27 Setembro 2017
Uma decisão recente do Papa Francisco de retomar o Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família pode deixar algumas pessoas "pró-vida" nervosas, mas o arcebispo italiano Vincenzo Paglia e o Monsenhor Pierangelo Sequeri afirmam que não há necessidade: o papa não está subtraindo nada do instituto, mas dobrando seu valor.
A entrevista é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 23-09-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Todos os líderes naturalmente se deparam com certos círculos que por vezes não conseguem deixar de vê-los com certo ceticismo. Desde o início, um desses grupos na Igreja que Francisco tem lutado para formar foi composto dos mais francos e comprometidos pensadores e ativistas pró-vida do catolicismo.
Assim, quando o Vaticano anunciou recentemente que as bases do Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família, fundado por João Paulo em 1981 e há muito visto como um baluarte da causa pró-vida, estavam sendo reorganizadas pelo Papa Francisco, a notícia foi recebida com apreensão por alguns círculos, talvez principalmente entre os estadunidenses pró-vida.
Para todos aqueles que estão nervosos pelo fato de que as mudanças possam representar uma bandeira branca nas batalhas pró-vida atuais, o arcebispo italiano Vincenzo Paglia e o Monsenhor Pierangelo Sequeri, Grão-chanceler e Presidente do novo instituto, respectivamente, têm uma mensagem simples: "Relaxem".
"Lembrem-se de que também estão falando com o Presidente da Pontifícia Academia para a Vida", disse Paglia em uma entrevista ao Crux , na quinta-feira. "Não permitirei que ninguém seja mais 'pró-vida' do que eu."
Sequeri foi igualmente assertivo.
"Em primeiro lugar, nunca me ocorreria apresentar alguma alternativa a ser 'pró-vida'", disse ele, durante uma conversa na sede do Vaticano tanto da Pontifícia Academia para a Vida como do Pontifício Instituto João Paulo II para Estudos sobre Matrimônio e Família.
Ainda assim, Paglia insistiu que a noção do que significa ser pró-vida deve ser adaptada às circunstâncias em mudança.
"Justamente porque sou pró-vida, não posso aceitar, por exemplo, a pena de morte", declarou Paglia. "Porque sou pró-vida, não posso aceitar que os imigrantes morram nas ruas. Porque sou pró-vida, não posso aceitar isto nos Estados Unidos; nestes primeiros seis meses [de 2017], houve 6.500 mortes envolvendo armas de fogo, o que representa mais do que o dobro do atentado das Torres Gêmeas."
"Neste sentido, segundo o que penso, e falei aos bispos estadunidenses em fevereiro, acredito que chegou a hora de a Igreja assumir a defesa da vida em um sentido global, incluindo a questão ecológica", afirmou.
Ambos Paglia e Sequeri disseram que todos os funcionários e projetos do instituto permanecerão e que o reinício não significa subtrair nada, mas desenvolver novas capacidades.
"Acreditem, não temos objetivo nenhum de dizer: 'Vou mudar isso, vou mandar embora essas pessoas e encontrar outras'", afirmou Sequeri. "Eu me comprometi em trabalhar com esta estrutura e com estas pessoas."
Na verdade, segundo Paglia, longe de ser um retiro na defesa da família e da mensagem pró-vida da Igreja, a refundação representa uma aposta maior do Papa Francisco.
"O papa Francisco manteve os talentos que já estavam lá, e ainda estão aqui, no instituto, como idealizado por João Paulo II, mas sentiu-se na responsabilidade de aumentá-lo, não de rebaixá-lo", afirmou. "Ele está apostando ainda mais [no instituto] do que João Paulo II."
"Neste momento, somos obrigados a expandir tudo, assim como todos os institutos relacionados", disse Paglia, referindo-se aos 11 institutos afiliados ao redor do mundo, incluindo um em Washington, D.C.
"O papa não quer que simplesmente organizemos escolas, mas que tudo se torne padrão de excelência na área", disse Paglia.
Ele também afirma que, assim como o documento de 1981 de João Paulo II sobre a família, Familiaris Consortio, guiou a visão do instituto original, a " Carta Magna" para o novo instituto deve ser o documento de Francisco, Amoris Laetitia. Longe de representar uma mudança de percurso, no entanto, argumentou que Francisco é realmente o "melhor intérprete" de Familiaris Consortio.
"Posso dar um exemplo claro, que é o caso dos divorciados e casados novamente. A verdadeira revolução aconteceu com João Paulo II, não Francisco, que ainda não foi entendido. É preciso lembrar que, antes [de Familiaris Consortio], não é que os divorciados e recasados não pudessem comungar, eles eram praticamente excomungados e expulsos. Eram estrangeiros. Depois de João Paulo, todos estavam dentro de casa", declarou.
Seguem trechos da entrevista do Crux com Paglia e Sequeri, no dia 21 de setembro, que aconteceu originalmente em italiano.
Não é simplesmente uma atualização ou revisão do instituto, mas uma refundação completa, o que pode parecer um movimento bastante drástico. Por que era necessário?
Paglia: Comecemos por uma premissa: o papa não é o guardião de um museu, mas de um corpo vivo. Se esse corpo vivo cresce e vira um adulto, não pode ser tratado ou pensado como quando tinha cinco ou dez anos de idade. Diante das mudanças que vimos, tanto na consciência da Igreja como nas condições sociais, culturais e antropológicas do mundo, o instituto não podia ficar como estava. Tinha de ir além das intuições do Papa João Paulo II [em 1981], para ter novas indicações à luz dessas condições sobre como a família pode viver sua vocação missionária.
Hoje, há uma desorientação geral da família. O Papa Francisco intuiu isso. Ele manteve os talentos que já estavam lá, e ainda estão aqui, no instituto, como idealizado por João Paulo II, mas sentiu-se na responsabilidade de aumentá-lo, não de rebaixá-lo.
Então, não é uma questão de subtração, mas de adição?
Paglia: Trata-se de crescimento, apenas crescimento.
Neste sentido, penso que há um mandato claro do Papa Francisco de cultivar a herança [do instituto] e fazê-la florescer novamente, para que possa oferecer os frutos que as pessoas precisam hoje. O que quero evitar é o que aconteceu com os seguidores de Jesus quando estavam com fome e foram a uma figueira cheia de folhas, mas quando foram pegar o fruto, não havia nenhum. A árvore havia secado.
Sequeri: Olhe, esse carro ainda está bom, ainda funciona. Foi uma invenção engenhosa. Agora, precisa desenvolver uma nova capacidade, adequada à situação que enfrentamos hoje. Não temos mais apenas uma "crise da família cristã" ou "da família religiosa", temos uma crise geral da família. Todos estão presos nisso, e é algo novo. Naquela época, a questão era se o casamento tinha ou não que ser católico ou religioso. Hoje, é se ele é necessário. Temos que entender isso.
Portanto, é claro que essa invenção, especializada na visão de João Paulo II - que também era a visão do concílio, que fez uma enorme contribuição -, diz que precisa haver pontos de encontro estratégicos entre a Igreja e o mundo, e essa questão da família já não pode ser tratada isoladamente, tem que ser parte do todo. João Paulo II disse: "A Igreja deve ter sua própria instituição para estimular a ação acerca do assunto, também em termos de estudos, cultura, reflexão, não apenas práticas pastorais". Novamente, foi uma ótima ideia, e o carro continua funcionando bem.
Agora, esse carro tem que desenvolver uma nova marcha. Muitos disseram, nos últimos trinta anos: "O carro de 30 anos atrás veio de outro papa, em uma época diferente da nossa. Será que ele consegue desenvolver uma nova marcha?" O que por vezes se ouviu foi um questionamento sobre se isso realmente era possível, pois na estrada atual há muitos carros mais novos, mais rápidos e mais fortes.
O movimento do Papa Francisco em relação a isso é realmente interessante. Basicamente, ele disse: "Ainda é o melhor carro que temos." Agora, se não o tivéssemos, teríamos que inventá-lo. Mas ele já existe e tem um grande patrimônio de experiências. O truque é desenvolver outras capacidades, e a primeira coisa é parar com o preconceito que diz que isso não é possível porque nasceu em outro momento.
Esse é o movimento central deste papa, escolher a refundação. Ele poderia simplesmente ter dito: 'Olha, Paglia e Sequeri, agora isso é seu, façam o que puderem e vejam que mudanças vocês recomendam'. Seria mudar de motorista, não de carro. Em vez disso, o papa disse: "Estou colocando meu nome nisso e estou relançando-o." O interessante é que é um relançamento de alto perfil, uma refundação completa. Ele não se limitou aos incentivos.
Também é interessante que ele disse que vai ser uma instituição completamente nova, absorvendo a antiga, mas terá o mesmo nome. Está dizendo: "Estou colocando meu nome neste novo carro, mas vou deixar que as pessoas que já estão nele dirijam.
Acredito que conseguirão mantê-lo em condições adequadas para desenvolver a nova marcha." Viu o que ele está fazendo? De uma só vez, ele neutralizou a ideia preconceituosa de que o velho carro não tinha como ser salvo e colocou seu nome na ideia de que é possível, para que ninguém mais possa dizer: “Você é o produto de outra época, isso simplesmente não funciona mais." Ele também está dizendo às pessoas que já estão lá [no instituto] que tem fé neles: "Ok, este é o carro novo, use-o para desenvolver as capacidades que precisamos".
Vocês dois continuam se referindo ao papa Francisco. Até que ponto ele se envolveu pessoalmente na elaboração deste novo carro?
Paglia: Eu era presidente do Pontifício Conselho para a Família. Quando o papa reorganizou os dicastérios a partir de uma perspectiva pastoral [criando o novo Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, liderado pelo cardeal estadunidense Kevin Farrell], sentiu a necessidade de fazer o mesmo com outras instituições que trabalham nas mesmas questões no nível cultural. Ele me pediu para orientar, ao mesmo tempo, ambas as entidades - a Academia para a Vida e o Pontifício Instituto João Paulo II -, que antes eram totalmente separadas. Agora, de certa forma, estão unidas, também legalmente. O papa não apenas ofereceu uma espécie de exortação genérica.
Lembre-se que o instituto criado por João Paulo II saiu de um sínodo [sobre a família] e de uma exortação apostólica pós-sinodal, Familiaris Consortio. Agora, houve outros dois sínodos e outra exortação apostólica, Amoris Laetitia. Nesse sentido, a direção do novo instituto está estritamente conectada a Amoris, que se torna sua Carta Magna.
Sequeri: Quando me perguntaram se eu queria ajudar a dirigir esse carro, eu disse: "Sim, porque ainda está bom." Anote isso! Agora, precisamos apenas honrar esse novo objetivo.
Vocês dois falaram sobre a necessidade de desenvolver novas capacidades para este carro que ainda funciona e ainda é capaz de responder a novas situações. Que capacidades são essas, exatamente?
Sequeri: Resumidamente, penso que a essência dessa nova capacidade é perguntar qual é a novidade que se apresenta hoje no campo da Igreja, da família e do mundo? É que hoje a questão do pai, a questão feminina, a questão das gerações, não são mais meros capítulos da teologia moral que vêm com uma série de regras de comportamento. Tornaram-se questões globais que constituem a própria estrutura da sociedade. Elas conduzem a política e estão fortemente condicionadas pela economia e pelo surgimento de novas tecnologias.
Precisamos de um instituto pontifício de estudos que possa dizer: "Não vamos nos assustar, mas esses desafios precisam ser enfrentados." Nossa nova capacidade deve ser de nos colocar em posição de desenvolver cursos de estudo, seminários, diálogos culturais com outras instituições, e, por fim, trabalhar nisso com colaboradores. Também temos que ampliar nossos horizontes, olhando para a política, a economia e não apenas a filosofia. Temos de ser inteligentes nesta nova situação.
A segunda novidade é que este papa disse: "Tudo o que vocês fizeram até aqui foi ótimo, todas as atualizações trazidas à tradição cristã, e assim por diante. No entanto, mesmo no campo estritamente eclesiástico, precisamos de uma nova capacidade." A Igreja, em relação a todas essas coisas, precisa refletir, e também deve mostrar-se capaz de viver esses desafios, adentrá-los, vivê-los do lado de dentro.
Durante muito tempo, grande parte dessa reflexão era trazida pelos sacerdotes - embora, é claro, todos nós tenhamos nossas famílias, de onde viemos -, mas não vivemos profundamente esses desafios de dentro. A Igreja precisa viver dentro dessa situação difícil, e um instituto como o nosso precisa ser capaz de preservar o tesouro da experiência do trabalho que a Igreja já fez nesta área, mas, a partir de agora, oferecer instrumentos de formação, para sacerdotes e para famílias, para que possamos realmente viver essa nova situação.
Se ficarmos assustados com tudo e tentarmos nos retirar do que está acontecendo, você pode ter toda a doutrina que quiser, mas não vai alcançar nada.
Paglia: Para isso, o papa decidiu claramente fazer do Pontifício Instituto João Paulo II não um apêndice de uma faculdade ou que dependa de alguma estrutura burocrática, mas torná-lo autônomo, tanto que tem um Grão-chanceler. Isso mostra o quanto ele está preocupado com isso.
Para fazer uma comparação, basicamente o que o papa fez foi fazer do Pontifício Instituto João Paulo II o mesmo em relação a estudos sobre a família que o Pontifício Instituto Bíblico é para a Bíblia, no nível universal.
Sequeri: No fundo, ele quer que a Igreja dirija um carro excelente, em filologia, nível cultural, etc.
Paglia: Ele está apostando ainda mais [no instituto] do que João Paulo II.
Você está dizendo que é a segunda aposta papal da história na capacidade da Igreja de fazer algo criativo sobre a família?
Paglia: Com certeza!
Sequeri: Sim, certamente…
Paglia: Na verdade, a partir desse ponto de vista, também somos obrigados a expandir tudo, assim como todos os institutos relacionados. O papa não quer que simplesmente organizemos escolas, mas que tudo se torne padrão de excelência na área.
Sequeri: Principalmente no que tange à pesquisa...
Paglia: O que penso é que o Papa Francisco interpretou, de maneira mais profunda do que outros, o significado de Familiaris Consortio. Tenho muita certeza disso. E vou dizer por que: o papa Francisco levou adiante, levantou, algumas intuições presentes em Familiaris Consortio que não ficaram totalmente explícitas.
Posso dar um exemplo claro, que é o caso dos divorciados e recasados. A verdadeira revolução aconteceu com João Paulo II, não Francisco, que ainda não foi entendido. É preciso lembrar que antes [de Familiaris Consortio], não é que os divorciados e recasados não pudessem comungar, eles eram praticamente excomungados e expulsos. Eram estrangeiros. Depois de João Paulo II, todos estavam dentro de casa... Não tenho como simplesmente mandá-los para o terraço!
Nesse sentido, insisto que o melhor intérprete de João Paulo II é o Papa Francisco.
Sequeri: Isso significa que a Igreja tem que viver com essas pessoas, porque são nossas.
Paglia: E mais uma coisa, nesse momento, o instituto tem dois instrumentos importantes. O primeiro é uma nova cadeira de estudos, que queríamos que se chamasse Gaudium et Spes [devido ao documento do Vaticano II sobre a Igreja no mundo], para refletir sobre temas como a antropologia e a sociedade.
Em segundo lugar, a outra decisão que tomamos é que é óbvio que tudo o que fazemos tem que ser de natureza científica e, portanto, precisamos de instrumentos científicos do mais alto padrão. Por isso, por exemplo, queremos que a biblioteca do instituto torne-se um excelente centro internacional de pesquisa.
Vocês dois sabem que, nos Estados Unidos, muitos católicos há muito tempo veem o Pontifício Instituto João Paulo II sobre Família como um baluarte do movimento pró-vida, e alguns estão preocupados que esta refundação possa significar que não desempenhará mais esse papel. Isso é verdade?
Paglia: Antes de tudo, lembre-se de que você também está falando com o Presidente da Pontifícia Academia para a Vida. Não vou permitir que ninguém seja mais 'pró-vida' do que eu. Quero ser pró-vida do início ao fim, e só isso. Também quero ser pró-vida em todas as condições e situações da vida.
Justamente porque sou pró-vida, não posso aceitar, por exemplo, a pena de morte. Porque sou pró-vida, não posso aceitar que os imigrantes morram nas ruas. Porque sou pró-vida, não posso aceitar isto nos Estados Unidos; nestes primeiros seis meses [de 2017], houve 6.500 mortes envolvendo armas de fogo, o que representa mais do que o dobro do atentado das Torres Gêmeas.
Neste sentido, segundo o que penso, e falei aos bispos estadunidenses em fevereiro, acredito que chegou a hora de a Igreja assumir a defesa da vida em um sentido global, incluindo a questão ecológica.
Sequeri: Temos que nos relançar, não apenas nos defender. Em primeiro lugar, nunca me ocorreria apresentar alguma alternativa a ser 'pró-vida'. Só acrescentaria isto, que o que precisamos é de visão. No mundo atual, se formos "pró-vida" sem visão corremos o risco de nos tornar meras pessoas irritadas. Nossa convicção pró-vida é uma convicção inteligente, não apenas política.
Quando a Igreja luta uma batalha pró-vida, tem que ser de maneira inteligente, para que ninguém possa dizer: "vocês só têm linha política, mas não entendem nada de ciência, ou sociologia, etc." Não, nós entendemos, e a dignidade da Igreja está aí. Esta é uma batalha que estamos lutando em nome da fé, mas também em nome da inteligência, porque essa é a tradição católica. O catolicismo é a única religião no mundo que nunca acreditou em uma oposição entre fé e inteligência, certo? Esse é o trabalho que fazemos aqui.
O que peço é que olhem para o trabalho que estou fazendo com simpatia e não tentem me colocar, de certa forma, contra o exercício da inteligência. O que posso oferecer, ofereço contente, e é meu desejo dar a essas batalhas a dignidade da inteligência que merecem.
Lembre-se, é um instituto de teologia, é isso que fazemos.
Paglia: Estamos trabalhando com cultura e ciências, o que nos exige, mais do que o novo dicastério do cardeal Farrell, aprofundar a reflexão sobre a doutrina católica e sobre a relação entre fé e ciência. O crescimento do corpo vivo da Igreja não pode ser bloqueado. É por isso que é indispensável que uma faculdade, um instituto de ciência teológica, não permaneça apenas no nível do catecismo. Um instituto de excelência tem que ajudar a Igreja a refletir sobre seus tesouros, para que possam ser comunicados em uma linguagem compreensível aos outros.
Sequeri: À propósito, o nosso papel não é apenas dar respostas, o que, é claro, é importante. Também estamos aqui para perguntar. Não se trata de apenas alguém nos perguntar: "O que a doutrina católica diz sobre isso?" e nós respondermos. Eu sempre digo, bem, deixe-me fazer algumas perguntas. Não estou aqui apenas para dar respostas. Se você está me perguntando sobre um problema e posso dizer, com base em suas perguntas, que você ainda não entendeu, ok, então, deixe-me perguntar algumas coisas...
Paglia: Por exemplo, eu gostaria de perguntar à Europa hoje, ou à Itália, se ela é louca por não ter dois filhos. Quem sabe qual será a situação daqui a vinte anos? [Nota: Paglia referia-se ao fato de que, em muitas nações europeias, a taxa de natalidade está, em média, abaixo de dois filhos por mulher durante sua vida inteira e, portanto, abaixo da média considerada necessária para manter a população estável.]
Sequeri: É claro que isso não nos torna mais pobres, mas sim mais imbecis, porque uma geração é algo humano, e isso também tem um enorme impacto espiritual.
O que quer dizer é que a Igreja tem que se envolver nessas questões, falar com o mundo e não apenas para si mesma?
Paglia: Há uma bela expressão na encíclica Lumen Fidei, que o Papa Francisco desenvolveu a partir de um rascunho elaborado pelo Papa Bento XVI. Em uma passagem, Bento XVI, juntamente com Francisco, basicamente derrota a "opção Bento". Eles insistem que o pensamento católico deve entrar em diálogo com todas as outras perspectivas culturais, tanto para convencê-las tanto quanto possível, como para ver que verdade podem conter.
Sequeri: Acredito nisso veementemente. Inteligência é inteligência, e é bom para todos. Precisa ser bem expressada...
Finalmente, uma questão logística. O que acontecerá com as pessoas que estão trabalhando no instituto, os projetos que estão em andamento, os contratos que tem atualmente, e assim por diante? Tudo isso permanecerá como está?
Paglia: Todos ficam. Absolutamente tudo e todos permanecem como estão...
Sequeri: Todos ainda têm os mesmos compromissos, os estudantes ficam, etc.
Paglia: A ideia é crescimento...
Vocês não buscam tirar ninguém, mas sim acrescentar?
Sequeri: Exato, acrescentar não significa tirar o que já existia. Eu me comprometi em trabalhar com este carro e com estas pessoas. Eu afirmei, é uma garantia. Estou trabalhando com essas pessoas.
Paglia: Tudo isso, é claro, entendendo que não é um museu. Tem que ser vivido e tem que ser cultivado. Assim como uma diocese ou uma conferência de bispos, se, dentro do instituto, algo deixou de funcionar, tornou-se comodista ou inútil, deve ser mudado, mas isso se aplica a qualquer instituição do mundo.
Sequeri: Certo, se algo não serve aos objetivos do instituto, as mudanças devem ser feitas, mas não é uma questão de mudança de estratégia, é apenas a vida normal. Acredite, não temos objetivo nenhum de dizer: 'Vou mudar isso, vou mandar embora essas pessoas e encontrar outras'.
Paglia: Esta nova instituição também tem forte apoio da Congregação para a Educação Católica, porque está acontecendo uma reorganização geral da qual é provavelmente o primeiro exemplo. Nesse sentido, todas as instituições afiliadas nos diferentes continentes terão que se ajustar aos novos padrões solicitados.
Sequeri: Mas também podemos tranquilizar a todos, porque a Congregação também nos disse, quando se garante algo, é o suficiente, e podemos fazer as coisas, como nomear professores e aprovar cursos. Isso é importante para garantir que todos os que trabalham para nós tenham o reconhecimento adequado para fazê-lo. Também queremos que todos que tiverem a nossa certificação saibam que é real e vamos organizar isso em um curto período de tempo.
O Pontifício Instituto João Paulo II em Washington permanece mais ou menos como está?
Sequeri: Falei com eles ontem, e disseram que viram o que aconteceu. Estão felizes com isso e continuarão avançando. Eu disse a eles para continuarem em frente...
Paglia: A organização do instituto central é exatamente isso, uma reorganização do instituto central. Não é uma revisão de todos os institutos afiliados. A boa notícia é que agora o instituto central foi fortemente solidificado.
A mensagem para os afiliados é que com essa reorganização eles estão em uma posição mais forte porque vocês estão mais fortes?
Paglia: Com certeza, mas, ao mesmo tempo, também seremos mais duros, porque temos expectativas maiores.
Sequeri: Tudo isso será elaborado em conjunto. Mas o importante é que, ao colocar seu nome, Francisco está dizendo [para o povo do Pontifício Instituto João Paulo II]: "Não é que vocês sejam filhos de outra pessoa, tolerados, mas fora da família. Não, agora isso é meu." Penso que isso deve ser interpretado como um voto de confiança autoritário. Ele nos deu um objetivo ambicioso, bom, vamos alcançá-lo, mas agora há um Grão-chanceler, um Presidente e um Papa que assinaram, e vamos alcançar o objetivo com a equipe que temos. Não acho que haja espaço para qualquer outra especulação.
O pressuposto básico é que, diante de uma nova situação cultural em relação à que existia em 1981, há um novo conjunto de desafios - por exemplo, esforços para repensar toda a natureza do matrimônio -, e se não for a Igreja, quem vai os adotar?
Sequeri: É exatamente essa a expressão que uso. Temos que desenvolver esse carro potente, entendido não apenas de modo defensivo, e acho que até mesmo os intelectuais seculares estão começando a ver isso... se a Igreja não tomar a iniciativa, com inteligência, com visão, não apenas com força, para explicar que estamos prestes a perder algo vital - para todas as pessoas, não apenas para a religião ou a política -, não sei quem mais pode fazê-lo. Essa é a verdadeira batalha de hoje.
Isso pode abrir a possibilidade de novas alianças para a Igreja também, não é?
Sequeri: Certamente. Considere a Itália hoje, onde as vozes mais ativas contra a "barriga de aluguel" [ou seja, tratar o ventre da mulher como mercadoria] são as feministas. É uma batalha de inteligência, que hoje pode ser compartilhada com muitas forças diferentes, ao contrário de 30 anos atrás. É mais difícil, talvez, mas acho que também há mais oportunidades.
Além disso, é importante que ajudemos o mundo a pensar mais profundamente sobre a família, mas também a respeito de áreas como a economia e a política. Por exemplo, a relação entre homens e mulheres. Como seria o mundo se homens e mulheres conduzissem a economia e a política? Neste momento, ambos são administrados com base na medida do indivíduo. Tendemos a pensar no relacionamento homem-mulher somente em termos de matrimônio, mas não é assim que funciona. Sou padre, mas também é importante para mim. O matrimônio, não, mas a aliança entre homens e mulheres também afeta a minha vida. Nos faz bem, e precisamos ajudar a convencer as pessoas disso.
Antropologicamente falando, é uma batalha compartilhada, e se a Igreja não liderar, ninguém mais o fará. Espero que consigamos!
E quanto ao financiamento? De onde vem o dinheiro para tudo isso?
Paglia: Os recursos obviamente são extremamente importantes. Devemos lembrar que o Pontifício Instituto João Paulo II não depende da Cúria Romana, mesmo que de certa forma seja economicamente vinculado a ela. Portanto, obviamente temos trabalho a fazer, para que possamos desenvolver recursos de outros setores.
Ou seja, precisarão angariar fundos?
Paglia: Exatamente, sim. Lembre-se: um matrimônio sem patrimônio tem grandes problemas!
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O Papa não recuou na causa pró-vida, mas está dobrando a aposta, constata cardeal Paglia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU