11 Mai 2023
Diante da inegável ameaça da mudança climática, os primeiros a reagir foram os apóstolos do decrescimento e do “menos é mais”. Se o progresso pode nos levaria à beira do suicídio como espécie, conforme pregavam, apenas a renúncia a continuar crescendo o evitaria.
Jeremy Rifkin admite que o capitalismo impõe sua ganância sem limites aos ciclos da natureza: privatiza os recursos de todos em poucas mãos e terceiriza os resíduos e poluição até a extinção de todos. Mas, corrigir essa ameaça é também a oportunidade de melhorar nossas existências e garantir o futuro.
E explica a internet da energia, os dados, a água, o conhecimento e a democracia. Pede mais pesquisa, ciência, tecnologia, investimento, coordenação entre os países... em redes alternativas por meio das quais é preciso se mexer, organizar e trabalhar mais, não menos.
A entrevista é de Lluís Amiguet, publicada por La Vanguardia, 05-05-2023. A tradução é do Cepat.
Por que ainda utiliza máscara?
Porque o perigo de novos vírus por zoonoses provocados pela mudança climática não é teórico...
Como percebe isso?
Quando eu nasci, 85% da Terra era virgem. Hoje, são apenas 25% e não chegará nem a 1%, em 2050. Por isso, os animais portadores de vírus que não tinham contato conosco, hoje, são nossos vizinhos...
Simpáticos javalis, aqui, em Barcelona.
...Alimentados por fenômenos climáticos inusitados, como a tremenda seca sofrida pela Catalunha e a neve na quente Califórnia, e no Mediterrâneo é pior...
Não me assuste.
Eu te assusto porque vocês são 22 estados mediterrâneos em perigo, mas não agem.
Talvez seja necessário mais poder supraestatal para conter a ameaça climática?
Para além do que já existe: na ONU, OCDE e Banco Central Europeu estão seguindo estratégias mais típicas do velho desenvolvimentismo do que para prevenir a sexta extinção, a dos humanos...
Por que nos colocamos em perigo?
Pela soberba de todos e a ganância de alguns. O desenvolvimentismo capitalista se baseia na centralização, na verticalidade e no princípio da eficiência: máxima produtividade com o mínimo esforço.
Isso se chama crescimento econômico.
Mas não é natural! A natureza, ao contrário, são ciclos, e nós também porque fazemos parte dela. Crescer sem limites não é natural, mas um desvio da ganância.
Existem recursos para as necessidades de todos, mas não para a ganância de alguns.
Todos os seres vivos são regidos por ritmos circadianos – em sincronia com a rotação e a translação da Terra –, que são os ciclos do dia, da noite e das estações. Negá-los por ganância é suicídio.
O que fazer?
Agir. Propus um plano de 17 trilhões de dólares ao líder democrata no Senado, Charles Schumer, para impedir nossa extinção...
E o presidente Biden o aprovou.
E uso minha experiência e influência na União Europeia para que invista em nos salvar, ou seja, na transição para o desenvolvimento sustentável.
Estamos a tempo?
Se não fizermos nada, as projeções mais otimistas situam a extinção ao final da vida das crianças que nascem hoje. Por que você acredita que os adolescentes protestam quando percebem essa ameaça?
Por que que não os ouvimos?
Por egoísmo. Nós os ignoramos e têm razão.
Para evitar a extinção, é preciso parar de crescer economicamente e decrescer?
Para nos salvar da extinção, é preciso crescer mais e melhor, não menos. É preciso pensar, investir, agir, progredir, coordenar e tomar iniciativas eficientes.
Por exemplo.
Para começar, pensar: o primeiro-ministro Prodi e eu pensamos, em 2000, como deveria ser a mudança de paradigma que permitiria deter a extinção e analisamos oito revoluções tecnológicas para antecipá-la.
Quais são?
São revoluções das comunicações, da energia, da mobilidade, da logística, da água e do modo como nos organizamos para sobreviver. E agora é preciso repensá-las.
O que deveríamos repensar?
Esse progresso nem sempre é programável, mas, muitas vezes, é casual: você o encontra por acaso, enquanto procura outra coisa. Contudo, é preciso testar, ir buscando pontos sem cessar para um dia uni-los, talvez por acaso, em um sentido ou outro.
O que faz você se sentir otimista?
Que estejamos reagindo. A essência do capitalismo é privatizar os lucros para poucos e terceirizar os resíduos para todos – poluição, desmatamento –, após extrair sua produtividade...
Isso não é uma definição ultraliberal...
Ao contrário, a tecnologia que foi colocada a serviço dessa dinâmica, hoje, começa a ser aplicada para detê-la, revertê-la e torná-la sustentável, e nossa espécie ser resiliente.
Onde vê reações saudáveis?
Na internet da energia, por exemplo, que privatiza a produção com milhões de geradores em casas e retorna o excedente à rede. Um terço dos carros do planeta serão elétricos até 2030 e estarão conectados à rede: retornarão energia.
Não faz muito tempo que explicamos isso, aqui.
O mesmo acontecerá com os dados e o desafio que vier também com a tomada de decisões que, assim, evitaria a privatização da natureza que sofremos até hoje.
Não enxerga tudo muito fácil?
Penso que a tecnologia pode nos ajudar a sair dos problemas causados pelo seu mau uso. E penso também que poderemos fazer uma correção se trabalharmos, investirmos, coordenarmos. Energia, dados, água... Democracia em rede. Redes para todos.
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“Crescer sem limites não é natural, mas um desvio da ganância”. Entrevista com Jeremy Rifkin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU