10 Outubro 2014
Os bispos reunidos no Vaticano para discutir questões da vida familiar têm que reaprender a fazer teologia, a fim de responder às preocupações contemporâneas, disse um arcebispo participante da reunião na quinta-feira, quarto dia do Sínodo.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada no síttio National Catholic Reporter, 09-10-2014. A tradução é de Claudia Sbardelotto.
Ao contrário do passado, quando os bispos ou teólogos deduziam a teologia a partir de noções gerais, às vezes idealizadas, de Deus ou da humanidade, os prelados no Sínodo dos Bispos sobre a família estão usando o raciocínio indutivo em vez disso, examinando a teologia na realidade das famílias de hoje, disse o arcebispo canadense Paul-André Durocher.
"O que está acontecendo dentro do Sínodo é que estamos vendo uma maneira mais indutiva de refletir, a partir da situação real das pessoas e tentando descobrir o que está acontecendo aqui", disse Durocher, que lidera a Conferência dos Bispos Católicos do Canadá.
Os prelados, disse o arcebispo, estão "verificando que a experiência vivida pelas pessoas é também uma fonte teológica - o que chamamos de uma fonte teológica, um lugar de reflexão teológica".
"Eu acho que nós estamos aprendendo a usar o método de estudo de caso da Harvard ao refletirmos teologicamente sobre a vida das pessoas", continuou o arcebispo, que também preside a arquidiocese de Gatineau, em Quebec.
"E nós apenas estamos, de certa forma, começando a aprender a fazer isso, como líderes da Igreja", disse ele. "E isso vai levar tempo para nós, para aprender a fazer isso e, em conjunto, chegar - enquanto refletimos sobre isso - a encontrar qual é o caminho que Deus está mostrando".
Durocher falou durante uma coletiva de imprensa, no Vaticano, na quinta-feira, durante o Sínodo.
Suas reflexões, que vieram no final do briefing de 70 minutos, pode sugerir uma mudança na forma como os bispos desenvolvem o pensamento teológico, que, no passado, normalmente seguia métodos dedutivos de autores como Aristóteles e Santo Tomás de Aquino sobre métodos indutivos usados em sistemas pastorais, ou mesmo teológicos.
Ao contrário de sínodos anteriores, o Vaticano não está liberando textos ou resumos de conversas dos prelados, mas em vez disso está fornecendo coletivas de imprensa a cada dia com três porta-vozes que estão participando do Sínodo e resumindo os eventos. São eles: o porta-voz oficial do Vaticano, o padre jesuíta Federico Lombardi, em italiano; o padre arquidiocesano Manuel Dorantes, de Chicago, em espanhol; e Rosica, em inglês.
O cardeal Gerhard Müller, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, criticou essa prática em uma entrevista na televisão na quarta-feira.
"Essas intervenções devem ser publicadas como antes", disse Müller. "Eu acho que todos os cristãos têm o direito de ser informados sobre as intervenções de seus bispos".
Juntando-se aos porta-vozes para o briefing da quinta-feira estavam Durocher e o cardeal Francesco Coccopalmerio, presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos e um membro de uma nova comissão criada pelo Papa Francisco no mês passado para estudar possíveis mudanças nos processos e leis que cercam o sacramento do matrimônio da Igreja.
Falando sobre o trabalho dessa comissão, Coccopalmerio falou longamente na quinta-feira sobre um assunto que tem dominado a cobertura noticiosa do Sínodo: possíveis mudanças na proibição da Igreja sobre dar a comunhão aos divorciados que voltaram a casar, que não possam ou não queiram obter a nulidade dos seus primeiros casamentos.
Em um exemplo, Coccopalmerio disse que um membro sínodo havia mencionado a maneira que algumas igrejas ortodoxas tratam esses segundos casamentos, permitindo que esses casamentos sejam abençoados, mas que eles não são considerado de valor sacramental igual ao primeiro casamento.
"Acredito que esse caminho seria muito difícil, mas eu repito, o Sínodo levou-o em consideração", disse Coccopalmerio.
Com relação ao trabalho da nova comissão, Coccopalmerio também disse que havia três principais formas que ele e outros estavam considerando a possibilidade de simplificar o processo de nulidade, o que às vezes pode ser muito demorado e caro.
Uma dessas formas, segundo ele, seria a de permitir um novo processo administrativo de nulidade, onde o poder de decretar o casamento nulo seria transferido do Vaticano para o bispo local.
Tal situação, disse Coccopalmerio, poderia ser usada quando há uma instância de um casamento que é "certamente nulo", mas não há documentos legais para mostrar esse fato.
"Neste caso, se sabemos que as pessoas são credíveis, honestas", então um bispo poderia decretar: "Eu, bispo desta diocese, posso dizer que este casamento é nulo", disse o cardeal.
"Temos que dar respostas concretas às pessoas que estão em situações de urgência ou gravidade, como nos falou o Papa Francisco", Coccopalmerio disse em outro ponto, acrescentando que, em casos urgentes, a Igreja não deve exigir que as pessoas deixem as suas segundas núpcias, como condição de receber a comunhão.
Sobre a questão do divórcio e novo casamento, Durocher ressaltou que a maioria dos prelados do Sínodo não teve a oportunidade de falar sobre o assunto.
"O posicionamento dos padres sinodais sobre esse assunto é uma incógnita", disse ele.
"Este Sínodo pretende lançar as bases para uma discussão que vai durar um ano e que vai continuar, e vamos ver o fruto dessa discussão no próximo ano", continuou ele, referindo-se a um segundo sínodo que se realizará sobre o tema da vida familiar em 2015.
Durocher também disse que "não era uma forma adequada" de falar do assunto referindo-se a alguns prelados como aqueles que querem misericórdia para os que estão divorciados e em um novo casamento, enquanto referindo-se a outros como aqueles que querem buscar a justiça.
"O que estamos tentando fazer é descobrir qual é a vontade de Deus, e essa vontade é uma vontade de justiça e de misericórdia", disse Durocher.
"Há discussões sobre isso, e isso é bastante normal", ele continuou. "E eu acho que é saudável para a Igreja ter essa discussão. E é uma discussão que não vai acabar com este Sínodo. Ela vai continuar".
Para dar uma visão geral das últimas discussões entre os membros do Sínodo, Rosica disse na quinta-feira que as conversas poderiam ser descritas "como sendo animadas, apaixonadas, fraternas, para 'colocar as cartas na mesa'".
Uma das áreas de interesse manifestadas pelos prelados, disse Rosica, foi o cuidado das crianças.
O padre citou uma passagem de uma observação de um bispo cujo nome não foi citado: "As crianças são sempre um novo campo em que a semente da palavra tem que ser plantada novamente".
"Nós que falamos pela Igreja viemos a entender que temos que ser essa semente", continuou o bispo. "Sempre e simplesmente semeadores da semente ... Não devemos remover o que vemos ser ervas daninhas".
Cerca de 190 prelados estão participando do sínodo e serão capazes de votar nas discussões. Outras 60 pessoas, principalmente leigas, foram selecionadas para outras funções e podem contribuir para as discussões, mas não têm direito a voto.
Após uma semana de reuniões, os bispos vão criar um rascunho de um documento de trabalho para o sínodo que irá, então, ser trabalhado durante a segunda semana de reuniões, resultando em um documento final do Sínodo, que será entregue ao papa.
Entre aqueles que ofereceram intervenções pré-escritas durante as sessões da tarde de quarta-feira foram: o cardeal húngaro Péter Erdö, relator geral do Sínodo; o arcebispo japonêss Peter Okada; o arcebispo do Cazaquistão,Tomash Peta; arcebispo Gabriel Mbilingi, presidente da Conferências Episcopais da África e Madagascar; o cardeal brasileiro Raymundo Assis; cardeal Raymond Burke, dos Estados Unidos; e o cardeal indiano George Alencherry da Igreja Católica Siro-Malabar.
Ofereceram intervenções "livres" na quarta-feira: cardeal Müller; cardeal Timothy Dolan, dos Estados Unidos; o cardeal inglês Vincent Nichols; arcebispo Joseph Kurtz, dos Estados Unidos; arcebispo Diarmuid Martin, da Irlanda; o cardeal alemão Walter Kasper; e o cardeal sul-africano Wilfrid Napier.
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Sínodo: bispos repensam o desenvolvimento da teologia e o processo de nulidade - Instituto Humanitas Unisinos - IHU