Por: André | 09 Junho 2014
As respostas dos bispos japoneses e centroeuropeus ao questionário do Sínodo sobre as Famílias mostram a rendição dos católicos ao “pensamento único” dominante. Mas também a incapacidade dos seus pastores.
Fonte: http://bit.ly/1om4PQE |
A reportagem é de Sandro Magister e publicada no sítio Chiesa.it, 06-06-2014. A tradução é de André Langer.
Até o momento, são seis as Conferências Episcopais que, violando o pedido de confidencialidade, tornaram públicas as respostas às 39 perguntas do questionário preparatório para o próximo Sínodo dos Bispos, convocado sobre o tema da família.
Como se pode observar, cinco das seis Conferências Episcopais pertencem à área geográfica do centro europeu (Alemanha, Áustria, Suíça, Bélgica e França), a que colocou em marcha as inovações do Concílio Vaticano II, mas, sucessivamente, foi também a mais marcada pelo fenômeno da secularização.
Hoje, precisamente desta área vêm as pressões mais fortes para uma mudança da doutrina e da práxis pastoral em matéria de matrimônio, sobretudo com o pedido de dar a comunhão aos divorciados recasados.
Sabe-se que o Papa Francisco não gosta da insistência nesta única questão da comunhão aos divorciados recasados. Disse-o respondendo aos jornalistas durante a viagem de volta a Roma da Terra Santa. Para ele, a questão é “muito, muito mais ampla” e é preciso enfrentá-la na sua totalidade. Ela diz respeito à família enquanto tal, que está em crise em todas as partes, como ele mesmo disse: “Está em crise mundial”.
As respostas dos bispos japoneses ao questionário pré-sinodal confirmam clamorosamente esta convicção do Papa.
Mas, há mais. Confirmam que o declínio da visão cristã da família não é apenas fruto do “pensamento único”, mas também da rendição da Igreja a este pensamento.
Os bispos japoneses reconhecem-no com candura: “No Japão, a Igreja não ficou refém da obsessão pelas questões sexuais”.
Nesta e em outras afirmações admite-se a ampla renúncia, há décadas, de propor a novidade cristã em terrenos cruciais como são os da vida e da família.
No Japão, os católicos autóctones são apenas cerca de 440.000, 0,35% de uma população que nunca foi cristianizada em seu conjunto. Mas, pela descrição que os bispos fazem, obtém-se um perfil de Igreja que não é o da “minoria criativa” em terra de missão. É, antes, uma Igreja dedicada à gestão e muito próxima do perfil médio desse catolicismo residual, fortemente secularizado, típico da Europa Central.
Deste ponto de vista, os fatos parecem contradizer também a tese defendida por Jorge Mario Bergoglio de uma Igreja exageradamente preocupada, para não dizer “obsessiva”, durante os Pontificados de João Paulo II e Bento XVI, com as questões do aborto, do casamento homossexual e dos anticoncepcionais.
Efetivamente, segundo as respostas publicadas ao questionário pré-sinodal, não parece que de modo algum na Europa Central ou no Japão a Evangelium Vitae ou os “princípios não negociáveis” sejam o pilar da pastoral da Igreja das últimas décadas, ao nível dos bispos, sacerdotes e fiéis, nem que em seu lugar a Igreja tenha realizado um impulso missionário centrado “no fundamental” da proposta evangélica.
Não aconteceu nem uma coisa nem outra, como prova a antologia – reproduzida abaixo – das respostas dos bispos do Japão ao questionário pré-sinodal.
O documento dos bispos japoneses – assinado por Peter Takeo Okada, arcebispo de Tóquio e presidente da Conferência Episcopal – é muito interessante também porque é fruto de uma consulta restrita apenas aos bispos e aos superiores maiores das ordens religiosas masculinas e femininas.
É uma espécie de confissão explícita de rendição por parte de quem têm a missão de dirigir essa pequena Igreja entre os modernos “pagãos”.
Passagens escolhidas de: Respostas ao questionário sobre a família - Conferência dos Bispos Católicos do Japão
Muitas vezes, as pessoas vivem juntas sem se casar... O aborto e os anticoncepcionais são uma prática comum e muitos fetos são eliminados antes do nascimento... Estes fenômenos e estas tendências nos casamentos valem também para os católicos...
Em sua maioria, as pessoas não conhecem os ensinamentos [da Bíblia] e os documentos [da Igreja sobre a família]. Na melhor das hipóteses, têm um conhecimento fragmentado dos mesmos, que deriva dos comentários feitos pelos sacerdotes, os quais podem não estar bem informados...
Em geral, as pessoas conhecem apenas as proibições concernentes ao aborto, ao controle artificial da natalidade, ao divórcio e a um novo casamento. Costumam ser influenciados pelos usos e costumes da sociedade mais que por estes ensinamentos, sobretudo no que diz respeito ao controle da natalidade... Também entre os católicos muitos criticam a posição da Igreja em matéria de métodos anticoncepcionais como o preservativo.
No que diz respeito à educação para a fé, devemos reconhecer que em nível nacional, diocesano e paroquial, não existem programas pastorais [para a família]. Obviamente, por parte das dioceses, paróquias, sacerdotes e paróquias há atividades dedicadas a isto, mas são fruto de esforços individuais...
Muitos católicos também não se distinguem da opinião comum em questões como o divórcio e um novo casamento consentido pela lei civil, o diagnóstico pré-natal, o aborto, etc. e também criticam a Igreja por seu ensinamento sobre a concepção e o nascimento dos filhos... Muitos consideram que os ensinamentos sobre o divórcio e a separação violam a sabedoria tradicional...
No Japão, o casamento entre pessoas não batizadas e não crentes que recorrem aos ritos da Igreja é normal na atividade da Igreja há muitos anos, com a aprovação da Santa Sé. A práxis habitual é solicitar, antes do casamento, alguma formação baseada na visão que a Igreja tem do casamento. Além disso, não deve haver impedimentos canônicos ao matrimônio (como o divórcio), embora alguns pastores individualmente tendam, em geral, a ser indulgentes...
A preparação para o matrimônio muda geralmente de contexto para contexto: em alguns lugares existem programas regulares, mas em muitas situações depende do interesse e da habilidade do pastor. No Japão, foram introduzidos o encontro matrimonial e o encontro para noivos, que durante um certo tempo suscitaram muito interesse, mas agora praticamente desapareceram...
Em uma resposta ao questionário se lê: “Quase todos os casais que se uniram em matrimônio nos últimos anos começaram a viver juntos vários meses antes do casamento. Ninguém pensava que isto estivesse em contradição com os ensinamentos da Igreja”...
Na elaboração de uma orientação pastoral talvez seja importante recordar que na única vez nos Evangelhos que Jesus encontra claramente uma pessoa em situação de convivência fora do casamento (a samaritana no poço) não centra a atenção sobre este aspecto. Ao contrário, trata com muito respeito a mulher e a converte em missionária...
A maior parte das pessoas divorciadas e recasadas é aparentemente indiferente... Elas decidem receber ou não os sacramentos e se comportam com base na própria decisão... Há pessoas que não sabem que não podem receber a comunhão se se casaram novamente depois do divórcio. Também entre as pessoas que o sabem, algumas recebem a comunhão e há sacerdotes que não dizem nada, embora conheçam sua situação...
Não existe um ministério específico [para os divorciados recasados]. O clero responde da maneira mais pastoral possível, mas parece que o Povo de Deus ultrapassou a necessidade deste ministério. As pessoas tomam suas próprias decisões e se comportam em base às mesmas...
No Japão não existe um reconhecimento legislativo das uniões de pessoas do mesmo sexo... O Estado não impulsiona estes casamentos e a Igreja não elaborou uma posição concreta sobre a possibilidade de uma eventual mudança...
Hoje, os católicos ou são indiferentes em relação ao ensinamento da Igreja [sobre a regulação dos nascimentos] ou não a conhecem. Muitos católicos no Japão nunca ouviram falar sobre o controle artificial dos nascimentos nos cursos de noivos, a maior parte dos sacerdotes não o destaca de maneira especial... Em geral, não se conhece e não se ensina a doutrina moral da Humanae Vitae e quando se conhece, não é seguida...
A Igreja no Japão não sofre da obsessão pelas questões sexuais... Afora o aborto, parece que não há muitos sentimentos de culpa em relação à anticoncepção...
Embora seja importante continuar destacando a importância da família e da vida, a Igreja, mais que se limitar a julgar e criticar, deve apresentar também um rosto que cura, apoia e anima a quem não pode atingir o ideal...
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No Japão, assim como às margens do Reno. A rendição da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU