02 Junho 2022
Entre os 21 clérigos nomeados pelo Papa Francisco em 30 maio para serem elevados ao Colégio de Cardeais, um era estadunidense, Robert McElroy, bispo da Diocese de San Diego.
Certamente isso causaria uma celebração universal na terra natal de dom McElroy, não? Não. Em vez de orgulho e esperança entre os católicos estadunidenses, o anúncio da designação de McElroy ao cardinalato se tornou apenas outra oportunidade para os católicos tuiteiros o perseguirem, procurando notícias como exemplo do seu desacordo e desunião com a Igreja – mesmo que a reação deles estivesse gerando o mesmo.
O comentário é de Kevin Clarke, publicado por America, 01-06-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
É claro, melhor manter em mente que o que ocorre no “twitter católico” frequentemente permanece no “twitter católico”. As pessoas de bem da sua paróquia ficariam espantadas ao saberem da calamidade católica do ódio cotidiano nas redes sociais.
Mas mesmo assim foi um pouco deprimente ver as muitas denúncias sarcásticas que se seguiram ao anúncio de McElroy. É justo reconhecer aqui que entre aqueles que aprovaram a decisão estavam alguns que a viram como um vigoroso repúdio eclesial aos bispos dos EUA que não abraçaram exatamente o estilo pastoralista do Papa Francisco. Alguns perceberam uma repreensão direta a dom Salvatore Cordileone, arcebispo de San Francisco, devido a sua recente decisão de impedir a presidente da Câmara Nancy Pelosi de comungar.
Mas o Vaticano simplesmente não se move tão rapidamente. A lista de cardeais designados para o próximo consistório certamente foi finalizada semanas, até meses atrás.
Outros críticos acusaram que a elevação de dom McElroy é um sinal de energia vacilante na responsabilidade e transparência ao lidar com a crise de abuso clerical. Eles argumentaram que o bispo de San Diego tinha responsabilidade especial pelo desastre McCarrick por causa de informações compartilhadas com ele em uma carta de 2016 do falecido Richard Sipe, um conhecido especialista na crise e residente da diocese.
Mas a ascensão de McCarrick dentro da Igreja, é claro, foi posta em movimento sob os papas João Paulo II e Bento XVI, anos antes que o cardeal designado McElroy tivesse uma posição de autoridade na Igreja dos EUA. E uma vez que a maioria das informações e alegações incluídas na carta de Sipe foram publicadas online anos antes, por esse padrão, a “culpa” pelo escândalo McCarrick deve ser compartilhada com todos os líderes da Igreja contemporânea e a imprensa católica – provavelmente a avaliação mais justa.
O cardeal designado McElroy explicou em 2018 que transmitiu as informações compartilhadas com ele por Sipe às autoridades governamentais responsáveis em Roma. (Aguardamos ainda alguma evidência de progresso em qualquer processo que tenha sido iniciado.) Não está claro como um líder de uma diocese não diretamente ligada às partes em questão poderia ter procedido, algo que muitos dos detratores desta semana deveriam ou fazer conhecer. Em sua própria diocese, o cardeal designado McElroy assumiu um papel de liderança na abertura de arquivos diocesanos e no alcance de sobreviventes de abuso.
Finalmente, muitos críticos perseguiram o Papa Francisco diretamente com a bizarra acusação de que ele estava jogando com o sistema – “encher a corte” era uma expressão americana frequentemente usada – ao elevar alguém como McElroy ao Colégio dos Cardeais. Mas não deve surpreender que o Papa Francisco selecione candidatos para o cardinalato que ele considera mais compatível com sua visão para a Igreja. O mesmo não pode ser dito de todos os papas?
O cardeal designado McElroy frequentemente expressou reservas sobre “belicizar a Eucaristia” como parte de uma guerra cultural dos EUA. O Papa Francisco e a Santa Sé também desencorajaram a prática, o próprio papa observando que nunca negou a Sagrada Comunhão a ninguém. O bispo de San Diego pediu o acolhimento dos católicos LGBTQIA+, assim como o Papa Francisco. A Diocese de San Diego sediou seu próprio sínodo em 2016, anos antes de Roma anunciar seu próprio “sínodo sobre sinodalidade” global.
O cardeal designado McElroy mostrou uma opção preferencial por abordagens pastorais para questões discordantes e enfatizou que, embora a Igreja continue seu testemunho sobre o aborto e outras questões da vida, ela deve permanecer na vanguarda em outras questões críticas de nossos tempos, incluindo as mudanças climáticas, imigração, justiça econômica e ecológica e combate ao racismo. Esta é precisamente a postura episcopal há muito endossada pelo Papa Francisco.
É claro que o principal erro cometido pelos críticos demasiado ansiosos da elevação do bispo continua a ser a insistência em perceber tais momentos eclesiais através de um filtro exclusivamente americano. O cardeal designado McElroy é o único candidato dos Estados Unidos entre quase duas dúzias de outras elevações ao Colégio dos Cardeais.
Entre eles está o cardeal designado da Arquidiocese de Hyderabad, na Índia, dom Anthony Poola. “Sou um dalit”, disse o arcebispo Poola depois de saber de sua elevação, ou membro de uma casta muito discriminada na Índia. “Esta é uma boa notícia para os católicos dalit e para toda a Igreja na Índia”, disse ele. “Acredito que trará o encorajamento do Papa Francisco para muitos”.
Dom Leonardo Ulrich Steiner, OFM, de Manaus, também está entre os indicados. Sua comunidade está no foco geopolítico das questões convergentes da migração humana e do cuidado com a criação.
Outros cardeais designados vêm do Timor Leste, Mongólia, Nigéria e outros locais da Igreja em suas chamadas periferias, continuando um esforço do Papa Francisco para criar um colégio que não apenas represente plenamente a Igreja, mas que se beneficie da diversidade de perspectiva que tais compromissos oferecem.
Discernir os dons que os cardeais designados trazem para a Igreja certamente é um exercício mais salutar do que brigar sobre deficiências imaginadas. O Papa Francisco acredita que é nas periferias onde se desenrolam os grandes desafios humanitários, ecológicos e econômicos do nosso tempo que se pode encontrar a maior sabedoria. Talvez essa sabedoria seja mais fácil de discernir quando nos afastarmos do teclado, respirarmos e ouvirmos.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
EUA. Papa Francisco está fazendo dom Robert McElroy um cardeal – e a repercussão no twitter é depressiva - Instituto Humanitas Unisinos - IHU