29 Outubro 2015
Se você quer mesmo saber o que aconteceu do lado de dentro do Sínodo dos Bispos deste ano, não precisa se preocupar demais com o seu relatório final (relatio) sobre a Igreja e a família.
Cada um daqueles 94 parágrafos artigos, ou parágrafos, foi aprovado por, pelo menos, dois terços dos 264 prelados (e um leigo) que participaram na votação final. E o motivo por que houve uma aprovação tão esmagadora é por causa de um compromisso delicado que tirou todos os assuntos polêmicos da mesa ou os tratou com uma linguagem franca.
O comentário é de Robert Mickens, editor-chefe da revista Global Pulse, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 26-10-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Não obstante, os católicos com pontos de vista (e mesmo ideologias) contrastantes encontraram formas de gritar “vitória” por aquilo que defendiam, através de uma leitura favorável de uma passagem ou outra. Mas eles estão deixando passar o principal.
A novel decisão do Papa Francisco em convocar o Sínodo para duas sessões em 12 meses, onde se debateria livremente sobre exatamente o mesmo assunto (“A vocação e missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo”), não foi primeiramente sobre a família. Em vez disso, teve a ver com reintroduzir um processo de discussão e debate no mais alto nível da Igreja, algo que não era visto desde os primeiros anos imediatamente seguintes do Concílio Vaticano II. Ele confirmou isto num discurso proferido no dia 17 de outubro durante um simpósio que marcou o 50º aniversário do Sínodo dos Bispos.
Neste processo, Francisco pretendeu que o seu primeiro encontro sinodal (o do ano passado) ajudasse os prelados a “tomar o pulso” do povo católico. Ele estimulou isto ao pedir que a Secretaria Geral do Sínodo enviasse, vários meses antes, um questionário inédito a todos os bispos do mundo, material que os incentivava a envolver os fiéis leigos de forma que expressassem suas visões e experiências quanto ao ensino e a práxis da Igreja no tocante ao matrimônio, à família e à sexualidade.
Ele teve uma outra ideia para o segundo encontro sinodal, aquele que a recém acabou neste mês de outubro. Parece claro, agora mais do que nunca, que este evento foi projetado para auxiliar ele – o papa – a “tomar o pulso” dos bispos. E nisso houve sucesso. Em certo sentido, ele conquistou aqueles bispos que, até agora, não haviam mostrado a sua mão.
Não acredita?
Na noite de sábado, quando ele encerrou os trabalhos deste Sínodo, o papa contou aos bispos e observadores o que ele achou que o presente exercício significou.
Entre outras coisas, ele disse: “Espoliamos os corações fechados que, frequentemente, se escondem mesmo por detrás dos ensinamentos da Igreja ou das boas intenções para se sentar na cátedra de Moisés e julgar, às vezes com superioridade e superficialidade, os casos difíceis e as famílias feridas”.
Sem dúvida, Francisco fazia notar aqueles prelados que ele tinha em mente.
E embora ele agradeceu os bispos por se engajaram em um “diálogo rico animado” através das muitas “diferentes opiniões que se expressaram livremente”, lamentou que alguns participantes sinodais às vezes se expressaram “com métodos não inteiramente benévolos”.
Ele com certeza riscou os nomes de mais alguns bispos.
“A experiência do Sínodo fez-nos compreender melhor também que os verdadeiros defensores da doutrina não são os que defendem a letra, mas o espírito; não as ideias, mas o homem; não as fórmulas, mas a gratuidade do amor de Deus e do seu perdão”, disse o papa.
Mais nomes acrescidos ao seu livrinho negro?
Francisco também disse que esta última assembleia sinodal “significa que procuramos abrir os horizontes” e – aqui ele poderia estar tendo em mente mais uma dúzia ou mais de bispos – “superar toda a hermenêutica conspiradora ou perspectiva fechada, para defender e difundir a liberdade dos filhos de Deus”.
O papa forjou estas impressões não tanto a partir do relatório final que o Sínodo produziu, mas a partir das três semanas que passou envolvido com os participantes no salão sinodal.
Conforme o Cardeal Gerald Lacroix, de Quebec, contou aos jornalistas semana passada: Francisco conhece “os pontos difíceis” dos debates que foram travados. Ele também “conhece o peso de cada argumento”, mesmo aqueles que não entraram no documento final.
Em outras palavras, o papa acabou conhecendo muito bem os bispos e, agora, está numa posição mais firme para distinguir aqueles que estão junto de si em seu objetivo de renovar e reformar a Igreja e aqueles que não estão.
Mas, se os mais de 250 bispos (havia também Padres Sinodais não bispos) que se fizeram presentes nesta assembleia sinodal são verdadeiramente os representantes do episcopado mundial, Francisco pode ter um caminho difícil pela frente.
Quase um terço dos Padres Sinodais votaram contra aqueles artigos do relatório final que, embora grandemente minimizados, sugeriam uma maior abertura para se acomodar os católicos que não se mantiveram firmes no seu compromisso marital diante das leis e ensinamentos da Igreja.
E ainda mais alarmante é a lista de doze bispos que a Assembleia Geral elegeu para o seu Conselho Permanente. Junto com três nomeações papais, este grupo de quinze prelados irá preparar a base para a próxima Assembleia Ordinária do Sínodo.
Pediu-se à Assembleia que se escolhessem três representantes de cada um dos continentes: das Américas, da Europa, da África e da Ásia-Oceania. Segundo uma reportagem, Dom Charles Chaput, da Filadélfia, recebeu mais votos do que todos os demais. Dom Blaise Cupich, de Chicago, que estava entre os três primeiros eleitos das Américas, foi eliminado porque somente um representante por país era permitido.
Os demais eleitos, em grande parte descritos como opositores à mudança, foram os cardeais George Pell (chefe da Secretaria para a Economia), Robert Sarah (prefeito da Congregação para o Culto Divino), Marc Ouellet (prefeito da Congregação para os Bispos) e Wilfrid Napier (África do Sul).
Eleitos entre aqueles outros bispos geralmente vistos como tendo uma mentalidade mais a favor das reformas estavam os cardeais Vincent Nichols (Inglaterra), Christoph Schönborn (Áustria), Oscar Rodriguez Maradiaga (Honduras), Luis Tagle (Filipinas), Oswald Gracias (Índia) e Dom Bruno Forte (Itália).
O décimo-segundo eleito para o Conselho Permanente foi Dom Mathieu Madega Lebouankehan (Gabão).
O Papa Francisco terá condições de romper aquilo que parece ser um conselho dividido ao nomear três bispos familiares com o seu próprio pensamento. E, o que é mais importante, ele agora tem uma melhor leitura dos cerca de 250 bispos que estiveram por Roma nestas últimas três semanas.
No passado, os papas e os seus assessores mais próximos consideravam estas assembleias sinodais com sendo úteis para descobrir talentos e selecionar futuros líderes eclesiásticos. Depois deste mais recente exercício, no qual ele praticamente forçou os bispos a porem à mesa o que haviam trazido consigo, o Papa Francisco está em melhores condições para escolher, com confiança, uma série de prelados que serão ativos em levar a cabo a sua agenda de renovar a Igreja.
Com certeza, ele percebe que, com a atual safra de bispos, ele vai precisar de todo o apoio possível.
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O Papa conquistou a sua oposição - Instituto Humanitas Unisinos - IHU