16 Mai 2022
"Adaptar essa história à guerra em curso tem duas implicações: a primeira é que a parte de Deus, que faz Davi triunfar contra toda esperança em Golias, pertence aos EUA. A segunda é que Golias seja morto e depois decapitado: isto é, que a Rússia seja derrotada em campo e depois privada da cabeça (através da eliminação de Putin). Isso é exatamente o que pretendem os falcões da OTAN (britânicos e poloneses) e pelo menos parte do governo Biden", escreve o historiador da arte italiano Tomaso Montanari, professor da Universidade Federico II de Nápoles, em artigo publicado por Il Fatto Quotidiano, 14-05-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Ontem Marco Travaglio explicou por que Mario Draghi citou de forma equivocada o famoso episódio bíblico de Davi e Golias: o primeiro-ministro disse que a Rússia revelou-se "não um sujeito invencível" e, portanto, "não é mais Golias".
Mas na Bíblia o gigante guerreiro Golias é clamorosamente derrotado, e é derrotado pelo pequeno Davi, aparentemente indefeso, mas auxiliado pelo Deus Todo-Poderoso: e, portanto, Draghi deveria ter dito, no máximo, que "a Rússia se revelou exatamente como Golias, grande, mas vencível". Um deslize interessante, o de Draghi, aluno dos jesuítas, mas aparentemente esquecido de fatos fundamentais. E se não fosse um problema de cultura, mas de inconsciente?
A história de Davi e Golias é talvez a mais central em toda a retórica renascentista sobre a liberdade e a independência das muitas pequenas pátrias italianas. Basta pensar em Florença, que sempre se identificou com o pequeno pastor de Israel, vitoriosa sobre Golias muito maiores que ameaçavam a Florentina libertas: o Davi de Donatello, Verrocchio e Michelangelo são os frutos mais sublimes daquela habilidosa propaganda.
Os cantores do Ocidente encontrarão ricas analogias. Mas adaptar essa história à guerra em curso tem duas implicações: a primeira é que a parte de Deus, que faz Davi triunfar contra toda esperança em Golias, pertence aos EUA. A segunda é que Golias seja morto e depois decapitado: isto é, que a Rússia seja derrotada em campo e depois privada da cabeça (através da eliminação de Putin). Isso é exatamente o que pretendem os falcões da OTAN (britânicos e poloneses) e pelo menos parte do governo Biden: mas é um salto no abismo nuclear, e é exatamente o oposto da paz que Draghi finalmente diz que quer contribuir a construir. Removida uma enorme contradição, uma repressão que volta no deslize: "A Rússia não é Golias". Ainda bem.
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Bíblia mariana: se Moscou é Golias, os EUA são Deus. Artigo de Tomaso Montanari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU