10 Setembro 2019
As grandes companhias energéticas têm uma vintena de investimentos em curso que somam 45 bilhões de euros em macroprojetos espalhados pelo mundo. No entanto, a totalidade deles é incompatível com os objetivos fixados nos acordos de Paris que preveem limitar o aumento da temperatura global do planeta dentro dos 2 graus centígrados, ao longo deste século. Um problema geopolítico, para o meio ambiente, e também econômico, para seus acionistas. É o que emerge de um detalhado estudo elaborado pelo gabinete de análise Carbon Tracker, na semana passada.
A reportagem é de Piergiorgio M. Sandri, publicada por La Vanguardia, 09-09-2019. A tradução é do Cepat.
Com a carteira de investimentos prevista, a temperatura deverá subir até 2,7 graus, razão pela qual, segundo os analistas, estes projetos deveriam ser repensados para se centrar em outros menos custosos, para que a rentabilidade, no novo contexto climático, seja suficiente. Isso, sim, o tesourada na hora de investir deveria ser considerável, de acordo com os cálculos desta organização: 83% a menos. Quais são as companhias que deveriam repensar seus planos de expansão?
Há empresas como Shell e Exxon que estão envolvidas em projetos de exploração e extração de petróleo muito caros, como os do Ártico e os das areias betuminosas (essencialmente Canadá) e hidrocarbonetos mais pesados, como as águas profundas em Angola e Azerbaijão. São investimentos que exigem muito dinheiro e têm um elevado custo ambiental, porque para que saiam em conta as companhias precisam esperar um forte consumo, com preços elevados (um barril de 80 dólares, agora custa 60) e que se feche um olho em nível de regulamentação e sejam superados os limites do aquecimento do planeta.
Exxon é a companhia que menos leva em conta a emergência climática e a que mais tem a perder se a demanda de petróleo e gás cai em razão da política ou da tecnologia, já que mais de 90% de seu grande projeto de oleoduto até 2030 está fora dos objetivos de Paris. De fato, quatro em cada dez dólares desta empresa estão investidos em projetos que não estão em sintonia com os objetivos do clima e que não seriam sustentáveis no mundo pós-fósseis que se perfila no futuro.
Contudo, todas as empresas energéticas têm algum projeto incompatível com os acordos de Paris. Sendo assim, é certo que os Estados Unidos, o país que conta com as maiores petroleiras, se retiraram de tal acordo. Isto significa que, em seu território, as empresas não estão sujeitas a restrições ambientais na hora de investir em projetos. Por outro lado, estão quando decidem investir em outros países que, sim, se comprometeram a cumprir os requisitos. “Independentemente do que cada país decida, o risco para as companhias é que o mercado lhes puna e isto supõe um risco para seus acionistas”, comentam pelo Carbon Tracker.
De acordo com suas estimativas, as empresas correm o risco de desperdiçar 2 trilhões de euros na próxima década, caso os diferentes governos levem a sério e decidam colocar freio as emissões.
Por sua parte, as petroleiras recordam que devido ao auge da demanda de energia nos países emergentes, nos próximos anos, só com investimentos em energias renováveis não será possível satisfazer o consumo. A Agência Internacional da Energia (AIE) afirma que serão necessários 19 trilhões de euros, nos próximos 20 anos, em investimentos para abastecer o mercado.
Não obstante, diante do público, as companhias dizem outra coisa. A britânica BP e a norueguesa Equinor, neste mesmo ano, afirmaram que sua estratégia era “consistente com os objetivos de Paris” e que seu gasto de capital “se situaria em um cenário de um aumento inferior a 2 graus, respectivamente.
“Enquanto as empresas energéticas afirmam que apoiam o Acordo de Paris, digam o que digam, isto não se reflete em seu comportamento”, disse Andrew Grant, analista do Carbon Tracker. “Se não querem cumprir, isto depende delas. Mas, em última instância, esta postura pode lhes obrigar, ao final, se apoiar em outros investidores”, conclui. O mercado vigia: ser compatível com o aquecimento global é um valor econômico.
A emergência climática está causando pequenas mudanças na indústria, ainda que muitas delas tenham mais valor simbólico que real. A prestigiosa conferência Oil & Money Conference, um evento que conta com 40 anos de vida e que será realizado em outubro, em Londres, pela primeira vez em sua história, passará em 2020 a se chamar Energy Intelligence Forum. A palavra oil assim desaparece, por não ser tão popular na opinião pública como há quatro décadas. Por outro lado, o ato deste ano já nascia um pouco fragilizado.
O jornal The New York Times decidiu colocar fim a seu patrocínio. “O tema da conferência representa para nós um motivo de preocupação, porque há tempo investimos em cobrir o tema das consequências no meio ambiente. Por tudo isso, não queremos que se questione nossa independência ou que haja um conflito de interesse”, explicou o jornal em uma nota. Há tempo que as petroleiras procuram limpar sua imagem.
A última iniciativa é da Shell, a número dois em nível mundial. A companhia anunciou que em sua instalação de Houston, para os empregados que necessitarem viajar para outras cidades do Texas, disporão de um serviço de transporte com veículos elétricos da marca Tesla. A Shell foi a primeira empresa a alertar sobre o “pico da demanda” de petróleo, na metade da próxima década.
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Petroleiras somam 45 bilhões de euros em negócios incompatíveis com o clima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU