11 Setembro 2015
“Se uma pessoa é gay e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?” Assim o Papa Francisco se pronunciou há dois anos durante a conferência de imprensa no voo de retorno de sua primeira viagem à América Latina. Nisto se inspira “Quem sou eu para julgá-lo?”, título de uma nova coletânea de ensaios sobre o tema “A homossexualidade e a Igreja católica”. Stephan Goertz, teólogo moral de Mainz, explica nesta entrevista a razão da publicação do volume completo de aproximadamente 400 páginas...
A entrevista é de Joachim Heinz, publicada por Katholisch e reproduzida por Gionata, 07-09-2015. A tradução é de Benno Dischinger. O título original da entrevista, em alemão, é: “Nicht den Stab über andere brechen” [Não quebrar o bastão sobre os outros].
Stephan Goertz é, desde 2010, professor de teologia moral junto à Universidade de Mainz. O seu último livro “‘Wer bin ich, ihn zu verurteilen?’ – Homosexualitât und katholische Kirche“ (Quem sou eu para julgá-lo? – A homossexualidade e a Igreja católica) é o terceiro volume da série” Catolicismo em transição” publicado pela casa editora Herder de Friburgo.
Eis a entrevista.
Sr. Goertz, por que tantas religiões têm dificuldade em compreender a homossexualidade?
As religiões como o hebraísmo, o islã e o cristianismo tiveram origem numa época na qual não se possuíam os conhecimentos científicos sobre a sexualidade humana de que dispomos hoje. O que naquele tempo valia sem discussão foi identificado com a ordem divina: a Terra era o centro do universo, os homens e as mulheres eram iguais, todos os homens desejavam as mulheres, todas as mulheres desejavam os homens. E isto condicionou a moral sexual.
Quais foram as consequências?
A reprodução foi considerada o primeiro objetivo natural que Deus deu à sexualidade. E o comportamento sexual não devia por em perigo a ordem social. Neste sentido, não eram toleráveis as relações sexuais entre homens ou entre mulheres.
No Seu livro Você trata em particular do tema “A homossexualidade e a Igreja católica”. Não existiriam na Igreja de hoje temas mais importantes e mais urgentes com os quais ocupar-se?
Seria precisamente necessário perguntar à Igreja por que ainda coloca problemas sobre a homossexualidade. Seria inadmissível se a teologia não desse um parecer seu. Em primeiro lugar, a sexualidade é algo que diz respeito a todas as pessoas. E, em segundo lugar, em muitas partes do mundo ainda precisamos enfrentar em nível político a discriminação, a perseguição, a marginalização dos homossexuais. Seria um importante testemunho cristão, se a Igreja católica se pronunciasse abertamente contra esta discriminação.
Já há mais tempo a Igreja sustenta que os homossexuais não devem ser discriminados. Mas depois também há situações, tanto na Bíblia como na história, em que se condena a homossexualidade... Na nossa interpretação devemos sempre ter em conta a situação histórica particular dos autores dos textos bíblicos.
No livro do Levítico resulta de maneira evidente que os atos sexuais entre pessoas do mesmo sexo são definidos como “atrocidade” e mesmo “puníveis com a morte”. Neste contexto a sexualidade devia satisfazer o escopo primário de garantir a sobrevivência da espécie.
Obviamente, esta não é mais a nossa situação e após o Concílio esta não é mais a nossa moral sexual. Portanto, para responder a uma questão moral contemporânea não se podem utilizar certas citações extrapolando-as do contexto. Caso contrário, se faria uso integralista dos textos bíblicos.
Uma objeção: Você não faz a mesma coisa, quando escolhe aqueles pontos que correspondem à Sua visão das coisas?
Eu faço referência a uma posição teológica baseada na Bíblia: que Deus prometeu absolutamente a todos o seu amor, que no povo de Deus se devem superar as diferenças naturais e sociais; que não devemos condenar os outros. Penso que isso seja teologicamente mais importante do que as regras sobre a “natureza” de cada ato sexual. O problema é que hoje quem queira falar de homossexualidade e da Igreja, sem andar em escandescência ou cólera, se envolve imediatamente no fogo cruzado dos blogs filiados à direita ou dos críticos de esquerda contra a Igreja...
Através de certos ambientes, tem-se a impressão que não se possa fazer brecha com certos argumentos. A tarefa da teologia é aquela de examinar os argumentos e de perguntar o que requer hoje de nós a mensagem cristã. Devemos discernir com cuidado e enfrenta as questões com franqueza e naturalidade. E depois, esperamos que tal teologia seja, consequentemente, tomada em consideração também pelos bispos. No outono, o Sínodo dos Bispos tratará do tema do matrimônio e da Família.
Em seu ponto de vista, o que podemos esperar sobre a relação com os homossexuais na Igreja? E o que seria desejável?
É antes provável que será uma vez mais sublinhado que os homossexuais não devem ser discriminados e criminalizados e quem têm o seu lugar natural na Igreja. Em nível mundial isto é uma mensagem importante. Talvez, no final, se chegará também a deixar de condenar os atos homossexuais.
A meu ver, seria desejável que no interior da Igreja católica se procurasse um diálogo direto, ainda mais forte, com os homossexuais e não se discutisse por cima de suas cabeças, lançando juízos morais. Isto seria um sinal positivo. Poderia surgir a questão, que agora já está em fase de discussão em política: até que ponto se deve igualar o matrimônio de um casal gay ou lésbico. O que é diverso também pode ser definido “diverso”, mas merece receber atenção e respeito em igual medida.
Poder-se-ia perguntar se, do ponto de vista teológico, uma relação empenhada de amor homossexual, entendido como casa que crê no Deus de Israel e em Jesus, não possuiria um caráter sacramental. Os casais homossexuais poderiam, então, receber um reconhecimento da parte da Igreja.
Isso poderia ocorrer um dia, também com sinais exteriores, como a bênção dos casais homossexuais?
Embora eu não espere que isto constitua um tema do Sínodo, não vejo nenhum problema do ponto de vista teológico.
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A Igreja católica e as pessoas homossexuais. O teólogo alemão Goertz: “o que nos diz hoje a mensagem cristã” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU