13 Junho 2019
A recente ameaça dos Estados Unidos de impor uma tributação de 5% (que pode crescer todo mês até chegar a 25%) às exportações mexicanas é só a ponta do iceberg da política exterior da administração Trump, que diferente da administração Obama (ou da que pudesse ter sido a de Hillary Clinton) não responde tanto aos interesses de Wall Street – só parcialmente aos do complexo industrial-militar –, como a diferentes interesses políticos e comerciais, que impulsionam guerras de nova geração.
O comentário é de Katu Arkonada, cientista político, publicado por Alai, 10-06-2019. A tradução é do Cepat.
Agora mesmo, o foco da política exterior estadunidense está posto na relação com a China e o affaire Huawei. O veto ao segundo maior fabricante mundial de telefonia móvel, sob a desculpa da “segurança nacional”, frente a uma suposta espionagem nunca comprovada, é similar aos decretos de Obama e Trump declarando a Venezuela perigo para a segurança nacional dos Estados Unidos.
O que se esconde por trás deste veto é, em primeiro lugar, a posição avançada da Huawei no desenvolvimento da tecnologia 5G, chave para a inteligência artificial e o processo de robotização da sociedade em um futuro próximo (multiplica por 50 o volume de dados transmitidos), e a determinação de que esta tecnologia não seja fornecida a diversos países europeus. E, em segundo lugar, uma tentativa de impedir a posição de vanguarda da China em relação aos Estados, não só em nível comercial, mas também no âmbito tecnológico, posição que pode ser aplicada em um futuro às ciberguerras.
Também não podemos esquecer que a China tem 55% das reservas mundiais de terras raras, fundamentais hoje em dia para produzir nossos celulares ou as baterias dos carros elétricos, elementos químicos que podem se tornar peças de xadrez na guerra tarifária que os Estados Unidos e China disputam.
O segundo foco de atenção geopolítica esta precisamente na Venezuela. Não é por acaso que no momento histórico (2013-2016) em que ocorreu uma distensão das relações com a revolução cubana, se declare a Venezuela perigo para a segurança nacional dos Estados Unidos. A teoria do inimigo externo implica em passar de Cuba a Venezuela para manter um inimigo neste hemisfério. Se, além disso, esse inimigo é o país com as maiores reservas de petróleo do mundo, já temos o joguete perfeito para entreter os falcões do Pentágono, experimentando operações de guerra híbrida.
O terceiro vórtice geopolítico na política exterior estadunidense encontramos no Irã, onde a designação, no último mês de abril, da Guarda Revolucionária Islâmica (CGRI) como “organização terrorista” é só a culminação da escalada de posições do Irã como principal inimigo externo no Oriente Médio, e uma desculpa para continuar aplicando sanções, ao não ser possível demonstrar que o Irã tenha violado o acordo nuclear. Assim como na Venezuela, busca-se afundar a economia iraniana, atuando contra o petróleo e o sistema financeiro. Além disso, o Irã, de maioria xiita, é chave na estabilidade do Oriente Médio e do Golfo Pérsico, seja apoiando o Líbano como contrapeso a Israel, ou ao Iêmen frente à agressão, com apoio estadunidense, da Arábia Saudita.
Outros eixos da política exterior estadunidense são as contraditórias relações com a Rússia, o apoio a Israel para que continue o genocídio sobre o povo palestino, e o diálogo iniciado com Kim Jong-un, que busca facilitar uma distensão na península da Coreia, onde estão deslocados 28.500 soldados estadunidenses. Mas, sem dúvida, China, Venezuela e Irã serão os três principais eixos da política exterior estadunidense, durante o próximo ano e meio, até que em novembro de 2020 sejam realizadas as eleições presidenciais, nas quais Trump aspirará o seu segundo mandato.
Um Trump que apesar de sua excentricidade, não abriu nenhuma frente nova de guerra, diferente de Obama, que segundo foi sentenciado pelo New York Times, tornou-se o único presidente na história de Estados Unidos a exercer seu mandato de oito anos com o país em guerra contínua. Inclusive a guerra não convencional aberta contra a Venezuela foi inaugurada, nesta última etapa, pela ordem executiva do próprio Obama.
Toda a política exterior estadunidense estará contingenciada, portanto, às eleições presidenciais de 2020, onde o cenário mais provável é o de uma vitória de Trump, que segue contando com mais apoio popular do que tinha Obama em seu terceiro ano de mandato, frente uma alternativa democrata que de momento não parece se consolidar.
Uma vez passado o momento político que o feminismo neoliberal de Hillary Clinton representa, parece ainda cedo para que o “socialismo” de Bernie Sanders dê testemunho a um novo progressismo e à proposta de New Green Deal, liderada por Alexandria Ocasio Cortez, nascida no Bronx e de mãe porto-riquenha, a nova rock star da política estadunidense.
O projeto de AOC, Rashida Tlaib, Ayanna Pressley e Ilham Omar, ala progressista do Partido Democrata, de um neokeynesianismo verde, baseado no impulso ao setor público, fomento das energias renováveis, luta contra a mudança climática e justiça social, está, vale o jogo de palavras, muito verde para a política estadunidense. Talvez em 2024, com uma hegemonia estadunidense no econômico e militar em decadência, seja o seu momento.
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Cartografia geopolítica da administração Trump - Instituto Humanitas Unisinos - IHU