Subsídio elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF:
Dr. Bruno Glaab
Me. Carlos Rodrigo Dutra
Dr. Humberto Maiztegui
Me. Rita de Cácia Ló
1ª leitura: Isaías 35,1-6a.10
Salmo: Sl 145,7.8-9a.9bc-10 (R. Cf. Is 35,4)
2ª leitura: Tiago 5,7-10
Evangelho: Mateus 11,2-11
O centro da mensagem do texto evangélico do 3º domingo do advento é a exaltação de João e da sua missão, feita por Jesus; e o seu redimensionamento como figura
preparatória do Reino dos Céus instaurado em Cristo.
Do ponto de vista narrativo, a pergunta de João vai expressar uma dúvida sobre Jesus ou será um expediente para que Jesus manifeste mais claramente a própria identidade?
Os ganchos com os capítulos precedentes são fortes: as “obras messiânicas” que põem João em alerta são aquelas exibidas nos cap. 8-9; e as “coisas que ouvem e veem”, na resposta de Jesus, se referem mais aos discursos evangélicos que aos milagres. Note-se que em Mt 3 João Batista havia dado testemunho de Jesus, agora Jesus testemunha a respeito de João. Do ponto de vista temático, Mt 11 é uma espécie de flashback. Jesus se situa em relação a João, e através dele fala de si mesmo. O elogio feito a João se torna ocasião para um primeiro balanço de sua atividade que, como aquela de João, sofreu forte oposição.
Sabemos que João Batista está preso (4,12). E que será martirizado (14,3ss). A situação na qual se encontra João é fundamental para compreender a sua pergunta. Ele ouviu falar das “obras do Messias”. Quais são estas obras? As mesmas narradas nos cap. 8-9, e agora resumidas por Jesus através de um elenco de citações de Isaías: “cegos veem”, “surdos ouvem”, “mancos caminham”, “mortos despertam”, “pobres são evangelizados” (Is 29,18; 35,5, vide 1ª. Leitura; 26,19; 61,1). Colocada no final, em posição deliberadamente estratégica, a obra messiânica por excelência é a evangelização dos pobres (Mt 5,3; 9,36). Mas aquele texto de Isaías prossegue dizendo: “Me enviou... para a libertação dos prisioneiros” (Is 61,1-2).
À pergunta bem precisa de João, Jesus não dá uma resposta tão precisa: deixa falar os fatos. Entre as obras messiânicas está restituir a liberdade aos cativos, e João Batista se encontra na prisão! Ouve falar de Jesus, no cárcere: suprema contradição. A pergunta de João é altamente dramática. Que Messias é esse que não o liberta da prisão? Ela é assim formulada: és tu aquele que devia vir, ou devemos esperar um outro? “aquele que deve vir” (literalmente: que vem, ho erchómenos), é um particípio já usado por João Batista em Mt 3,11 (“aquele que vem depois de mim”) e tudo colorido com um sentido messiânico (Mt 21,9; 23,39) “aquele que vem em nome do Senhor”. Ou será outro que deve vir? É necessário tomar essa pergunta em toda sua seriedade, gravidade e dramaticidade. Neste ponto do evangelho a pergunta exprime uma dúvida que é também do leitor: Jesus é verdadeiramente o Messias esperado? As suas obras são suficientes para creditá-lo como tal?
Na sua resposta aos discípulos de João, Jesus diz poucas coisas citando algumas passagens da Escritura. Aparece somente uma palavra não escriturística dita por Jesus, e é, talvez, a mais reveladora. A bem-aventurança para quem “não se escandalizar” por causa de Jesus. Sinal que dele podemos escandalizar (5,29). Jesus admite que apesar de tudo aquilo que se ouve e se vê dele, não é evidente que ele deva ser considerado o Messias. A dúvida de João tem razão de ser. A concepção terrena e triunfalista a respeito do Messias impedia aos judeus reconhecer Jesus como enviado definitivo do Reinado do Pai. Para aderir a Jesus como ao Messias existe um escândalo a superar, o escândalo de um Messias pobre e desarmado neste mundo.
Jesus alude a si mesmo falando de João que, na prisão, extinguiu sua missão, enquanto Jesus deve ainda levá-la a cumprimento: da dúvida de João sobre Jesus se passa a certeza de Jesus sobre João. Jesus testemunha que João antes de tudo não é um “caniço sacudido pelo vento”. Com uma série de três perguntas retóricas se dirige à multidão questionando “o que fostes ver no deserto?” Um frágil caniço? Não, João não era uma palhazinha agitada pelo vento.
“Mas”, e se repete a mesma pergunta, “o que fostes ver?” o grego introduz cada repetição da pergunta com a conjunção adversativa allá, que pode significar “más” ou “se não”. Se não era por isso, o que fostes ver? João não era tampouco um “homem bem-vestido”, se vestia com peles de camelo (Mt 3,4), era um asceta, um homem forte e vigoroso. Então, de fato, o que procuram? “Um profeta?”
Esta é a resposta boa, porém ainda insuficiente: “Sim, vos digo e mais (maior) do que um profeta”. João não é um simples profeta, é o precursor do Messias. Para provar isso, segue uma citação bíblica que faz uma sugestiva combinação entre um texto profético e com outro da Torah: “Eu vou enviar o meu mensageiro para que prepare um caminho diante de mim” (Ml 3,1). “Mandarei um anjo à tua frente, para que te guarde pelo caminho e te introduza no lugar que eu preparei” (Ex 23,20).
Destacam-se dois acentos: a preparação do caminho e a mudança dos pronomes pessoais em relação a Ml 3 “preparará o teu caminho diante de ti”. Tudo isso tem como efeito que o retorno de Elias, biblicamente destinado a preparar o “dia do Senhor”, foi relido como uma preparação à vinda do Messias.
Assim, Jesus conecta a referência entre João Batista e Elias, à sua própria qualidade messiânica e à sua recíproca interdependência numa relação de mestre-discípulo. O testemunho prossegue declarando João como o “maior” (meízon) entre os nascidos de mulher. Quem é, pois, o “menor” (ho mikróterós) nominado logo depois (v.11)? “O menor”, tomado absolutamente, significa o mais jovem. Se João (cf. v.13) é considerado a última e mais importante manifestação do AT, no reino messiânico aparece como subordinado, pois, quem entrou na nova era da graça acha-se, em relação a ele, um grau acima.
O precursor é maior, visto que veio preparar o advento do Reinado do Senhor. Mas quem fizer parte dele, ainda que seja o menor, tem maior dignidade, pois goza da luz de Cristo superior à de João. Estes versículos destacam a dimensão da ruptura e da novidade radical em relação à Lei e aos Profetas.
O texto do profeta Isaías é lido como profecia messiânica. A “vingança” divina não é tanto o castigo dos ímpios, quanto a salvação que o Senhor opera do povo e, em particular, dos últimos da sociedade.
A carta de Tiago relaciona-se com o Evangelho na medida em que aborda o tema da impaciência pela vinda do Senhor. Essa expectativa deve ser vivida como uma espera alegre e ativa, que corresponda à expectativa de Deus em relação a cada um de nós.