17 Outubro 2022
O Secretariado de Atividades Ecumênicas organizou em 29 de setembro último um webinar dedicado à Assembleia do Conselho Ecumênico de Igrejas - CEI - realizado em Karlsruhe, Alemanha, de 31 de agosto a 8 de setembro passado. Mediado pelo teólogo Simone Morandini, contou com as intervenções do pastor valdense Michel Charbonnier e do monge da Comunidade Ecumênica de Bose Guido Dotti, estes últimos participantes diretos da assembleia.
A reportagem é de Andrea Cappelletti, publicada por Settimana News, 16-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Simone Morandini destacou o caráter particular da Assembleia Ecumênica de Karlsruhe, considerando o momento dramático em que se realizou, precisamente no continente europeu. De fato, nos confrontamos com os desafios da guerra, das mudanças climáticas e das tensões nas relações entre as confissões cristãs.
Karlsruhe foi um momento significativo para compreender em que direção caminha o ecumenismo e o diálogo na comunhão eclesial.
A seguir reproduzimos alguns trechos das intervenções de Michel Charbonnier - reeleito membro do Comitê Central do CEI - e de Guido Dotti, colaborador do CEI.
Michel Charbonnier relatou em primeiro lugar as sensações produzidas pela beleza das celebrações litúrgicas, em particular pelos cantos que remetem imediatamente à polifonia do encontro entre diferentes Igrejas.
Um aspecto que sempre impressiona, participando da Assembleia, é uma sensação de inesperada proximidade e benevolência entre todos os participantes e as participantes.
Claro que existem diferenças: culturais, éticas e teológicas, muitas vezes difíceis de entender e aceitar. Mas as crises mundiais mais prementes - especialmente a climática - contribuíram para "suavizar as arestas" para chegar às convergências da Assembleia.
Em Karlsruhe assistimos a um mundo que tenta conversar consigo mesmo e que tenta fazê-lo - mesmo que nem sempre consiga - de forma inclusiva. Além disso, conversar entre quatro mil pessoas não foi fácil.
Como delegado, Charbonnier viu todas as limitações organizacionais do evento.
As manhãs eram dedicadas a sessões plenárias temáticas, muitas vezes com sessões bastante "espetaculares", em que foram acolhidas as figuras ecumênicas de prestígio, ou entoados cantos, exibidos vídeos, etc.: todas atividades boas, que, no entanto, tiraram tempo à discussão dos documentos e ao exercício das decisões.
Os delegados receberam pouco menos de três horas por dia para realizar uma tarefa tão exigente. Essa é uma das razões - não secundária - por que saímos da Assembleia com grande cautela - talvez demasiada – nos temas mais importantes, especialmente aquele da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, ou o eterno conflito palestino-israelense.
O texto sobre a Ucrânia seguiu basicamente a linha do Comitê Central do CEI anteriormente realizado em Assis. Não há dúvida de que isso levou a um "fogo cruzado" entre os membros ucranianos e os membros russos da Assembleia, com estes últimos criticando duramente tal documento porque, em sua opinião, é o resultado da desinformação ucraniana.
Sobre o Oriente Médio, o debate se cristalizou sobre o uso do termo apartheid, em relação à política israelense para com os palestinos: em essência, o texto simplesmente propôs ao comitê central que estudasse com a Anistia Internacional e outras associações a legitimidade do uso da expressão.
A Declaração sobre Justiça Climática é um forte lembrete do desastre ecológico em curso e conclama as Igrejas a tomarem medidas urgentes com seus respectivos governos, propondo, por exemplo, importantes tributações sobre os grandes patrimônios. O documento alerta para o risco de que a transição ecológica - tão anunciada - resulte em mais uma exploração do chamado Terceiro ou Quarto Mundo, onde se encontram os maiores recursos necessários para a chamada economia verde.
O documento sobre a paz é, segundo Chabonnier, o mais detalhado, pois vem denunciar a responsabilidade da indústria armamentista que continua a alimentar os conflitos no mundo, denunciando, em termos inequívocos, o risco nuclear: algo que não acontecia há tempo!
Charbonnier, não esconde a fragilidade atual do CEI e uma certa "incoerência sistêmica" infelizmente atribuível à influência de elementos externos, políticos: emblemática, nesse sentido, a intervenção do representante das Religiões pela paz que convidou a Assembleia a retornar ser uma consciência crítica e profética do nosso mundo, em vez de "ser ditada pela agenda” dos governos.
Apesar das fragilidades, dos esforços e, justamente, das inconsistências, o CEI continua sendo um instrumento precioso da relação entre as Igrejas cristãs e do diálogo entre estas e as outras religiões.
Conforme previsto por Simone Morandini, o webinar deu atenção especial ao que na Assembleia do CEI de Karlsruhe, foi gasto sobre a guerra na Ucrânia. Charbonnier, como membro do comitê central, falou da hipótese- efetivamente circulada - da expulsão da Igreja Ortodoxa Russa.
A posição que se afirmou no confronto, no entanto, reitera que a tarefa do Conselho Ecumênico não é remover os problemas com as exclusões, mas sim assumir a responsabilidade por eles, criando um espaço de diálogo persistente e sem julgamentos.
Nessa circunstância, porém, o Conselho não demonstrou ser capaz de suportar adequadamente a tensão entre os dois polos - russo e ucraniano - ou seja, ser um lugar de diálogo efetivo e de parrésìa. Representantes da Igreja Ortodoxa Russa, em junho, haviam reclamado que o conselho ecumênico estivesse à mercê da propaganda pró-ucraniana.
Em Karlsruhe reclamaram da mesma coisa. Mas, entretanto, não fizeram nada para trazer à discussão as questões centrais do CEI. Essa parte faltou totalmente. Permanece a confiança de que o que faltou possa ser recuperado durante o próximo mandato.
Guido Dotti confirmou as atitudes particularmente fechadas e defensivas do Patriarcado de Moscou. Mas salientou que não se deve subestimar que as "novas" Igrejas Ortodoxas na Ucrânia - a que ainda está em comunhão com o Patriarca de Moscou e a autocéfala chefiada por Constantinopla - pediram para aderir ao CEI. Isso criará para elas inevitavelmente, problemas com o Patriarcado de Moscou.
A primeira já era, de fato, membro do Conselho, mesmo que nunca tenha participados dos encontros; enquanto, para a segunda, a aceitação pelo Conselho significará o pleno reconhecimento da autocefalia.
Os representantes das duas Igrejas ucranianas, portanto, em vez de se culparem mutuamente pelo que não funcionou entre elas, preferiram colocar o interesse humanitário comum na frente da tragédia da guerra.
Os episódios de abusos mútuos são bem conhecidos - de antes e independentemente da guerra: agora destacam o desejo de cuidar, juntos, dos fiéis ucranianos, em vez de buscar culpas e responsabilidades.
Pode ser, sem dúvida, uma posição um pouco mais do que diplomática, mas o fato de se manifestar diante de todas as Igrejas – e que, portanto, estejam se expondo em uma modalidade “não beligerante” – é extremamente positivo.
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Ecumenismo após Karlsruhe - Instituto Humanitas Unisinos - IHU