27 Abril 2020
Um insólito 25 de abril (Festa da libertação da Itália), o deste ano. Sem marchas, sem bandas marciais, sem discursos comemorativos. O coronavírus nos prende todos em casa. Entretanto, nesse meio tempo, retorna em muitas conversas a retórica bélica e entre os políticos, na Itália e em todo o mundo, que não hesitam em voltar a utilizar essa linguagem.
A entrevista com Giannino Piana é editada por Vincenzo Amato, publicada por La Stampa (Novara e VCO), 25-04-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Giannino Piana, você que é teólogo e professor de ética cristã, não lhe parece estranho? O que pensa?
Não acho essa retórica apenas estranha, mas ambígua e absolutamente inaceitável. A afirmação "estamos em guerra" ressoa insistentemente na mídia e, com ela retorna a parafernália conceitual de guerra: o vírus é o "inimigo" a ser derrotado, os hospitais são "trincheiras", os médicos mortos são os "caídos". Tudo isso para falar de um fenômeno, a pandemia em curso, que nada tem a ver com a guerra, mas que é uma emergência de saúde, um problema de saúde pública.
Na sua opinião, quais são as razões para o recurso a essa metáfora? E que implicações isso pode ter na vida civil?
Como acredito na importância das palavras, receio que, por trás dessa linguagem, se esconda a vontade, consciente ou inconsciente, de cobrir outros problemas e de introduzir outros elementos que nada têm a ver com a emergência atual. Enquanto isso, parece-me evidente a dissonância com o que recordamos nestes dias: não é apenas nesse caso inconveniente usar a metáfora de guerra para o coronavírus, mas é completamente enganosa e alarmante.
Você mencionou problemas a serem cobertos e elementos não relacionados à pandemia? Como assim?
O meu medo - digo isso francamente - é que o apelo à guerra possa servir para motivar a suspensão das liberdades civis e, de um modo mais geral, possa constituir um perigo para a vida democrática. A natureza excepcional da situação nos fez aceitar, neste período, grandes limitações: o sacrifício quase total da socialidade, a renúncia aos procedimentos tradicionais, a redução das funções do Parlamento e, por último, mas não menos importante em ordem de importância, a possibilidade ventilada de usar o rastreamento de contatos, já adotado em outros lugares para obter informações úteis para enfrentar com mais eficácia a pandemia, com um grande risco, no entanto, para a privacidade. O apelo à responsabilidade para fazer aceitar tais medidas em uma situação tão grave tem sua justificativa. Mas esse estado de coisas não pode continuar por muito tempo, muito menos se tornar uma condição permanente.
Você está, portanto, temeroso com o futuro; teme que possa acontecer uma virada antidemocrática. É isso?
Claro. E o temor decorre do que já aconteceu em outros lugares em circunstâncias semelhantes. Penso antes de tudo nos Estados Unidos após a queda das Torres Gêmeas. Sob o pretexto de segurança, foram tomadas medidas naquele caso, que de fato instituíram, graças à tecnologia disponível, uma forma de controle policialesca permanente sobre a vida das pessoas. Mas não é apenas isso. O perigo também é que estejamos caminhando para formas de desmoronamento estrutural, com a possibilidade, já existente em alguns países, inclusive europeus, de permitir o avanço de sistemas autoritários, que põem em discussão os princípios fundamentais da ordem liberal e constituem um atentado aos direitos e às liberdades fundamentais dos cidadãos e uma verdadeira deterioração da democracia.
Portanto, não há apenas uma emergência econômica a enfrentar. Mas também uma emergência civil e política.
Isso mesmo. E estou pessoalmente preocupado que isso não seja discutido, que tudo esteja concentrado na questão econômica, por mais importante que seja. O 25 de abril nos lembra como valores civis essenciais e liberdades democráticas podem se tornar uma oportunidade de tomar consciência da necessidade de discutir também essa emergência.
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“Cuidado com a redução da liberdade, corremos o risco de perdê-la” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU