mais para se posicionar contra a discriminação aberta.
“Se o papa apenas se pronunciasse contra a discriminação, eles ouviriam”, disse Warry, que observou a forte influência que a Igreja tem na Uganda, um país onde as lideranças religiosas são reverenciadas.
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Ativistas examinam o impacto da Igreja nos movimentos LGBTQ em todo o mundo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU