Cardeal Fernández apresentou o novo documento sobre a Dignidade: "Mostra a evolução da Igreja"

Foto: National Catholic Reporter

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09 Abril 2024

  • O prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé considerou a nova declaração como "um texto de alto valor doutrinário".

  • "Algumas pessoas que até há anos o adoravam argumentam que ao Papa só se deve ouvir quando fala ex cathedra. Isso hoje é muito sentido. Mas estou quase certo de que o Papa nunca falará assim, não vai querer criar um novo dogma".

A reportagem é de Hernán Reyes Alcaide, publicada por Religión Digital, 08-04-2024.

A Declaração Dignitas Infinita divulgada hoje pelo Dicastério para a Doutrina da Fé é "um texto de alto valor doutrinário" que assinala a existência de uma dignidade ontológica inerente ao ser humano e inviolável "em toda circunstância", juntamente com uma referência ao social e à forma de viver a vida.

O escrito, apresentado pelo cardeal Dom Víctor Manuel Fernández em uma das coletivas de imprensa mais concorridas dos últimos tempos, busca "recolher e consolidar o que disseram os últimos pontífices e sintetizar a novidade oferecida pelo papa Francisco sobre um tema estruturante do pensamento cristão clássico e cristão", conforme afirmou o prelado argentino.

Para Fernández, a dignidade humana "é um pilar fundamental do ensinamento cristão".

"Acreditamos que o mundo tem a necessidade de descobrir a dignidade de cada pessoa para não perder o caminho", acrescentou, desejando que a Declaração tenha "o mesmo nível de impacto" que sua antecessora Fiducia Supplicans, que, segundo ele, teve mais de 7 bilhões de visualizações na internet.

"É um tema que permite um diálogo frutuoso com a sociedade, 75 anos após a Declaração Universal dos Direitos do Homem, que João Paulo II qualificou como uma pedra central no caminho da humanidade, uma das mais altas expressões da consciência humana", lembrou.

Após recordar alguns trechos das escrituras em que já fica clara a inviolabilidade da dignidade, Fernández enfatizou que a publicação desta segunda-feira marca uma "evolução" na forma como a Igreja vê o tema.

Compreender a dignidade humana

"A dignidade humana não é algo que a Igreja tenha reconhecido sempre com a mesma clareza: houve um crescimento na compreensão. Desenvolve-se, aprofunda-se a compreensão. Notamos que dentro da própria bíblia há uma crescente explicação", afirmou nesse contexto.

Assim, o cardeal lembrou que embora em 1452 o Papa Nicolau V tivesse apoiado a escravidão em uma carta ao rei de Portugal, em 1537 Paulo III excomungou aqueles que a defendiam por considerá-la "humana".

"Mesmo em uma época de mudanças lentas como essa, um papa disse praticamente o contrário de um precedente em apenas 80 anos de diferença", ilustrou. "Este é um exemplo que mostra como evolui a compreensão da verdade e que não cresce sempre na direção homogênea com os documentos anteriores", acrescentou.

Fernández aproveitou o exemplo para lembrar alguns críticos do pontificado e lamentou que "agora parece que o Papa Francisco não pode dizer nada diferente do que já foi dito, como se o magistério estivesse encerrado com os papas anteriores".

"É evidente que nos últimos dois séculos o argumento teve um desenvolvimento muito maior, com uma grande riqueza no magistério a partir de Leão XIII. A Igreja aprendeu da forma mais dura, atravessando fases difíceis, falando com o mundo, ouvindo a sociedade, o que diz o pensamento, a cultura do mundo", afirmou.

Ver o conjunto da declaração

Em linhas gerais, além de conter alguns temas considerados importantes mas que pediu para serem vistos no conjunto, a Declaração "esclarece a distinção entre dignidade ontológica, que nunca se perde, e outra social, moral ou existencial que pode crescer ou diminuir com as circunstâncias da vida", afirmou.

"Posso ter uma vida indigna mas nunca perco a dignidade humana inalienável que tenho por ser humano. Outros podem fazer-me levar uma vida indigna mas nunca me retiram a dignidade por ser humano: é a mesma dignidade para alguém nascido na Itália ou na Etiópia; em Israel ou em Gaza. É exatamente a extensa e inalienável dignidade", enfatizou.

"Não há circunstância que torne uma pessoa de menor valor, sua dignidade permanece inviolável em qualquer contexto, situação, cultura", afirmou nessa direção, após lembrar que uma chave de leitura é ver a dignidade, sempre, "além de toda circunstância".

Entre os temas abordados, como o aborto, os imigrantes ou a pobreza, o cardeal assegurou que são "alguns temas que permitem contemplar a questão da dignidade em sua totalidade, e que alguns podem ter um maior consenso na sociedade e outros não, mas consideramos todos importantes".

"Não se deve ver cada tema isoladamente, mas como um todo", declarou, antes de lembrar que, apesar de se falar do aborto, "antes se fala da violência contra as mulheres".

"Todos os argumentos escolhidos são importantes para entender o tema de forma harmoniosa. O documento quer resumir em um único texto o mais importante que foi dito sobre a dignidade humana em um ponto: a dignidade de cada ser humano além de cada circunstância", concluiu.

O Papa e os ex cathedra

Diante de uma pergunta sobre como deveria ser a acolhida desta Declaração, Fernández criticou aqueles que afirmam que o Papa só será considerado quando fala ex cathedra.

"Algumas pessoas que até há anos o adoravam argumentam que ao Papa só se deve ouvir quando fala ex cathedra. Isso hoje é muito sentido. Mas estou quase certo de que o Papa nunca falará assim, não vai querer criar um novo dogma", afirmou. Assim, o cardeal criticou os "bispos e cardeais que o tratam como herege, que parecem não ter feito o juramento pelo Papa".

"São os que dizem que enquanto o Papa não fala ex cathedra são livres de pensar o que quiserem", criticou. "Até os documentos do Dicastério quando são assinados pelo Papa que ordena a publicação fazem parte do magistério autêntico do Papa", lembrou nesse sentido o cardeal.

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