11 Outubro 2018
"Eu nunca negligenciei uma meditação sobre esse tema tão decisivo". Enzo Bianchi escreve no livro "L’arte di scegliere. Il discernimento” (A arte de escolher. O discernimento - em tradução livre -, publicado por Edizioni San Paolo, p. 162, 16 euros).
Uma obra em que o fundador da comunidade monástica de Bose reflete sobre um termo, um conceito, que tinha caído um pouco no esquecimento, mas que hoje voltou a ser de grande atualidade graças ao magistério do Papa Francisco, que quis incluí-lo inclusive no título do Sínodo dos jovens. Uma escolha ainda mais significativa porque - escreve Bianchi - "é indispensável voltar a praticar esta arte tão essencial para a vida cristã e não só cristã, também oferecendo conselhos úteis e valiosos para que a nossa existência, apesar dos limites e fragilidades, chegue ao cumprimento e seja um "amém" sincero e convicto à vontade do Senhor".
A introdução de Enzo Bianchi, monge italiano, que atualmente participa do Sínodo dos Bispos, em Roma, a convite do Papa Francisco, é publicada por Avvenire, 10-10-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Nos ouvidos da maioria e, particularmente, das novas gerações cristãs, o termo "discernimento" resulta hermético. De fato, uma palavra caiu no esquecimento, mas recentemente aparece frequentemente no ensinamento do Papa Francisco. O próprio Francisco escolheu como tema para o próximo Sínodo Ordinário dos Bispos (Outubro de 2018) o discernimento, indicando-a como uma opção urgente na vida da Igreja e principalmente no processo vocacional, relativo em especial para os cristãos, que em sua jovem idade chegam a uma forma de presença específica na igreja e no mundo. Francisco em sua Exortação Apostólica Amoris laetitia (19 de março de 2016) reservou um amplo espaço ao tema do discernimento em relação à vida familiar, dedicando, inclusive, um capítulo inteiro, o oitavo, ao tema do acompanhar, discernir e integrar as fragilidades. Essa afirmação evidente e clara do Papa é significativa: "Hoje a Igreja precisa crescer no discernimento, na capacidade de discernir".
De fato, na vida monástica e na espiritualidade inaciana (da qual vem o Papa) o termo "discernimento" sempre esteve presente e a ele foram dedicados estudos e pesquisas com vista à sua compreensão e a uma realização desse dom do Espírito, desse carisma que os padres do deserto julgavam o mais necessário para seguir os passos de Cristo para o reino de Deus.
Um ancião disse: "A melhor de todas as virtudes é o discernimento." Foi perguntado a um ancião: "Qual é o trabalho do monge?" Ele respondeu: "O discernimento".
Eu mesmo, em 1975, dediquei ao discernimento uma primeira reflexão, publicada pela Federação Italiana Exercícios Espirituais, e quatro anos mais tarde, empenhei-me em um estudo mais aprofundado sobre o tema. Mais tarde, voltei frequentemente a esse tópico nas catequeses monásticas dirigidas à minha comunidade e pode-se dizer que nunca negligenciei a meditação sobre esse tema tão decisivo.
O discernimento é um dom entre os dons do Espírito Santo feitos ao crente, mas no início, nunca se deve esquecer que o dom por excelência, a coisa boa entre as coisas boas (cf. Lc 11:13), é o próprio Espírito Santo. Então não se confundam os dons com o Dom e seja feito discernimento, se reconheça que, na verdade, o Espírito é "o dom sem par" (hino Veni Creator Spiritus), a fonte de todos os dons. Esclarecido esse ponto essencial, devemos nos perguntar: como o discernimento pode ser definido?
Quanto à etimologia, "discernimento" deriva do verbo latino discernere, composto por cernere (ver claramente, distinguir) precedido por dis (entre): portanto, discernir significa "ver claramente entre", observar com muita atenção, escolher separando. O discernimento é uma operação, um processo de conhecimento, que se realiza através de uma observação vigilante e experimentação cuidadosa, a fim de nos orientar em nossas vidas, sempre marcada por limites e pelo não-conhecimento.
Como tal, é uma operação que compete a cada homem e mulher para viver com consciência, para ser responsável, para exercitar a consciência. Quando experimentamos o cansaço da escolha, da dúvida, da incerteza, ou buscamos uma orientação na vida cotidiana ou nas grandes decisões a serem tomadas, devemos fazer discernimento.
No cristão, enraizando-se nessa dimensão eminentemente humana, o discernimento se manifesta como uma sinergia entre o próprio espírito e o Espírito Santo, o Sopro da vida interior espiritual e da vida comunitária cristã: "o Espírito testemunha ao nosso espírito" (Rm 8,16) ...
O discernimento cristão não é redutível a um método e a uma técnica de introspecção, de maior conhecimento de si mesmo, mas é um itinerário que requer a intervenção de um dom do Espírito, uma ação da graça. Sim, ouvir o Espírito, escutar a voz de Deus que fala no coração humano, na criação e nos eventos da história, requer em primeiro lugar reconhecer esta voz entre muitas vozes, na certeza de que a voz de Deus não impõe, não comanda, mas sugere e propõe, mesmo com um sutil silêncio (veja 1 Reis 19, 12).
Dentro da grande tradição cristã, uma definição muito clara e sintética de discernimento e, ao mesmo tempo, articulada, é aquela de João Climaco (destaco os termos gregos, que resultarão úteis a seguir): o discernimento (diakrisis) nos iniciantes, é um supraconhecimento (epignosis) autêntico de si mesmo; naqueles que estão na metade do caminho, é um sentido espiritual que distingue (verbo diakrino) infalivelmente o bem autêntico daquele natural, e do seu contrário; nas pessoas espiritualmente maduras, é uma ciência infundida pela divina iluminação, que é capaz de iluminar com sua própria luz também o que nos outros permanece coberto pela trevas.
Talvez, mais genericamente, se define e é discernimento (diakrisis) a compreensão segura da vontade de Deus em cada tempo, lugar e circunstância, que está presente somente naqueles que são puros no coração, no corpo e na palavra ... O discernimento (diakrisis) é uma consciência imaculada e uma sensibilidade pura ... Quem possui o dom do discernimento (diakritikos) recupera a saúde e destrói a doença.
E o teólogo Giuseppe Angelini ecoa: o discernimento pode ser definido, em uma primeira aproximação, como a qualidade da alma que permite reconhecer em cada circunstância o que deve ser feito; e permite, antes mesmo, perceber em cada circunstância que é preciso fazer algo, que se pode e se deve tomar uma decisão, que as diferentes situações em que gradualmente nos encontramos nos dizem respeito, nos questionam, nos convidam a participar, não nos rejeitam para situação muito conveniente (mas também, sob outro perfil, muito inconveniente) daqueles que são sempre e apenas espectadores.
Seguindo o raciocínio destes dois autores, podemos definir o discernimento como aquele processo que cada ser humano deve realizar no duro ofício de viver, nas diversas situações com que é confrontado, para fazer uma escolha, tomar uma decisão, expressar aqui e agora um juízo com consciência. O discernimento diz respeito realmente a cada ser humano, em seu específico hic et nunc, e é essencial a cada cristão para ver, conhecer, sentir, julgar e agir em conformidade com a palavra de Deus.
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O que é o discernimento. É entender a vontade de Deus - Instituto Humanitas Unisinos - IHU