De 2004 a 2014, a valorização do salário mínimo e a baixa taxa de desemprego contribuíram para a diminuição da desigualdade de renda na Região Metropolitana de Porto Alegre - RMPA, mas o desemprego crescente, a partir de 2015, pode reverter este processo. O Observatório da realidade e das políticas públicas do Vale do Rio dos Sinos - ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos - IHU, compartilha a nota publicada pela Fundação de Economia e Estatística - FEE.
Eis o texto.
O desempenho negativo do mercado de trabalho em 2015 interrompeu uma longa trajetória de avanços: redução do desemprego, aumento do rendimento médio real e redução das desigualdades de renda do trabalho.
Segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego na Região Metropolitana de Porto Alegre (PED-RMPA), a taxa de desemprego reduziu-se de 15,9% em 2004 para 5,9% em 2014, voltando a subir, em 2015, para 8,7% da População Economicamente Ativa (PEA). Já o rendimento médio real dos ocupados cresceu 21,5% de 2004 a 2014 e reduziu-se 7,5% em 2015. Ao analisar o comportamento do rendimento médio real dos ocupados por escolaridade, percebe-se que os indivíduos com menor nível de instrução foram os mais beneficiados com o ciclo de recuperação da renda iniciado em 2004 (Gráfico). Entre 2004 e 2014, os indivíduos com o ensino fundamental incompleto tiveram aumento de 35,6%, e aqueles com o ensino fundamental completo, de 19,6%, enquanto os trabalhadores com o ensino médio completo e ensino superior registraram crescimento de 9,1% e 1,1% respectivamente.
Essa recuperação dos rendimentos médios, sobretudo entre aqueles que estão na base da estrutura salarial, parece ter sido influenciada, em grande medida, pela valorização do salário mínimo, cujo crescimento real foi de 60,2%, no mesmo período, mas também pelo padrão de crescimento da economia brasileira, baseado no consumo das famílias, ampliado pelo crédito e pela política de transferência de renda em um cenário externo favorável. O economista polonês Michael Kalecki, com base na Teoria da Dinâmica Econômica, demonstrou que a distribuição da renda a favor dos trabalhadores (principalmente daqueles que possuem os menores salários e, consequentemente, maior propensão ao consumo) possui efeito positivo sobre a demanda agregada, a produção e o emprego. Nesse sentido, o desempenho favorável do mercado de trabalho brasileiro, nesse período, refletiu, em alguma medida, essa dinâmica, formando um ciclo econômico virtuoso com avanços sociais. Contudo esse processo foi interrompido, em 2015, frente ao aumento do desemprego e à queda da renda.
Destaca-se que o fato de a recuperação do rendimento médio, de 2004 a 2014, ter sido mais intensa entre os menos escolarizados, que também são os que recebem os menores salários, proporcionou uma melhora nos indicadores de desigualdade de renda do trabalho na RMPA. Em 2004, o rendimento médio real de um trabalhador com o ensino fundamental incompleto correspondia a 24,5% do rendimento de outro, com ensino superior, tendo registrado sucessivos aumentos, até atingir 32,9% em 2014, valor que foi levemente reduzido para 32,4% em 2015. Aqueles com o ensino fundamental completo recebiam o equivalente a 28,4% do rendimento do trabalhador com o ensino superior em 2004, tendo aumentado para 33,6% em 2014 e 33,8% em 2015. O Índice de Gini (que calcula a desigualdade de renda) para o rendimento-hora dos ocupados na RMPA apresentou tendência de declínio, exceto em 2009, quando se observou uma pequena elevação. O Índice de Gini, que era de 0,470 em 2004, reduziu-se para 0,399 em 2014 e manteve-se relativamente estável em 0,400 no último ano. Observa-se que a retração do rendimento médio real, em 2015, ocorreu em todos os níveis de escolaridade, sendo de 6,3% para ensino fundamental incompleto, 4,5% para ensino fundamental completo, 9,4% para ensino médio completo e 5,1% para ensino superior completo.
Em síntese, o desempenho favorável do mercado de trabalho na RMPA, ao longo desses 11 anos, refletiu e, ao mesmo tempo, retroalimentou a dinâmica econômica do Brasil entre 2004 e 2014, da mesma forma que o desempenho negativo de 2015 foi condicionado pelo ambiente de recessão econômica frente à retração de 3,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil (IBGE) e de 3,4% do PIB do Rio Grande do Sul (FEE). Já a redução das desigualdades de renda do trabalho deveu-se ao efeito da valorização do salário mínimo sobre a base da estrutura salarial e ao fato de o aumento do rendimento médio real ter sido mais intenso entre os menos escolarizados, até 2014.