02 Mai 2013
Após aquelas do domingo passado, lemos hoje algumas das últimas palavras de Jesus, antes de sua Paixão. Aos seus amigos, ele promete o Espírito Santo e a paz; a sua paz!
A reflexão é de Marcel Domergue, sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do 6º Domingo de Páscoa. A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Eis o texto.
Referências bíblicas:
1ª leitura: Atos 15,1-2.22-29
2ª leitura: Ap 21,10-14.22-23
Evangelho: Jo 14,23-29
A morada de Deus
No evangelho de hoje, encontramos muitas palavras que nos falam de estabilidade e permanência. Quem ama mantém-se fiel à palavra do Cristo. E esta fidelidade será correspondida pela fidelidade de Deus que estabelece a sua morada naquele que ama. Não pensemos em nenhuma espécie de troca, tipo dar e receber: o amor que manifestamos é já a presença, a habitação de Deus. A questão da moradia de Deus entre os homens é uma constante na Bíblia. O Templo, com o “Santo dos Santos”, é a imagem da presença permanente e ativa de Deus. Mais tarde, quando o povo exilado na Babilônia estiver privado do Templo, a observância da Lei (“fidelidade à Palavra”) será a morada de Deus. Desde o princípio do evangelho de João, esta questão reaparece: “Onde moras?”, perguntam os discípulos, em João 1,38. Em 2,20, Jesus fala do “templo de seu corpo”, mas é no evangelho de hoje que encontramos a resposta definitiva à questão do lugar em que Deus reside: “viremos e faremos nele a nossa morada”. Mas, uma vez que se trata de amor, do amor unificante de Deus, é todo o corpo eclesial do Cristo que é a residência de Deus. Esta é a nova Jerusalém de que nos fala a segunda leitura, a cidade santa “descendo do céu” e de que o centro, o templo, é o próprio Deus. Cidade a uma só vez fechada, ou seja, protegida, e aberta para todos, pois guarnecida de portas que dão para todas as direções.
A nova morada
O Pai e o Filho vêm habitar conosco, entre nós e dentro de nós: notar o plural do versículo 23. Aí onde está o Filho encontra-se também o Pai. Ora, na leitura do evangelho de hoje e em todo o discurso após a Ceia de que este faz parte, Jesus nos fala ao mesmo tempo de sua permanência entre nós e de sua partida. “Enquanto estava convosco”, diz ele, no versículo 25. Mas, no momento em que está falando, às portas da Paixão, de alguma forma ele já partiu. O que temos, então, a permanência do residente ou a ausência do que parte? Haveria contradição nesta passagem do evangelho? Certamente que não, mas até aí a habitação de Deus entre nós só podia ser contemplada de fora. O templo era visto do seu pátio, pois era proibido entrar em seu centro, onde repousava a Arca da Aliança. E o que havia na Arca? As tábuas da Lei. Em outros termos, a Palavra de Deus, gravada em tábuas de pedra expostas num trono situado fora do alcance dos que a ela haviam de se conformar. Com a vinda do Cristo, a situação modificou-se com certeza: por ele e nele, Deus habitou o nosso mundo não mais situado no Templo, mas presente em todo tempo e lugar. No entanto, os seus discípulos podiam vê-lo fora de si mesmos; ele lhes era exterior. Este modo de presença é que irá desaparecer. Por ela, o Cristo podia certamente se achegar aos homens através de seus sentidos corporais; e a provação de não ver mais nada nem ouvir diretamente será cruel, mas necessária para que a habitação de Deus seja perfeita, para que agora ela se passe ao interior de cada um e de todos.
Habitados pelo Espírito de Deus
Em 1 Coríntios 3,17 e 6,19, Paulo diz que somos o templo de Deus e que nossos corpos são o templo do Espírito. 1 Pedro, 2,5 diz aproximadamente a mesma coisa. Se tudo isso se fez invisível para nós, foi porque dali por diante tudo se tornou um só corpo conosco. Por isso é que, no mesmo momento em que anuncia a sua partida, Jesus anuncia também a vinda do Espírito. Pelo Espírito, tudo que pertence ao Cristo e, por conseqüência, a Deus torna-se nosso e “permanecerá para sempre conosco”. O Espírito não tem nada de particular a nos ensinar, nenhuma mensagem pessoal, mas irá repetir para nós tudo o que Jesus nos disse. Por que esta repetição? Porque temos que ouvir novamente esta ou aquela palavra de Jesus em função do que temos que viver. Pelo Espírito, a palavra de Jesus deixa o domínio das generalidades para vir se encarnar bem ali, onde nos encontramos. Por isso, em meio às sugestões e solicitações que nos atacam, vamos poder discernir a voz do Espírito. Esta é a voz d’Aquele que nos defende, nos assiste e nos consola, conforme o sentido mais rico do nome “Defensor”. Compreende-se que a presença interior do Espírito possa nos dar segurança e nos trazer a paz. Por isso, no mesmo momento em que nos anunciou o dom do Espírito, Jesus nos disse: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou.”
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A minha paz vos dou - Instituto Humanitas Unisinos - IHU