30 Junho 2015
"Outro delegado no sínodo é o arcebispo de Madri, Carlos Osoro Sierra, que é apelidado o 'pequeno Francisco' por condutas e atenções aos pobres, mas que na verdade não é um progressista", escreve Andrea Gagliarducci, analista vaticano da Catholic News Agency, em artigo publicado pelo sítio ACI Stampa, 27-06-2015. A tradução é de Benno Dischinger.
Eis o artigo.
O fato de que os três parágrafos mais controversos da relatio Synodi, aqueles que tinham alcançado o consenso sinodal, tenham sido reinseridos assim como eram no instrumento Laboris do próximo Sínodo deixa compreender que o debate sobre aqueles termos não só não está concluído, mas será muito aceso. Foi um verdadeiro e próprio golpe de mão aquele com o qual a Secretaria Geral do Sínodo reintroduziu os temas quentes da pastoral para os divorciados redesposados, com a eventual possibilidade do acesso à comunhão, e a pastoral para os homossexuais.
O texto da relatio Synodi tinha vindo após um amplo e áspero debate. A maioria dos padres sinodais havia contestado o texto da relatio post disceptationem – o relatório que se tem na metade da discussão, antes dos círculos menores – e havia solicitado uma substancial reelaboração do texto. Se havia chegado a um compromisso, com um texto que recolhia muitas das propostas e críticas dos padres sinodais e que ao mesmo tempo mantinha alguns dos temas quentes.
Também naquele caso, todavia, o procedimento não andou em linha com a tradição do Sínodo. Cada ponto do relatório final é votado, e se considera que há consenso sinodal somente sobre aqueles pontos que obtêm uma maioria de dois terços. Mas, os três pontos em questão (o 52, o 53 e o 55), embora tendo obtido uma maioria, não tinham obtido a maioria dos dois terços. No final, numa tentativa de restabelecer a transparência da discussão, o Papa Francisco havia decidido publicar todos os pontos da relatio Synodi, e de tornar conhecido quantos tinham sido os votos. Isto, porém, deixou um espaço para que temas já amplamente discutidos pelos padres sinodais, e contestados, reentrassem pela janela do debate como eram.
O Cardeal Lorenzo Baldisseri, Secretário do Sínodo dos Bispos, sublinhou que “dada a novidade de um percurso sinodal em dois anjos, além de parágrafos completamente reescritos na base das indicações chegadas dos questionários, se inseriram parágrafos da relatio Synodi assim como eram, e foram assinalados em cursivo e com o número da relatio Synodi entre parênteses. “Um velho debate ainda não fechado, os parágrafos 52, 53 e 55 foram portanto reintroduzidos no Instrumentum Laboris, como parágrafos 122, 124 e 130. Nenhum dos três tinha recebido a maioria dos dois terços.
“Se refletiu – lê-se no parágrafo 52 (agora 122), que encontrava os padres em desacordo – sobre a possibilidade que os divorciados e redesposados acedam aos sacramentos da Penitência e da Eucaristia. Diversos Padres sinodais insistiram a favor da disciplina atual, em força da relação constitutiva entre a participação à Eucaristia e a comunhão com a Igreja e o seu ensinamento sobre o matrimônio indissolúvel”.
Outros se expressaram por uma acolhida não generalizada à mesa eucarística, em algumas situações particulares e sob condições bem precisas, sobretudo quando se trata de casos irreversíveis e ligados a obrigações morais com os filhos que seriam atingidos por sofrimentos injustos. O eventual acesso aos sacramentos deveria ser precedido por um caminho penitencial sob a responsabilidade do bispo diocesano.
Ainda é aprofundada a questão, tendo claro que “a imputabilidade e a responsabilidade de uma ação podem ser reduzidas ou anuladas” por diversos “fatores psíquicos ou mesmo sociais” (Catecismo da Igreja Católica, 1735). “E ainda, no parágrafo 53 (agora 124) se lê: “Alguns Padres sustentaram que as pessoas divorciadas e recasadas ou conviventes podem recorrer frutuosamente à comunhão espiritual. Outros Padres se perguntaram por que então não poderão aceder à comunhão sacramental.
É, portanto, solicitado um aprofundamento da temática em condições de fazer emergir a peculiaridade das duas formas e sua conexão com a teologia do matrimônio.” Vem a se perguntar, com efeito, se estes padres tenham jamais frequentado o catecismo. Enfim, o parágrafo 55 (agora 130) para famílias que “vivem a experiência de ter no seu interior pessoas com orientação homossexual. A esse respeito se levantou a interrogação sobre qual atenção pastoral seja oportuno diante desta situação referindo-se a quanto ensina a Igreja: “Não existe fundamento algum para assimilar ou estabelecer analogias, nem mesmo remotas, entre as uniões homossexuais e o desígnio de Deus sobre o matrimônio e a família”. Não obstante, os homens e as mulheres com tendências homossexuais devem ser acolhidos com respeito e delicadeza. “A seu respeito se evitará toda mácula de injusta discriminação” (Congregação para a Doutrina da Fé, Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais, 4).”
Este último parágrafo era aquele havia recebido menos consenso, porque os padres sinodais (também os de mais abertura) o haviam considerado vago.
Por que a reintrodução destes parágrafos?
Acontece que também o parágrafo 2, segundo as fontes da Sagrada Escritura, é aquele que tem obtido maior consenso sinodal e, como outros com maior consenso, é o texto. Mas este não explica o ingresso da janela dos parágrafos objeto de desacordo. Porque estes parágrafos têm sido reintroduzidos assim como são? Qual o método de trabalho levado em frente pela Secretaria do Sínodo?
A resposta a estas perguntas certamente dirá muito sobre como se desenvolverá a discussão no próximo sínodo dos bispos. Já houve um sínodo da mídia e um sínodo real, e ainda haverá. De uma parte, quantos premem por substanciais mudanças doutrinais, com o favor da mídia. Da outra parte, o verdadeiro debate sinodal, que tem visto a maioria dos bispos também sobre posições pastorais avançadas, mas sempre em linha com a tradição da Igreja. Este debate deveria se representar também no próximo Sínodo sobre a família, a menos que o Papa, com suas nomeações particulares, não vá se desbalançar pesadamente a favor de uma facção.
A composição do Sínodo até agora
Dando um olhar geral à composição do sínodo até agora, se pode notar que a maioria dos padres sinodais eleitos é a favor de manter a tradição da Igreja, embora com nuances diversas. Não se podem por certo adscrever aos “inovadores” os quatro delegados italianos: o Cardeal Angelo Bagnasco, o Cardeal Angelo Scola, os bispos Carlo Giulio Brambilla e Enrico Solmi. Mas, também na Conferência Episcopal Italiana, o debate tem sido vivo. O Cardeal Bagnasco precisou realmente chegar à votação de desempate, enquanto a escolha dos dois bispos também foi feita na base de certa moderação sobre os temas.
Os bispos polacos são os mais combativos. Defenderam a tradição no Sínodo de 2014 e o farão naquele que vem. O bispo de Varsóvia, Henryk Hoser, denunciou com força a “traição” dos ensinamentos de São João Paulo II sobre família e matrimônio, e o fará também durante este sínodo. E palavras igualmente fortes pronunciou o arcebispo Stanislaw Gadecki, presidente da Conferência Episcopal Polaca, que já no sínodo passado se tornou protagonista de críticas fortíssimas ao andamento do debate. Ambos estarão neste sínodo dos bispos.
É mais difícil a situação belga. Em 2014, era presidente da Conferência Episcopal André-Joseph Leonard, arcebispo de Bruxelas, um homem moderado, escolhido por Bento XVI, que procurou dar à Bélgica aquela virada pastoral da qual a nação, sacudida por tantos secularismos, tem necessidade.
Mas o arcebispo Leonard recém pediu demissão por que atingir o limite de idade (completou 75 anos), e ainda não se conhece o nome do sucessor e entrementes a Conferência Episcopal Belga foi em frente nomeando o próprio delegado no Sínodo: trata-se de Joan Bonny, de Antuérpia, que recentemente solicitou a plena aprovação da Igreja sobre o relacionamento entre homossexuais. As suas palavras são muito difusas, quase tanto quanto as daqueles dois bispos alemães, que com força se batem por “uma Igreja que não exclui”.
Os quatro delegados da Alemanha estão todos nestas posições, também por que estão todos sob o guarda-chuva do Cardeal Reinhard Marx, presidente da Conferência Epíscopal Alemã e entre os maiores defensores das inovações. Quando ficou claro que o debate do Sínodo de 2014 estava indo em outra direção, veio pessoalmente à Sala de Imprensa Vaticana defender a posição de abertura. E foi ele que encerrou a reunião na Universidade Gregoriana, na qual as conferências episcopais da Alemanha, França e Suíça discutiram sobre o debate no sínodo, de maneira reservadíssima, apenas para os poucos jornalistas convidados, não autorizados, todavia a dizer quem dissera o que. Os delegados alemães são: Heiner Koch, que foi recentemente nomeado arcebispo de Berlim; Herman Bode, de Osnabrueck e, obviamente, o Cardeal Marx.
Do encontro na Gregoriana também havia participado Jean Luc Brunin, o bispo de Le Havre, considerado na pátria por núpcias gay. Será delegado francês no Sínodo. Mas, a presença da França é balanceada: o outro delegado é o Cardeal André Vingt Trois, arcebispo de Paris, que de certo está com a tradição.
Depois há Mata, da qual provém Mario Grech, bispo de Gozo, mais moderado do que o bispo Bonny, mas também aberto ao aprofundamento da práxis ortodoxa para os divorciados e redesposados, abrindo deste modo caminho a uma possível ruptura com a tradição.
Capítulo Espanha. Estará presente o Cardeal Ricardo Blazquez Perez, arcebispo de Valladolid, que recebeu o maior número de votos em conferência episcopal. Não é um progressista, apoia o Caminho Neo-catecumenal, o movimento católico que mais do que outros defende a família tradicional (e dá testemunho disso a grande mobilização na Praça San Giovanni em Roma no passado dia 20 de junho).
Outro delegado no sínodo é o arcebispo de Madri, Carlos Osoro Sierra, que é apelidado o “pequeno Francisco” por condutas e atenções aos pobres, mas que na verdade não é um progressista.
Também está com a tradição o Cardeal Willelm Jacobus Eijk, arcebispo de Utrecht e representante da Holanda no Sínodo. Um médico em sua “vida precedente”, Eijk fala desses temas dos anos Oitenta, desenvolvendo posições inovadoras e importantes também sobre temas sensíveis como eutanásia e aborto. E depois se descobre que também as conferências episcopais que parecem mais progressistas na realidade querem manter o ensinamento tradicional da Igreja.
Um exemplo é a Nova Zelândia. Ali os leigos assumiram um papel preponderante, os sacerdotes são considerados uma espécie de “oficiais pastorais”, e o novo cardeal John Atcherley Dew, arcebispo de Wellington, está entre quantos defenderam uma “revolução” e que no sínodo de 2014 apoiou as teses progressistas. Mas, não estará no sínodo de 2015, porque não obteve a maioria dos votos de sua conferência episcopal.
Como não estará no Sínodo o outro neo-cardeal Fernando Sturla, salesiano, arcebispo de Montevideo, Uruguai, também ele conhecido por suas posições abertas, especialmente em termos de casais homossexuais. Os bispos do Uruguai preferiram a ele Jaime Fuentes Martin, bispo de Minas e membro do Opus Dei.
Não se pode sequer dizer que a patrulha dos Africanos, que recentemente se reuniu em Accra e que tem um ponto de referência no cardeal de Cúria Robert Sarah, prefeito da Congregação para o Culto Divino, se baterá para manter a tradição. Deles chegaram ao sínodo passado aqueles estímulos sobre a colonização ideológica e a imposição da ideologia dos gêneros em troca de ajudas econômicas, que depois também entraram na encíclica “Louvado Seja”.
E o Cardeal sul-africano Wilfred Fox Napier, que é também um dos autores da reforma levada em frente pelo Papa Francisco e é membro do Conselho da Economia, e que tomou posições fortíssimas contra o Cardeal Walter Kasper, sublinhando que este não é o “teólogo do Papa”, como muitos da mídia o definem.
O futuro
Enquanto algumas conferências episcopais ainda devem definir os seus delegados, se esperam os nomes do Papa Francisco. Pensa-se que o Papa inserirá entre os delegados quantos participaram do Sínodo extraordinário de 2014 e que depois foram eleitos por suas Conferências Episcopais, para manter uma continuidade do debate.
Entre os superiores gerais já se encontra o geral dos Jesuítas, Adolfo Nicolás, que no sínodo passado havia defendido uma nova pastoral. Provavelmente, neste balanceamento espera estar representada a Secretaria Geral do Sínodo, que decidiu inserir os temas controversos do debate. No entanto, a discussão deveria ir além, deveria apontar e expressar a beleza da família, e por em luz o tema do amor, mais do que aquele da sexualidade. Era também o limite da Conferência na Gregoriana, que falava de teologia do amor, mas sublinhando, na realidade, o tema da sexualidade. Conseguirá o debate do sínodo ir além?
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Como será a discussão no próximo Sínodo dos bispos? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU