06 Mai 2019
Recebemos e publicamos a seguir o relatório para o Conselho Permanente da CNBB de março 2019.
Segundo o padre Dário Bossi, “é um trabalho consistente e profético, que resumimos num documento que já foi entregue ao Conselho Permanente e analisado num encontro temático, com mais de 20 bispos de dioceses atingidas por mineração, dia 30 de abril, sempre em Aparecida”.
O GT Mineração foi criado em 2017, em fidelidade ao legado da encíclica Laudato Si’, num contexto de post-boom da mineração. A CNBB já vinha atuando há tempo no monitoramento e na articulação de iniciativas, movimentos e entidades que atuam frente aos impactos negativos da mineração; desde 2012 estava empenhada no debate sobre o novo Marco Legal da Mineração e contribuiu à fundação, em 2013, do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração.
Tendo consciência do aumento dos conflitos e das violações provocadas pelo extrativismo mineiro, bem como da nova ameaça dos projetos de fracking que iniciam a se instalar no País, a CNBB buscou consolidar uma assessoria para as igrejas locais, em defesa da vida e dos territórios.
A primeira reunião do GT Mineração realizou-se em julho de 2017. O GT nasceu e se consolidou, portanto, entre dois acontecimentos trágicos e criminosos, que demonstram a violência dos projetos extrativos no Brasil, tendo a corresponsabilidade de Estado e empresas: a queda da barragem de Fundão em Mariana e aquela da barragem da mina Córrego do Feijão em Brumadinho.
A composição do GT é a seguinte:
Presidente: Dom Sebastião Lima Duarte (à época bispo de Viana, atualmente de Caxias);
Dom André de Witte (Ruy Barbosa) e Dom João Mamede (Umuarama); Moema Miranda, Frei Rodrigo Peret, Reginaldo Argentino, Jarbas Vieira, pe. Dário Bossi e Frei Olavo Dotto (Comissão 8). Os assessores do GT contribuem com a experiências dos movimentos e redes que representam: rede Igrejas e Mineração; MAM; Comitê em Defesa dos Territórios frente à Mineração; Coalizão não Fracking Brasil pela Água, Clima e Vida; Serviço Inter-Franciscano de Justiça, Paz e Ecologia; rede Justiça nos Trilhos; Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale; etc.
Paracatu de Baixo (Foto: Thomas Bauer)
O primeiro encontro ampliado do GT foi realizado em parceria com a rede Igrejas e Mineração, em Mariana (MG), em novembro de 2017. Tinha como tema “Espiritualidades, Resistências e Alternativas em Defesa dos Territórios”. Reuniu cerca de 40 pessoas de diversos estados do País, entre agentes de pastoral, militantes e ativistas que atuam em áreas de mineração, representantes de populações indígenas e quilombolas afetados pela mineração, organizações da sociedade civil, teólogas/os e estudiosas/os, para um tempo de reflexão, oração e fortalecimento da capacidade de resistir e gerar alternativas ao atual modelo extrativista. O encontro teve início na comunidade de Paracatu de Baixo, Mariana – MG, no dia em que se completavam dois anos do crime da Vale e BHP (Samarco), que ceifou a vida de 19 pessoas, provocou um aborto espontâneo e causou danos socioambientais irreversíveis na região.
Foi publicado e divulgado um relato que incluiu relevantes reflexões e os testemunhos; consolidou-se a necessidade de avançar na investigação ecoteológica e de aprofundar a escuta das espiritualidades dos povos e das comunidades.
Um segundo encontro, em nível internacional, foi realizado em Brasília, em agosto de 2018, numa parceria entre o GT Mineração, a rede Igrejas e Mineração, o CELAM-DEJUSOL e CIDSE.
Visita do grupo internacional a Paracatu (Foto: GT Mineração)
Reuniu 30 participantes, atingidos-as pela mineração, vindo de Argentina, Brasil, Colômbia, Chile, Guatemala, Honduras, Nicarágua, Peru.
O encontro teve como objetivo consolidar a articulação e o diálogo com as comunidades afetadas pela mineração na América Latina e concretizar a atuação da Igreja nestes contextos, a partir da inspiração da Carta Pastoral do CELAM, “Discípulos Missionários Custódios da Casa Comum - Discernimento à luz da Laudato Si’”, publicada em março de 2018.
Este evento posicionou o GT em diálogo com a Igreja latino-americana e estimulou a tradução ao português da Carta Pastoral, que agora está sendo divulgada no Brasil também através do próprio GT. No primeiro dia de atividades, o grupo visitou algumas comunidades atingidas por mineração no município de Paracatu (MG); a visita provocou ações de continuidade no acompanhamento das reivindicações destas comunidades e uma série de encaminhamentos, o primeiro dos quais será um seminário de debate e denúncias das violações sofridas pelas comunidades, previsto para o mês de maio de 2019. Em Paracatu e nas dioceses circunstantes, o GT e Igrejas e Mineração estão consolidando uma rede de lideranças eclesiais empenhadas no enfrentamento às violações da mineração.
Um terceiro evento foi realizado no bairro de Piquiá, município de Açailândia (MA). Tratou-se do “Encontro das comunidades atingidas por mineração em diálogo com a Igreja no Norte e Nordeste”, com a participação de lideranças eclesiais comunitárias, mulheres, jovens, crianças, lideranças indígenas, pescadores, lavradores dos estados de Maranhão, Pará, Tocantins e Piauí e a presença de quatro bispos da região.
Imagem: áreas a “risco fracking” no Brasil
O encontro resultou numa carta-compromisso, amplamente divulgada, com denúncias e propostas e uma articulação específica para conscientizar a população sobre os perigos da técnica do faturamento hidráulico.
A ONG "Franciscans Internacional" participa, com voz consultiva, do Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre Empresas Transnacionais e Direitos Humanos da Comissão de Direitos Humanos da ONU em Genebra.
Durante a quarta sessão deste Grupo de Trabalho, de 15 a 19/10/2018 em Genebra, Franciscans International organizou um Evento Paralelo: “A voz dos bispos sobre a necessidade de um tratado sobre a maior responsabilidade das empresas sobre abusos contra os direitos humanos”.
O Presidente da Comissão Intergovernamental participou do Evento Paralelo onde destacou que o objetivo da Comissão não é ser contra empresas ou economia, mas garantir os direitos dos pequenos e possíveis vítimas. Dom André De Witte, como Presidente da CPT e Membro do GT Mineração da CNBB, foi convidado e participou do evento em Genebra.
Os trágicos acontecimentos de Brumadinho provocaram o GT, em parceria com a rede Igrejas e Mineração, a mobilizar-se imediatamente em apoio às vítimas e em solidariedade e colaboração com a Igreja local. Dom Sebastião logo manifestou ao Arcebispo de Belo Horizonte, dom Walmor, a vizinhança e disponibilidade do GT. Frei Rodrigo Peret, em nome do Grupo de Trabalho, deslocou-se a Brumadinho e permaneceu lá por algumas semanas, articulando as pastorais sociais e oferecendo suporte ao bispo auxiliar, dom Vicente Ferreira.
Papa Francisco recebe frei Rodrigo e Sr. Dari Pereira (Foto: GT Mineração)
No dia 03 de maio, frei Rodrigo e um sobrevivente do crime da Vale em Brumadinho, o sr. Dari Pereira, foram recebidos por Papa Francisco no Vaticano. As duas testemunhas estavam em Roma por ocasião de um encontro de reflexão sobre a Igreja e a mineração, promovido pelo Dicastério para o serviço ao Desenvolvimento Humano Integral. O sr. Dari doou a Papa Francisco fotografias com os nomes das 270 pessoas que foram mortas pelo rompimento da barragem. O Papa, visivelmente comovido, as abençoou e quis ficar com elas.
No dia 18 de maio, o representante do Papa e Secretário do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral, mons. Bruno Duffé, visitará Brumadinho, numa jornada de oração, solidariedade e celebração da esperança.
Imagem: CELAM
Ao longo do segundo semestre de 2017, o GT Mineração manteve diálogo constante com o Departamento de Justicia y Solidaridad (Dejusol) do CELAM, com sede em Bogotá, Colômbia.
Uma equipe do Dejusol e alguns assessores externos estavam trabalhando à redação da Carta Pastoral “Discípulos Missionários, Custódios da Casa Comum”. Trata-se da contextualização em América Latina da encíclica Laudato Si’.
O GT Mineração foi convidado a participar à construção final desta Carta e enviou ao Dejusol em dezembro de 2017 uma série de observações, acréscimos e contribuições, que em boa parte foram incluídas no texto definitivo, publicado e divulgado em março de 2018.
A Carta é contundente, rica de informações, precisa em suas denúncias e nas propostas de transformação do modelo extrativista.
Graças ao empenho do GT Mineração, foi traduzida ao português e publicada no Brasil pelas Edições CNBB.
O GT está trabalhando a um mapeamento dos territórios do Brasil onde existem conflitos provocados pela mineração, destacando em cada um deles eventuais posicionamentos da Igreja local ao lado das comunidades e em defesa delas.
Estamos também identificando casos paradigmáticos que possam ser apresentados como testemunho para outras comunidades que estejam buscando inspiração e exemplos.
Existem 14 mil títulos minerários no Brasil; atualmente, há 3.500 minas em atividades no País. Nosso mapeamento documenta 250 conflitos no Brasil, no território de 86 (arqui)dioceses.
A elaboração gráfica dos dados coletados, o aprofundamento e detalhamento e a atualização permanente dos mesmos podem ser tarefas importantes para o futuro do GT.
Assembleia Geral da CNBB (Foto: GT Mineração)
Aproveitando da presença de todos os bispos, convocados para a Assembleia Geral da CNBB, o GT Mineração organizou no dia 30 de abril uma reunião aberta para os bispos em cujas dioceses existem conflitos por mineração. Houve a participação de cerca 30 bispos, que por quatro horas seguidas debateram ativamente, com interesse e importantes propostas, sobre o tema.
Percebe-se a preocupação da Igreja do Brasil com respeito aos impactos negativos e às violações da mineração, ainda mais num contexto em que o extrativismo ameaça sua expansão nas terras indígenas e demais áreas protegidas.
Sentimos a necessidade de consolidar uma maior presença nos territórios, dando continuidade aos encontros regionais, aproximando mais o GT às dioceses interessadas e continuando a preciosa colaboração com a rede ecumênica Igrejas e Mineração.
Continuamos sonhando com a possibilidade de uma Campanha da Fraternidade sobre Extrativismo: depois dos recentes crimes ambientais e no contexto de expansão da mineração ameaçado pelo governo atual, parece-nos uma reflexão urgente e essencial, para pensar o futuro do País.
Considerando o contexto atual, esperamos que o GT Mineração seja relançado e transformado em Comissão Especial sobre a Mineração.
A intuição profética da CNBB, ao posicionar-se com clareza frente às ameaças e perigos da mineração, está sendo confirmada pelos recentes crimes sócio-ambientais e necessita consolidar-se, aprofundando a reflexão e a definição de estratégias para o imediato futuro e para o longo prazo, em sintonia com os ensinamentos da encíclica Laudato Si’ e com o Sínodo para a Amazônia.
GT Mineração da CNBB
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GT Mineração da CNBB: vinte meses de atividades e compromisso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU