10 Agosto 2018
"Subsiste uma dificuldade das Igrejas históricas, pelo menos no Ocidente, de serem pontos de referência vivos para a maioria das pessoas em um panorama de comunidades eclesiais muitas vezes pouco sensíveis, senão até adversas ao ecumenismo."
O comentário é do teólogo italiano Brunetto Salvarani, professor da Faculdade Teológica da Emília-Romanha. O artigo foi publicado por Settimana News, 06-08-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Foi corajosa a edição recém-concluída do tradicional encontro de meados do verão [europeu] do Secretariado de Atividades Ecumênicas (SAE). Não só e não tanto porque levar adiante as reivindicações do “povo do diálogo” em um contexto social como o italiano desses últimos meses atormentados está longe de ser espontâneo – dado indubitável –, mas principalmente pelo tema escolhido, delicado e difícil, por sua parte: “As Igrejas diante da riqueza, da pobreza e dos bens da terra”.
Tratava-se, portanto, com base em uma sugestiva referência autobiográfica paulina (“Aprendi a viver na necessidade e aprendi a viver na abundância”, Fp 4, 12), de fazer as contas com a economia, elemento tão pervasivo quanto inescrutável da nossa vida cotidiana. Enquanto a sua relação com os mundos religiosos, além disso, parece evidente, mas também ambígua e, muitas vezes, mais opaca do que transparente.
Eis o motivo pelo qual, no SAE, decidiu-se corretamente que essa seria a primeira etapa de um percurso destinado a se prolongar até o próximo verão [europeu], na sessão de 2019.
Com esta sessão, a associação fundada ainda antes do Vaticano II por Maria Vingiani, retornando da assembleia extraordinária de abril voltada a uma revisão estatutária que reiterou seu caráter laical e a vocação a desenvolver a cultura do diálogo, abriu uma agenda corajosa e, em parte, inédita, com a contribuição de vozes cristãs das mais diversas confissões, judaicas e “diversamente crentes”.
Era a 55ª edição e, como de costume, ela representou um teste precioso para fazer um balanço do movimento ecumênico nacional, particularmente o de base, que opera nas Igrejas locais e, mesmo sem os holofotes da grande mídia, está passando por uma temporada bastante consoladora.
Ela foi realizada, como há cerca de três anos, em um lugar clássico para encontros semelhantes, a Domus Pacis de Santa Maria degli Angeli, em Assis, de 29 de julho a 4 de agosto, com cerca de 200 participantes de toda a Itália, em um clima sereno e positivo, com muita vontade de se encontrar e de conversar.
Não faltaram momentos externos: em Assis, na terça-feira, 31 de julho, uma oração matinal na Basílica de São Francisco e duas intervenções sobre o tema da economia e das finanças no Monte Frumentario, antigo instituto nascido para responder às exigências de crédito dos agricultores; e, também na terça-feira, as Vésperas ortodoxas celebradas no santuário de Rivotorto.
Foram muitos, portanto, os estímulos oferecidos pelos dias do SAE. O primeiro deles, provavelmente, foi o convite a ler, a estudar, a se informar, desconstruindo a vulgata segundo a qual só é possível se defender dos problemas econômicos, como de ataques demoníacos diante dos quais nos sentimos forçadamente impotentes. Também por isso, renuncio a fornecer um relato pontual dos intensos trabalhos (remetendo, a esse respeito, ao livro das atas, que ficará pronto em alguns meses, como de costume, felizmente), limitando-me a relatar algumas das intuições que emergiram na plenária, mas também nos laboratórios, com a intenção de compartilhar pelo menos o clima geral da sessão. A partir da reflexão bíblica introdutória, confiada ao presidente do SAE, Piero Stefani, que se inspirou na dupla imagem bíblica da espiga exuberante e da espiga ressequida.
Na opinião dele, o nosso mundo está refletido de algum modo nessa dupla imagem: não só em nível planetário, mas também na sociedade italiana, em que mais de 15 milhões de pessoas estão em estado de pobreza.
E não há apenas uma pobreza material para abordar, mas também a cultural. Se os presentes na sessão não podem dizer que são pobres, no entanto, “o movimento ecumênico representa uma pequena realidade em comparação com o mundo”, tanto por dimensão quantitativa, quanto por capacidade de incidir na realidade global: “Há décadas, o ecumenismo propõe uma tríade que serve de pano de fundo também ao nosso encontro: justiça, paz, salvaguarda da criação. É um compromisso perseguido com constância e sinceridade, mas quanto ele influenciou a situação no mundo? Quanto ele mudou os estilos de vida e as mentalidades?”.
Subsiste uma dificuldade das Igrejas históricas, pelo menos no Ocidente, de serem pontos de referência vivos para a maioria das pessoas em um panorama de comunidades eclesiais muitas vezes pouco sensíveis, senão até adversas ao ecumenismo.
Cristãos e cristãs são chamados, de acordo com o biblista de Ferrara, “a terem confiança na ação do Espírito, mas também a serem conscientes de que os grãos de trigo não têm em si mesmos a capacidade de crescimento da semente de mostarda, símbolo do reino”.
A imagem das duas espigas retirada dos sonhos do faraó no livro do Gênesis remete à interpretação de José e às suas escolhas políticas como vice-rei do Egito. Uma história que, de acordo com Stefani, revela a complexidade da matéria: “A Bíblia, quando leva em consideração o âmbito da política econômica, mostra aspectos ambivalentes ligados à complexidade de situações que, embora apenas narrativas, são análogas a circunstâncias reais nas quais somos frequentemente forçados a fazer escolhas questionáveis mesmo no caso em que são motivadas por retas intenções”.
Como se ressaltou em diversas intervenções em Assis, o tema da riqueza e da pobreza, na realidade, é antigo, presente desde o surgimento das primeiras comunidades cristãs, mas – embora referindo-se à mesma fé –, na história das Igrejas, as linhas de conduta assumidas nesse campo, muitas vezes, foram diametralmente opostas; ou, melhor, talvez em nenhum outro âmbito conviveram e convivem orientações e práticas tão divergentes, sem que nenhuma delas tenha conseguido prevalecer definitivamente.
É uma perspectiva sobre a qual – observou-se em várias ocasiões – é preciso refletir. Não nos é dado habitar sobre a terra e caminhar na história sem bens: o problema é como geri-los. No entanto, aquilo que se descobre quando se olha com sinceridade para o próprio “particular” também vale para as comunidades eclesiais: e muitas vezes é árduo encontrar uma linha de fronteira que separe o excessivo do limitado, o oportuno do inconveniente e, em alguns casos, até mesmo o permitido do ilícito.
Nas situações concretas, as escolhas específicas, mesmo que motivadas por boas intenções, são frequentemente caracterizadas pelo claro-escuro.
Além disso, na realidade, existe até uma certa conexão entre economia e soteriologia: depois da “economia da salvação” (Eusébio de Cesareia), e da “economia como salvação” (Max Weber), as sucessivas crises e as tentativas dos Estados para sustentar bancos e investimentos privados estariam indicando, agora, a necessidade vital de “salvação da economia” (Patrick Viveret). Mesmo que, dados os tremendos desequilíbrios sociais ainda existentes entre povos, países, homens e mulheres, é necessário se perguntar: é realmente essa economia, caracterizada pelo capitalismo e pelo liberalismo aparentemente triunfantes, que devemos tentar salvar? Vale a pena, pelo menos, duvidar disso.
Mas isso não é tudo. De fato, a relação profunda entre economia e religião não é uma característica do (assim chamado) Ocidente: ao contrário, a racionalidade moderna procurou separar esses espaços, tão unificados ou simbióticos nas culturas (assim chamadas) pré-modernas.
Enquanto isso, também no Ocidente, a economia e a religião – o cristianismo nas suas várias formas, mas não só – conservam muitas interfaces e interpretações de dogma e de mística.
Há o suficiente para admitir o emaranhado profundo, não desprovido de ambiguidades (o evangelho, por exemplo, certamente não propõe modelos econômicos específicos), entre religiões e economia. Walter Benjamin, em 1921, escrevia que o capitalismo não precisava mais de um apoio ascético, porque se tornara, ele mesmo, uma religião cultual, sem teologia e dogmática, sem trégua nem piedade, que produz culpa e dívida. Enquanto hoje as religiões se encontram diante de um capitalismo e de um neocolonialismo cada vez mais extremos, aos quais é difíceis resistir e que fagocitam até símbolos e regras religiosas como formas para abrirem novos espaços comerciais. Cenários inéditos que põem em questão o próprio ser das religiões, suas práticas e sua posição no mundo.
É claro que Jesus nos educa a captar o ser humano na sua finitude, nos seus limites, nas suas fraquezas, na sua pobreza moral e material. Finitude, limite, fraqueza, pobreza: todos termos que a economia, por sua natureza, não pode compreender, mas que, ao contrário, deve combater por serem contraditórios a ela.
Não é sem significado que Jesus tenha dito que, no fim dos tempos, os critérios do juízo não terão nada a ver com aquilo que acreditávamos, mas no fato de termos dado de comer, de beber, de vestir, de termos cuidado, abrigado, visitado famintos, sedentos, nus, doentes e sem-teto (Mt 25, 31-46). Isto é, no fato de termos, nós mesmos, captado o nosso próximo na sua realidade, de a termos compartilhado com ele e tentado superá-la...
Mas há espaço hoje para uma economia justa, solidária, baseada no respeito pelo bem comum, como deseja, entre outros, o Papa Francisco, na encíclica Laudato si’? E para uma lógica econômica que preveja o ser humano como fim, e não como puro meio?
Perguntas antigas, que ressoam constantemente nas muitas conferências previstas e que atualmente assumem uma relevância decisiva para o futuro do nosso planeta.
A ideologia da autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira, de fato, só aumentaram as desigualdades, provocando a rejeição de qualquer referência ética e alimentando a violência como reação dos excluídos de um sistema radicalmente injusto.
Não por acaso, esse foi o assunto confiado à teóloga batista Lidia Maggi e ao teólogo e bispo de Modena Erio Castellucci, sobre o qual encerrou-se a sessão, mantendo a porta aberta: como testemunhar o evangelho nas sociedades das desigualdades econômicas?
Castellucci respondeu: um testemunho concreto da ressurreição de Jesus só pode passar por uma real distribuição dos bens e por uma eficaz justiça social nas comunidades cristãs. Perspectiva desafiadora, que requer uma temporada de conversão autêntica das Igrejas e nas Igrejas.
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Economia e teologia: as Igrejas diante da riqueza, da pobreza e dos bens da terra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU