14 Dezembro 2015
Um "pacto de não agressão" selado conjuntamente pelos grupos armados de matriz islâmica e cristã em Bangui, a martirizada capital da África Central, contribuiu para que a recente visita de Francisco ocorresse sem incidentes.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no jornal La Stampa, 10-12-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O documento traz as assinaturas de Abdoulaye Hissen, pelos ex-Seleka muçulmanos, e de Maksim Mokom, pelos anti-Balaka pró-cristãos. E foi assinado em uma data destinada a ficar gravada na memória da Europa: 13 de novembro, o dia dos atentados em Paris.
Poucas horas antes que o horror da ideologia fundamentalista ensanguentasse as ruas da capital francesa, no coração da África, em um país historicamente muito ligado à França, duas personalidades influentes nos respectivos grupos armados que há muito tempo se enfrentam na República Centro-Africana assinaram uma trégua.
Graças ao paciente trabalho de mediação desempenhado pela Gendarmeria Vaticana e pela Comunidade de Santo Egídio, eles colocaram no papel o seu compromisso, permitindo que Francisco inaugurasse com mais de uma semana de antecipação o Jubileu da Misericórdia sem incidentes e sem ameaças à segurança própria, da sua comitiva, dos fiéis presentes.
Na segunda-feira, 30 de novembro, na sacristia do estádio em Bangui, onde o Papa Bergoglio celebrou a missa diante de milhares de jovens, com a máxima confidencialidade, Hissen e Mokom confiaram o "pacto de não agressão" nas mãos do sostituto da Secretaria de Estado, o arcebispo Angelo Becciu, que confirma ao jornal La Stampa o encontro e a entrega.
Um modo para fazer com que o documento chegasse a Francisco através da mediação de um dos seus colaboradores mais próximos. Como se poderá lembrar, por causa dos confrontos entre os milicianos e, especialmente, a instabilidade no bairro muçulmano "Km 5", onde durante semanas continuaram os tiroteios com diversas vítimas, a etapa na África Central foi considerada sob risco até o último instante.
O governo francês tinha anunciado há muito tempo que não garantia a segurança do papa e que não empregaria os seus militares para esse fim, desaconselhando fortemente que se pusesse os pés em Bangui. Alertas de possíveis atentados se seguiram até a véspera da partida para a África.
Francisco, porém, queria estar lá, manifestando, com a sua presença física ainda mais do que com a sua palavra, a sua proximidade à população.
Assim, nas semanas anteriores à viagem, o comandante da Gendarmeria Vaticana, Domenico Giani, diretor da operação, e Mauro Garofalo, o responsável exterior da Comunidade de Santo Egídio que já trabalhou várias vezes em mediações de paz na África Central, iniciaram in loco uma negociação.
"Junto com o comissário Luca Cintia, da Gendarmeria, constituíram uma pequena força-tarefa de quatro a cinco pessoas, e tivemos vários encontros à noite nos bairros de maior risco de Bangui", explica Garofalo ao La Stampa.
"O problema – continua – era tanto o bairro muçulmano 'Km 5', quanto alguns trechos do percurso que o papa deveria fazer na capital, em zonas onde é significativa a presença dos anti-Balaka. Tentamos explicar que Francisco não vinha como político, mas como mensageiro de paz, e que a visita era uma oportunidade única para a reconciliação do país."
Abdoulaye Hissen e Maksim Mokom disseram que sim, e, embora os próprios milicianos estivessem divididos entre si também por causa do clima quente para as próximas eleições, eles aceitaram se comprometer com a trégua e respeitá-la.
A viagem do papa, incluindo a etapa na mesquita de Bangui, foi realizada sem problema algum: a acolhida foi muito calorosa. A Gendarmeria pôde contar com a colaboração dos militares da Minusca, as forças de paz da ONU comandados pelo general muçulmano de origem senegalesa Keita Balla, e dos homens da direção da segurança das Nações Unidas que chegaram de Nova York.
Fontes locais confirmam que, apesar da dificuldade, o pacto continua ativo por enquanto. A liberdade de movimento para os não muçulmanos no bairro "Km 5" melhorou. "Para os milicianos – explica ainda Garofalo – foi um modo para demonstrar a sua boa vontade."
Nessa quarta-feira, a agência Fides relançou as declarações recolhidas entre os missionários de Bangui: "A atmosfera que o Papa Francisco nos deixou está redimensionando muitas reações, que até recentemente teriam sido violentas e agora são mais pacatas. A vinda do papa deu novamente confiança para as pessoas, e isso permitiu a retomada de algumas atividades econômicas." Com a esperança de que o fio sutil da trégua não se rompa.
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África Central: a trégua do papa assinada por cristãos e muçulmanos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU