30 Agosto 2017
O decreto de Temer põe em risco um ecossistema de importância singular para a regulação climática do Brasil e do mundo e ainda tira o direito de uma instituição nacional pesquisar a rica biodiversidade local, que pode trazer soluções para muitos de nossos problemas, escrevem Carolina da Silveira Bueno e Thais Bannwart, do programa de pós-graduação do Instituto de Economia da Unicamp em artigo publicado por Brasil Debate, 28-08-2017.
Eis o artigo.
Os ajustes econômicos e o anúncio do novo pacote fiscal promovidos pelo governo Temer aprofundam a crise brasileira. Temos uma deterioração dos serviços públicos, especialmente em saúde e educação, um aumento do desemprego e da população de rua. Ou seja, os ajustes promovidos pelo governo consolidam privilégios e retiram direitos. Trata-se de uma equipe que tem um projeto de país elitista e de desmonte de bens e serviços públicos garantidos pela Constituição de 88.
A política de austeridade – política de redução do tamanho do Estado – levada a cabo pelo governo Temer atingiu um limite inaceitável. Há poucos dias, no campo socioambiental, o governo extinguiu a Reserva Nacional de Cobre e Seus Associados (Renca) para viabilizar a exploração mineral por companhias privadas do ramo. Trata-se de uma área de 47 mil quilômetros quadrados de mata fechada da Amazônia, equivalente em área ao estado do Espírito Santo.
A reserva é rica sobretudo em ouro, mas também em tântalo, minério de ferro, níquel, manganês e outros minerais. Abriga também nove áreas protegidas: o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, as Florestas Estaduais do Paru e do Amapá, a Reserva Biológica de Maicuru, a Estação Ecológica do Jari, a Reserva Extrativista Rio Cajari, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru e as Terras Indígenas Waiãpi e Rio Paru d’Este.
Com 5% de aprovação, a menor de um presidente desde a redemocratização do país, Michel Temer, acabou, por decreto, com uma regra que determinava que somente a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), pertencente ao Ministério de Minas e Energia, podia fazer pesquisa de minérios na área. O desequilíbrio socioambiental que será provocado se mineradoras privadas forem explorar essa região trará consequências catastróficas irrefutáveis.
A Floresta Amazônica constitui um ecossistema de importância singular para a regulação climática do Brasil e do mundo.
Pesquisas realizadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo em parceria com o INPE (Instituto nacional de Pesquisas Espaciais), revelam que a Floresta Amazônica produz um fenômeno conhecido como “Rios voadores”. Os rios voadores são rios aéreos de vapor bombeados para atmosfera pela floresta e explicam por que a região do quadrilátero que vai de Cuiabá a Buenos Aires, de São Paulo aos Andes é uma região verde e úmida, enquanto as outras regiões de mesma latitude do mundo são compostas por desertos.
Os rios voadores são os serviços ecossistêmicos que provêm as condições climáticas adequadas para que esse quadrilátero seja responsável por 70% do PIB da América do Sul, onde se concentram a maior parte da produção agrícola, industrial e onde estão os grandes centros urbanos.
O desmatamento inerente à mineração em uma área do tamanho da Renca certamente contribuirá para o desequilíbrio da dinâmica invisível dos rios voadores, comprometendo a produção de alimentos, atividades industriais e o abastecimento de água nas regiões que compõem o quadrilátero. Tão importante quanto a perturbação da dinâmica climática provida pelos rios voadores são os impactos ambientais na região da reserva: contaminação do solo e dos recursos aquáticos, e a destruição da biodiversidade.
Tirar o direito de uma instituição de pesquisa nacional trabalhar na região, e dar lugar a empresas que irão destruir a biodiversidade, visto que a Amazônia tem milhares de espécies endêmicas que ainda não foram descobertas, esse é o grande crime. O Brasil é o país no mundo que mais tem biodiversidade (patrimônio genético). Existem muitas plantas e espécies que só existem naquele pedaço de floresta, e algumas dessas podem conter respostas para muitos problemas. A mineração, por sua vez deixa pouco para o país.
Apesar do decreto de extinção da Renca manter as regras válidas para as unidades de conservação e terras indígenas, existem exemplos históricos sobre os impactos negativos da mineração em regiões amazônicas. A presença de uma atividade com elevado risco de impacto em uma região permeada por unidades de conservação fragiliza a integridade dessas áreas, afetando sua própria função de conservação da flora e fauna e expõe as populações tradicionais à violência e doenças.
A extinção da Renca é mais uma dentre uma série de medidas arbitrárias do atual governo que aumentam sobremaneira os problemas socioambientais e econômicos. Preservar o patrimônio genético e garantir a biodiversidade no Brasil é um dever de todos os cidadãos. É fundamental que a sociedade brasileira, do campo às grandes cidades, ecoa o grito: a Amazônia é nossa!
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