07 Junho 2016
"Trabalhando por remuneração miserável, os congoleses alimentam o mundo tecnológico e ultramoderno criado pela globalização e pelos aparelhos que carecem desta matéria prima para existirem", alertam Giulia De Conto Affonso e Marina Soares Rossetto, graduandas em relações internacionais da Unisinos, em artigo produzido como parte do trabalho do Laboratório de Análise de Conjuntura, sob a coordenação do Prof. Bruno Lima Rocha.
Eis o artigo.
Genericamente conhecido como ouro azul, ou COLTAN, formado por uma mistura entre Columbite e Tantalita, o Columbite-Tantalita é considerado um minério peculiar, não somente por sua raridade, mas também pelo momento em que fora descoberto: no ano 2000. As grandes empresas de tecnologia estavam começando a prosperar, a planejar uma forma de produção em escala global e a buscar cada vez mais frequentemente mercados abertos e países que oferecessem mão de obra acessível e barata para a fabricação de objetos como telefones celulares e computadores. O COLTAN é utilizado como condutor de cargas elétricas em eletrônicos, sendo por esta razão tão valorizado neste mundo que testemunha o processo desigual de Globalização.
Mapa fornecido pelos autores
Percebendo-se a importância que esse minério apresenta para grande parte das companhias mais poderosas e ricas do mundo, vê-se a dimensão de cobiça que se desenvolveu na República Democrática do Congo (RDC) desde a sua independência, na década de 60. Forças rebeldes – não apenas da RDC – mobilizaram-se para assumir o controle da extração de COLTAN nas minas, sendo este excepcionalmente raro e encontrado em poucos países do mundo. Este é um dos minérios estratégicos do território congolês que dispõe, pois além do “ouro azul”, conta também com um terço das reservas mundiais de cobalto e de diamantes, o que expõe os interesses ocidentais na região. Calcula-se que a RDC detenha 80% das reservas mundiais de Columbite-Tantalita. A riqueza do subsolo congolês é proporcional às agressões das transnacionais contra o país, incluindo a permanente desestabilização forçada desde o estrangeiro.
Não é difícil perceber a relevância estratégica e econômica das minas de COLTAN e demais minérios estratégicos, as forças rebeldes, – não somente congolesas, mas também advindas de Ruanda e Uganda – que até hoje lutam na guerra civil no território da RDC, foram atraídas para as reservas, forçando os habitantes das comunidades a formarem grupos de resistência para garantir sua própria sobrevivência, auto intitulando-se de Mai Mai. Por sua vez, estes movimentos, que começaram com a intenção de defender recursos e territórios nacionais, rapidamente degeneraram conforme vilarejos foram arrasados, mulheres foram estupradas e os Mai Mai utilizaram seu crescente poder para se auto financiar no comércio do mineral, prejudicando ainda mais o IDH já baixo do país. Em 2003, 3.4 milhões de congoleses deixaram o país em resposta aos ataques dos diversos grupos militantes.
O COLTAN faz parte da base da cadeia de commodites da área de alta tecnologia global, o que o torna incrivelmente cobiçado por grandes empresas que visam lucrar a nível mundial.
Simultaneamente, é o recurso que pode auxiliar grande parte do continente africano a sair da condição de pobreza extrema, mas a demanda internacional por telefones celulares e computadores cada vez mais modernos e caros e o fetiche que existe atualmente por específicas marcas de eletroeletrônicos, como a Apple, que está sendo exclusivamente discutida no estudo o qual este artigo faz parte, está ultrapassando os limites da legalidade e dos Direitos Humanos que deveriam ser garantidos para as populações congolesas diariamente exploradas para suprir esta mesma demanda.
O único modo de alterar esta triste realidade seria responsabilizando legalmente as empresas que influenciam na manutenção e no financiamento das guerras regionais por suas ações. Afinal, não é novidade a presença de Estados ocidentais nas injustiças que ocorrem no Ex-Zaire, mas esta situação necessita de urgente mudança.
Sendo obtido através de um processo quase primitivo de extração, dezenas de pessoas trabalham juntas para cavar grandes crateras à margem dos riachos, removendo a terra para escavar e encontrar o COLTAN subterrâneo. Em seguida, sacos plásticos são carregados com o minério e levados nos ombros e nas cabeças pelos trabalhadores das minas até um canal, onde o minério é filtrado à mão e as impurezas, como terra e areia, são separadas do metal em si. Os melhores extratores do minério conseguem produzir cerca de um quilo por dia, porém, o que é mais alarmante em toda esta situação, é o contraste das condições consideradas comparáveis como as do século XIX em que os trabalhadores das minas de COLTAN se encontram. Trabalhando por remuneração miserável, os congoleses alimentam o mundo tecnológico e ultramoderno criado pela globalização e pelos aparelhos que carecem desta matéria prima para existirem.
Os pontos de vista a respeito da extração do COLTAN são muito controversos e esclarecimentos em geral sobre a origem dos telefones celulares e daquilo que os compõem não são dados para a população consumidora destes produtos, pois não é do interesse dos meios de comunicação em massa que este tipo de informação seja divulgada. Manter a maioria da população mundial no campo da ignorância é um dos fatores que influenciam na continuidade do conflito na RDC assim como uma série de conflitos econômicos e políticos ao redor do mundo, pois deste modo a opinião internacional não intervém nos maus tratos e injustiças corriqueiras no país enquanto as grandes empresas transnacionais podem continuar lucrando com obtenção dos minérios. A questão principal é: como mudar essa realidade?
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Minério de Sangue: COLTAN - Instituto Humanitas Unisinos - IHU