08 Abril 2020
"Talvez justamente por causa da crescente exclusão das mulheres das funções de liderança, muitas mulheres encontram acolhimento naquelas comunidades que entenderam a importância da figura de Madalena como destinatária da revelação de Cristo ressuscitado. De fato, em um contexto de experiências divergentes, altamente variadas e complexas, a partir do século II, difunde-se o movimento gnóstico ao qual muitos grupos cristãos se vinculam, desejosos por percorrer os caminhos do conhecimento (gnose) e da sabedoria (sophia) e as mulheres são os protagonistas indiscutíveis dessas comunidades que conservaram uma memória de Maria Madalena", escreve Fernanda Di Monte, em artigo publicado por Avvenire, 31-03-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
"Apóstola dos Apóstolos" é o título significativo que os Padres da Igreja deram a Maria Madalena, a mulher que primeiro viu o Jesus ressuscitado e a quem ele chama pelo nome, dando-lhe uma vocação particular. Muitas reflexões e publicações foram feitas sobre essa mulher identificada erroneamente com a prostituta mencionada por Lucas em seu evangelho no capítulo 7 e com Maria de Betânia, irmã de Lázaro e Marta, mencionada no evangelho de João no capítulo 12. Agora Adriana Valerio trata do tema em Maria Maddalena. Equivoci, storie, rappresentazioni (Maria Madalena. Mal-entendidos, histórias, representações, em trad. livre, Il Mulino, p. 127, Euro 12).
Valerio, ex-professora de História do Cristianismo e das Igrejas, na Universidade Federico II de Nápoles, teóloga e estudiosa da questão feminina, dirige a série internacional e interconfessional "La Bíbbia e de donne". Suas últimas publicações são Le ribelli di Dio (Feltrinelli, 2014), Donne e Chiesa (Carocci, 2016), Il potere delle donne nella Chiesa (Laterza, 2017) e para a Mulino, Maria di Nazaret (2017). Nesse livro, a teóloga analisa “o longo processo de alteração e redimensionamento sobre essa mulher, por muito tempo vítima de uma deturpação exegética que a identifica com a prostituta da história de Lucas e com a irmã de Lázaro.
O próprio cardeal Gianfranco Ravasi, em um artigo de alguns anos atrás, a definiu "uma santa caluniada e glorificada". De fato, o estereótipo de que essa mulher era a prostituta redimida por Cristo se cristalizou no pensamento comum. E, efetivamente, a sua é uma história de mal-entendidos, que aconteceram em diferentes níveis. “Como é vista hoje a discípula predileta, a mulher respeitada, a apóstola que acreditou e seguiu Jesus?”.
A partir dessa pergunta, a estudiosa Valerio nos leva com paixão e competência ao conhecimento e redescoberta da verdadeira Maria Madalena, que tanto a história quanto as artes contribuíram para confundir e para manipulação. "Maria Madalena - escreve Valerio na introdução - é certamente depois da mãe de Jesus, a personagem bíblica mais representada na literatura e na arte".
Maria Madalena é sem dúvida, junto com Nossa Senhora, a figura feminina mais conhecida dos Evangelhos, e, acima de tudo, a discípula mais importante, sempre mencionada primeiro na lista de outros nomes femininos presentes nas listas fornecidas pelos evangelistas que a indicam como aquela, junto com "algumas mulheres" que continuou na pregação itinerante. Como o evangelista Lucas nos lembra, "Maria, chamada a Madalena" foi "libertada de sete demônios", uma expressão que talvez indique uma cura, de um mal profundo ou de uma grave condição de sofrimento, que a levou a seguir Jesus através de novas modalidades relacionais que comportavam compartilhar e participar da vida do grupo dos discípulos. É ela, juntamente com outras mulheres que seguem o Mestre de Nazaré, a testemunhar a crucificação de Jesus, de seu sepultamento e, perto do túmulo vazio, a primeira destinatária e anunciadora da ressurreição.
Por isso, no Evangelho de João, Madalena representa o tipo ideal de discípulo que vê, reconhece, testemunha e anuncia. No encontro de fé com o Ressuscitado, ela se torna "apóstola de Cristo", porque por ele enviada a seus discípulos, incluindo Pedro, para anunciar o evento pascal do qual se torna testemunha e garante.
Nos encontramos na presença de um verdadeiro mandato apostólico que a faz ganhar o título de "apóstola dos apóstolos", entre os Padres da Igreja. Infelizmente, sua figura sofre um redimensionamento radical: Paulo não a menciona entre as testemunhas da ressurreição; nas comunidades que começam a se estruturar a função de apóstolo se torna uma prerrogativa masculina, o exercício com autoridade do compromisso missionário não é reconhecido nem às mulheres nem a Madalena, cuja identidade assumirá outras características mais adequadas aos modelos femininos de subordinação a serem propostos às crentes.
Talvez justamente por causa da crescente exclusão das mulheres das funções de liderança, muitas mulheres encontram acolhimento naquelas comunidades que entenderam a importância da figura de Madalena como destinatária da revelação de Cristo ressuscitado. De fato, em um contexto de experiências divergentes, altamente variadas e complexas, a partir do século II, difunde-se o movimento gnóstico ao qual muitos grupos cristãos se vinculam, desejosos por percorrer os caminhos do conhecimento (gnose) e da sabedoria (sophia) e as mulheres são os protagonistas indiscutíveis dessas comunidades que conservaram uma memória de Maria Madalena.
Sua figura presente nos escritos gnósticos - muitos dos quais reúnem tradições que remontam à época dos textos canônicos do Novo Testamento - emerge como um símbolo respeitado de conhecimento, na medida em que ela, "discípula" de Jesus, revela sua Sabedoria oculta. Ela é capaz de ver a Luz e acolhê-la, ao contrário dos homens que permanecem nas trevas, e é sua capacidade de escuta e de compreensão que a torna uma líder e autoridade espiritual. A leitura desse último trabalho da historiadora e teóloga Adriana Valerio leva a um conhecimento mais profundo e à superação de todo equívoco sobre Maria Madalena "a quem é preciso restituir rosto e voz", é a mulher a quem o Jesus ressuscitado se dirige com as palavras: "Vá a meus irmãos e diga-lhes ... "(João 20,17), é aquela que anuncia o Evangelho".
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A luz de Madalena sobre a Igreja nascente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU