15 Fevereiro 2021
Diante das crises ecológicas, Isabelle Autissier, presidente de honra do WWF, ainda acredita em um despertar das consciências, tanto individual quanto coletivo. Mesmo que se trate de uma “corrida de velocidade” contra a degradação do meio ambiente.
A entrevista é de Olivier Nouaillas, publicada por La Vie, 09-02-2021. A tradução é de André Langer.
Após dez anos de bons e leais serviços, a velejadora Isabelle Autissier, 64 anos, acaba de deixar a presidência do WWF França (Fundo Mundial para a Natureza). Substituída por Monique Barbut, ex-secretária executiva da Convenção de Combate à Desertificação da ONU, Isabelle Autissier permanecerá, no entanto, como presidente de honra do WWF.
Esta é a oportunidade de fazer uma retrospectiva dos seus dez anos de compromissos ecológicos e de fazê-la comentar a publicação do L'Atlas de la Terre, publicado por La Vie e Le Monde. A entrevista é realizada pelo Skype, devido à pandemia, enquanto ela se encontrava em sua casa em La Rochelle. Com, ao fundo, o quadro de um amigo pintor representando um gato preto num veleiro, no meio das ondas, com a seguinte máxima de Rudyard Kipling: “Eu sou o gato que anda sozinho e para quem todos os lugares são iguais”.
Nós publicamos um Atlas da Terra que tem como subtítulo “Como o homem dominou a natureza”. Você acredita que hoje, diante da urgência de várias crises (ecológica, climática, sanitária...), ainda é possível reconciliar-se com a natureza?
Espero que sim, do contrário seremos todos perdedores. É preciso entender que nós somos a natureza. O Homo sapiens é uma espécie da natureza. O homem pensava em dominar a natureza, mas na realidade ele simplesmente a modificou e, infelizmente, a danificou. Eu, que sou navegadora, posso dizer-lhe que ele não dominou os ventos, a altura das ondas, o frio... Não dominamos os fundamentos da física, da química ou da biologia. Quer queiramos ou não, a água continuará a congelar a 0 °C...
Essa ideia de dominação, que foi propagada pela civilização ocidental e por todas as grandes religiões, toda essa visão egocêntrica atingiu seus limites. Simplesmente porque cruzar esses limites está se voltando contra nós e está começando a nos prejudicar. Vemos isso com a erosão da biodiversidade e a acentuação das mudanças climáticas. Daí esta nova ideia de nos reconciliarmos com a natureza.
É, aliás, o subtítulo da ação global do WWF há anos. É uma forma de reconciliação mais moral, mais espiritual e mais intelectual que nos leva a sair dessa injunção da dominação.
O ano de 2021 tem três grandes eventos em seu calendário: na primavera (17 a 30 de maio), a COP 15 sobre a biodiversidade na China; em setembro, o Congresso Mundial da Natureza em Marselha e, no final de dezembro, em Glasgow, a COP 26 sobre as mudanças climáticas. São, de certa forma, os nossos encontros da última chance?
Não devemos abusar muito dessa expressão. Já que estamos lidando com fenômenos planetários, precisamos da ação conjunta dos 196 países. Essas grandes reuniões globais ainda são úteis, mas não devemos esperar tudo delas. O que a história nos ensinou é que elas não podem ser os únicos agentes de mudança. Por exemplo, quando saímos da grande Cúpula da Terra no Rio em 1992, todos disseram para si mesmos: “É isso: tomamos consciência do que precisamos fazer!”.
Claro, é mais complicado do que isso, principalmente se olharmos em detalhes a aplicação das 2.500 medidas adotadas no Rio. Os compromissos dos Estados não são suficientes e os cidadãos devem necessariamente se envolver. Como na França, com a petição, depois a denúncia do “Caso do Século”, que acusa especificamente o nosso país de ter assumido compromissos em 2015, durante a assinatura do Acordo de Paris, e de não respeitá-los.
Precisamente, o que deve ser privilegiado para haver uma mudança das coisas: a ação individual (os famosos pequenos gestos), a ação das cidades, das empresas, dos Estados?
Nós somos tudo ao mesmo tempo. Somos ao mesmo tempo cidadãos por nosso voto, consumidores por nossas compras, atores em uma empresa por nosso trabalho... Não sejamos esquizofrênicos, culpando parte da população. O que causou danos ao meio ambiente são todas as atividades humanas, é o fato de que cidadãos, empresas, comunidades locais e Estados se chocaram contra a parede.
A grande questão, na minha opinião, é a seguinte: o que norteará nossas decisões amanhã? E enquanto for, do lado coletivo, o lucro imediato, ou seja, o produto interno bruto (PIB), o fluxo de caixa, e do outro, do lado individual, o “tudo, tudo imediatamente”, não poderá ficar melhor. Precisamos de um movimento conjunto: uma mudança política, das mentalidades, de uma narrativa coletiva...
O que leva consigo destes dez anos de presidência do WWF: progressos ou decepções?
Há dez anos, eu ainda era vista como “verde”, termo que nem sempre era muito simpático na boca de algumas pessoas. Eu ouvi dois Presidentes da República falarem, um “de volta para a vela” e o outro “de amish”. Felizmente, a consciência coletiva da sociedade evoluiu muito.
Vemos essa evolução na nossa relação com os animais, na transformação da agricultura com o grande avanço da agricultura orgânica e na proibição dos pesticidas, no desenvolvimento das energias renováveis, na atenção dada ao ambiente a nível operacional pelas empresas ou ainda no “esverdeamento” dos programas de todos os partidos nas últimas eleições municipais.
E, no entanto, um vocabulário pessimista invadiu o pensamento ecológico: colapsologia, colapso, fim do mundo, sexta extinção. Você sempre se apegou a um dos seus lemas favoritos: “o pior nunca é certo?” Por quê?
Era um lema de família! Aprendi na minha educação e na minha vida que o futuro nunca é todo branco ou todo preto, é em tons de cinza. Claro, eu entendo intelectualmente a colapsologia, essa ideia de pontos de ruptura. A consciência do possível colapso das nossas civilizações é de fato uma ideia que permeia as pessoas. E mesmo que eu não acredite nisso, é o outro lado do mesmo problema.
Porque, em dez anos, também vi a diminuição da população de vertebrados (peixes, aves, mamíferos, anfíbios, répteis...) passar de -50% para -60% e a poluição do plástico tornar-se exponencial nos oceanos. Acima de tudo, começamos a tocar com o dedo a realidade dos desastres causados pela mudança climática para a espécie humana: megaincêndios, tufões, aumento do nível das águas, terras áridas, refugiados ambientais...
Mesmo assim, continuo a dizer que vale a pena lutar. Primeiro, porque aumenta o moral. E depois, mais fundamentalmente, porque o décimo de grau que não vai aumentar, talvez seja o que vai contar, que vai nos dar um pouco de descanso, um pouco de tempo para nos organizarmos, que nos permitirá limitar as perdas. E o mesmo vale para os vivos. No momento é uma corrida entre o “pequeno” e o “grande” dano e, dependendo do resultado, isso não terá as mesmas consequências para nós.
Você experimentou todas as formas de engajamento: do ativismo de extrema esquerda em seus anos de liceu ao ativismo mais pragmático do WWF. O que está fazendo as coisas avançarem: o radicalismo ou o reformismo?
Mesmo que o pensamento radical tenha o mérito de sacudir a sociedade, o radicalismo falhou em termos políticos. O reformismo é, sem dúvida, mais eficaz, porque parte da realidade. Quer gostemos ou não, existe a vida econômica, as empresas, a organização social, os Estados, e é por aí que se começa. O objetivo é fazer com que as coisas mudem o mais rápido possível, fazendo avançar as questões ambientais e sociais no mesmo ritmo. O fim do mês e o fim do mundo estão intimamente ligados.
Como você viu o surgimento de Greta Thunberg no cenário ecológico, que hoje está com apenas 18 anos, que é vista por uns como um ícone e por outros como uma perigosa “pasionaria”?
Eu entendo a profunda angústia dos jovens diante do estado do mundo em que os estamos deixando. Greta Thunberg e os jovens que a seguem, e isso não é um modismo. Seu compromisso deve ser levado muito a sério. E fiquei extremamente chocada com a violência dos ataques a esta jovem.
O cacique Raoni, de 90 anos, acaba de entrar com uma ação de “crime contra a humanidade” contra Jair Bolsonaro por sua política de desmatamento na Amazônia. Aprova essa iniciativa, que vai no sentido da definição de um novo crime, o crime de ecocídio?
O ecocídio deve ser um crime reconhecido, porque ele nega a tudo o que vive ao nosso redor a qualidade de vida e, portanto, o direito de viver como o nosso. Também é uma ameaça para nós mesmos. Para o WWF, a situação das florestas é absolutamente dramática, seja na França, na Europa ou no mundo, em particular na Amazônia. Seja pelo fogo ou pelo ferro, estamos destruindo muitas florestas. E não me faça acreditar que quando você faz um reflorestamento, isso substitui a riqueza das florestas primárias por toda a biodiversidade que vem com elas.
No início do primeiro confinamento, você confidenciou ao jornal La Croix sua esperança nos seguintes termos: “Esta estranha paralisação é também uma grande oportunidade para nos questionarmos sobre o significado do que nos trouxe até aqui e as razões subjacentes a esta crise”. Você mantém essa esperança de um mundo pós-pandemia mais sábio? Ou, pelo contrário, vamos colocar o pé no acelerador?
Essa pandemia marca, creio eu, o início da nossa entrada na era das crises. E agora temos que temer que estejamos caminhando, em um ritmo mais ou menos sustentado, de crise em crise. Seja no clima, no abastecimento alimentar mundial ou no recurso hídrico: estamos à beira da ruptura. E é infelizmente através dessas tragédias que corremos o risco de evoluir. Mas ainda temos a opção de amortizar tudo isso.
Como indivíduo, você pode ser um desperdiçador-consumidor ou, pelo contrário, ser um ambientalista consciente em sua vida cotidiana. E se milhões de pessoas fizerem isso ao mesmo tempo, isso pode mudar a sociedade. E se também os Estados, incluindo a França, estiverem finalmente mais ousados em sua escolha de uma retomada mais ecológica, então muitas coisas ainda são possíveis.
Com seu barco, o Ada 2, você esteve em lugares tão magníficos quanto frágeis: Spitsbergen, Groenlândia, Geórgia do Sul, os fiordes da Terra do Fogo. Ainda há lugar para se maravilhar com os perigos crescentes?
Maravilhar-se com a natureza é, certamente, uma das primeiras coisas a experimentar por querer defendê-la e protegê-la. Para ficar maravilhado, você não precisa necessariamente ir a Spitsbergen ou à Geórgia do Sul, pode ser em lugares muito próximos. Eu, em La Rochelle, quando vou passear no meu jardinzinho com o café debaixo do braço, vejo coisas magníficas. O céu, por exemplo, mesmo em dias de tempestade...
Agora que você é presidente de honra do WWF França, o que vai fazer do seu tempo livre? Navegar? Escrever? Militar de outras formas?
Um pouco de tudo isso, passando mais tempo em La Rochelle. Vou ser mais “local” e, especialmente, devagar. Toda a minha vida vivi a cem mil milhas por hora. Não me arrependo, mas quero fazer as coisas com mais calma. É por isso que não estou no Twitter e nas redes sociais, esse tipo de ruído de fundo que sempre temos diante dos olhos ou dos ouvidos e que nos impede de nos concentrar e, portanto, de agir.
Da dominação à reconciliação?
Dominar a natureza... Esta é a injunção que os humanos emitiram desde que vieram à Terra. Povoamento do mundo, domesticação das plantas e dos animais, exploração dos recursos, transformação das paisagens, industrialização... Este Atlas desvela a fascinante história do progresso e dos seus danos que estão na origem da consciência ecológica e da atual crise climática. Uma abordagem original, em mapas e infográficos, onde os melhores especialistas nos convidam a repensar o lugar do homem em um mundo hoje entendido como um ecossistema único e precioso.
L’Atlas de la Terre, editado por La Vie e Le Monde, 188 páginas, 14 euros.
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“Vale a pena lutar pela natureza”. Entrevista com Isabelle Autissier - Instituto Humanitas Unisinos - IHU