Sistema prisional da Região Metropolitana de Porto Alegre tem déficit de 4 mil vagas

  • Quarta, 5 de Junho de 2019

Motivado a sistematizar e publicizar dados acerca dos temas que envolvem a formulação, execução e monitoramento das políticas públicas, o Observatório da realidade e das políticas públicas do Vale do Rio dos Sinos - ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, coletou informações do mês de maio de 2019 no sistema Geopresídios, uma radiografia do Sistema Prisional brasileiro apresentada pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ. Neste banco de dados, observa-se que tanto o país quanto o estado e a região apresentam déficit de vagas em seus estabelecimentos. O Rio Grande do Sul, por exemplo, registrou um déficit de 11.894 vagas e a Região Metropolitana de Porto Alegre - RMPA possuía 4.268 presos a mais do que a capacidade existente.

Brasil

O país possuía mais de 700 mil pessoas no sistema prisional em maio de 2019. Deste total, 48% estão presos em regime fechado, 16% estão presos em regime semiaberto, 1,3% em regime aberto e 35% estão presos provisoriamente. Contudo, os 2.617 estabelecimentos espalhados pelo Brasil possuem capacidade para 418.832 pessoas, resultando num déficit de 281.210 vagas.

InfográficoPopulação sob algum tipo de pena de reclusão no Brasil (maio/2019)

InfográficoNúmero de vagas e presos no Brasil (maio/2019)

Rio Grande do Sul

O estado registrou, em maio deste ano, 98 estabelecimentos que comportam 21.707 vagas. Com uma população de 34.756 presos, observa-se que as instalações estão com 160% de sua capacidade utilizada, isto é, contabilizando um déficit de 11.894 vagas.

InfográficoNúmero de vagas e presos no Rio Grande do Sul (maio/2019)

Do número total de presos, 45% estão em regime fechado, 35% em regime de prisão provisória e 16% em regime semiaberto. É importante destacar que o estado possui 17.409 pessoas em prisão domiciliar, 100 presos estrangeiros e 5.433 presos em monitoramento eletrônico.

InfográficoNúmero de presos no Rio Grande do Sul por tipo de regime (maio/2019)

Região Metropolitana de Porto Alegre

A região possuía, no quinto mês deste ano, 24 estabelecimentos com vagas para 9.457 pessoas, porém a população de presos é de aproximadamente 13.515, gerando um déficit de 4.268 pessoas. Deste total, 5.726 ou 42% estavam presos sob regime provisório e 5.499 ou 41% sob regime fechado. 

InfográficoNúmero de vagas e presos da RMPA (maio/2019)

As comarcas da região, isto é, a divisão baseada na área territorial onde um juiz de primeiro grau irá exercer sua jurisdição e que, neste caso, possui estabelecimentos prisionais, são Canoas, Charqueadas, Gravataí, Guaíba, Novo Hamburgo, Porto Alegre e São Jerônimo. Estas comarcas podem abranger um ou mais municípios e estabelecimentos, conforme observado no infográfico a seguir:

InfográficoComarcas e seus respectivos estabelecimentos na RMPA

O Presídio Central de Porto Alegre acolheu aproximadamente 32% do total da população carcerária da região. Em maio deste ano o presídio possuía 4.326 presos para 1.905 vagas, registrando um déficit de 2.421. Em seguida, a Penitenciária Estadual do Jacuí acolheu 19% do total de presos, ou seja, 2.590 pessoas para 1.422 vagas, contabilizando um déficit de 1.168.

InfográficoNúmero de vagas e presos por regime de reclusão na RMPA(maio/2019)

Políticas públicas e o sistema prisional no Brasil

Estes dados necessitam ser analisados e confrontados, especialmente em sua relação com as políticas públicas. Seguem aqui algumas pontualizações, que foram referenciadas em entrevistas e notícias publicadas pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU:

“10 medidas para o sistema prisional. Propostas estruturais na política penitenciária brasileira”

O Instituto Humanitas apresentou matérias importantes em relação ao sistema prisional nacional e o trato com as políticas públicas vinculadas a este assunto. Cabe citar a relevância da matéria de janeiro de 2017, intitulada “10 medidas para o sistema prisional. Propostas estruturais na política penitenciária brasileira”. Nela, é apresentado um documento de dez propostas engendradas pelo ministro da justiça Alexandre de Moraes com o objetivo de estimular uma nova forma de pensar o encarceramento e o sistema punitivo nacional. Citam-se alguns trechos dignos de discussão:

“A estratégia de prender mais, portanto, não tem sido capaz de reduzir a criminalidade. Ao contrário: falido, o sistema tem ajudado a reproduzir a violência e as violações de direitos humanos. É necessário reduzir o fluxo de entrada no sistema prisional e aumentar o fluxo de saída”.

“Um dos mais importantes sinais da falência do sistema carcerário brasileiro é o número de prisões provisórias (conforme observado nos dados mencionados para a RMPA). Em geral, são pessoas com restrito acesso à Justiça que respondem por crimes sem violência e poderiam aguardar julgamento fora da prisão – o que, de uma só vez, melhoraria o acesso à defesa e desobstruiria o sistema”.

“O aumento substancial na quantidade de pessoas atrás das grades (da ordem de 575% entre 1990 e 2014) não foi acompanhado por uma melhora nos canais de acesso à Justiça”.

“Aproximadamente 85% das mulheres presas no Brasil respondem por crimes decorrentes de sua vulnerabilidade social, ou seja, crimes patrimoniais e relacionados a entorpecentes”. Este cenário demanda tratamento digno às mulheres encarceradas.

“Políticas públicas para egressos: apesar de constituírem instrumentos fundamentais para a interrupção do ciclo de violência e encarceramento, as políticas públicas para a reinserção de egressos ainda são limitadas. ”

“O quadro do acesso à saúde é grave no sistema prisional brasileiro. Hoje, os serviços são administrados pelas secretarias estaduais responsáveis pela administração penitenciária, e não pelo SUS. ” Esta situação demanda a efetivação do direito à saúde.

Fracasso do sistema prisional: “Dos juízes espera-se mais do que uma atuação burocrática e formal”, pontua Haroldo Caetano da Silva, membro do Grupo de Estudos e Pesquisas Criminais – GEPeC em entrevista para IHU On-line. O entrevistado mostra que a superlotação dos presídios brasileiros demonstra que a “prisão é utilizada como um recurso de contenção social”, que não “ataca as causas da violência”. Segundo o estudioso, a solução para resolver o excesso de detentos nos cárceres depende da “aplicação de outras modalidades de sanção penal, não privativas da liberdade. A prisão, de regra geral, deveria passar a ser excepcional. A legislação já dispõe de um arcabouço razoável de penas não privativas da liberdade. Falta aplicá-las”.

A violência do país não será resolvida com o aprisionamento de adolescentes e jovens. Por fim, é pertinente comentar que o sistema prisional não é o único a enfrentar problemas de implementação de políticas públicas adequadas e coerentes com as diretrizes da Constituição de 1988 e dos Direitos Humanos. Uma nota realizada pelo Observasinos em dezembro de 2018 mostra que o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo também pode sofrer alterações com a PEC 33/2012, em especial com a proposição da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. Em entrevista ao Observatório, a Profa. Dra Rosangela Barbiani enfatiza que “o encarceramento de adolescentes e jovens não solucionará a violência do país, cujas raízes encontram-se na histórica desigualdade social que aniquila com as possibilidades de vida digna e ascensão social da maioria da população brasileira, sobretudo a jovem. ”

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