25 Setembro 2018
Caro Augias, eu também penso que a polêmica de monsenhor Viganò, ex-núncio em Washington, contra o Papa Francisco tenha uma motivação política. A doutrina social da Igreja, da "Rerum Novarum" de Leão XIII à "Laudato si’'' de Francisco, sempre denunciou as distorções do capitalismo e finanças, defendendo os direitos dos trabalhadores e dos menos favorecidos. Francisco colocou no centro de sua catequese, não as abstrações dogmáticas, mas a dignidade e o respeito que cada ser humano deve ter, essência da mensagem do Evangelho. Lembro-me dos apelos pela paz e pelo desarmamento de todos os pontífices. Wojtyla foi a única voz institucional contra a desastrosa guerra no Iraque. É possível que com essas polêmicas queira-se atingir aquele que, após a crise de 2008 e a regressão no plano de proteção social, continua a ser o último bastião que se opõe à ideologia do dinheiro como poder. Se a instituição da Igreja na defesa dos valores evangélicos também vier a ser desacreditada, todo o universo cultural e social em que se fundamenta a já frágil unidade europeia entrará em colapso. E talvez este seja o último, não acidental, objetivo.
A carta acima e a resposta de Corrado Augias são publicadas por La Repubblica, 23-09-2018. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a resposta de Corrado Augias.
Algumas noites atrás, conheci um vaticanista estadunidense respeitado de mentalidade progressista. Sua opinião coincide com a do Sr. Parpinel. Entre os verdadeiros objetivos finais dos contínuos ataques ao Papa Francisco, poderia estar justamente a União Europeia. Poucos dias depois daquela ocasional conversa foi divulgada a notícia de que Stephen Bannon, chamado Steve, ex-ideólogo do presidente Trump, pretende organizar em Dignitatis Humanae cursos de liderança para formar, em palavras simples, uma nova liderança católica capaz de colocar as coisas de volta no lugar, contrastando, portanto, com a linha do Papa Francisco. Que Trump e Bannon sejam ferrenhos conservadores, contrários à ideia europeia é bem conhecido. Se examinarmos as acusações feitas pelo monsenhor Viganò contra este Papa, vemos que elas não têm consistência real quanto aos méritos. Francisco errou algumas nomeações, mas não há dúvida de que tenha de movido vigorosamente contra o flagelo da pedofilia. É evidente que o dossiê usa de forma tendenciosa o escândalo, como leva a pensar também o fato de que o ex-núncio tenha divulgado na Itália através de um jornal de extrema direita. Uma manobra tão descoberta ou é uma ingenuidade, não provável em um diplomata, ou uma clara mensagem política. Com um gesto sem precedentes, o Papa decidiu convocar em Roma, em fevereiro próximo, todos os líderes das conferências episcopais nacionais. O resultado do encontro poderia servir para esclarecer as ideias. Minha opinião é que o Papa Francisco provavelmente subestimou o fato de que lançando a si mesmo e à Igreja na luta contra as injustiças que afligem o mundo, fazendo-a descer do céu à terra, inevitavelmente a expunha à baixaria e à crueldade da luta política. Valia à pena correr esse perigo extremo? Melhor uma igreja que se contente com incensos e liturgias? Ou uma igreja viva e destroçada que suja as mãos? Quem sabe o que diria o Fundador.
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A quem incomoda a Igreja de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU