07 Janeiro 2014
Três Papas precederam ao Papa Francisco na Terra Santa (Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI), mas ele escolheu como farol para a sua peregrinação no fim de maio (24 a 26) papa João Batista Montini.
A reportagem é de Paolo Rodari e publicada pelo jornal La Repubblica, 06-01-2014. A tradução é da IHU On-Line.
A mesma duração da viagem de cinquenta anos atrás, o mesmo 'clou', ou seja, o encontro com o patriarca de Constantinopla que sanou séculos de dissídios e incompreensões. A única exceção é que Jorge Mario Bergoglio não visitará Nazaré.
O sentido da viagem está nas palavras pronunciadas ontem, dia 05-10-2104, no Angelus: "Encontrarei todos os representantes das Igrejas cristãs de Jerusalém, juntamente com o Patriarca Bartolomeu de Constantinopla". É como dizer que não será uma viagem política, mas estritamente religiosa e humanitária.
O objetivo é pacificar as confissões cristãs que ainda se densentendem sobre o controle dos lugares santos. Para isto não são previstas nem uma visita ao museu do Holocausto nem celebrações israelo-palestinenses. Trata-se de relançar com força o ecumenismo e repropor a emergência Síria.
Em Amã, no vale do Jordão onde Jesus foi batizado, o Papa sentará à mesa com prófugos sírios. Ainda que não foi possível inserir uma etapa em Damasco (diz-se que Francisco desejava passar por Damasco), o centro das preocupações papais está aí no coração do Oriente Médio em chamas e que sofre, ao mesmo tempo, perseguições e divisões religiosas.
A viagem à Terra Santa em janeiro de 1964, a primeira de um Papa da época moderna fora da Itália, e o encontro com o Patriarca Atenágoras, representaram para Paulo VI, que utilizou pessoalmente esta expressão, "foi um golpe de arado que revirou um terreno duro e inerte" (No original italiano a expressão é "un colpo d'aratro, che ha smosso un terreno ormai indurito ed inerte»". Nota da IHU On-Line),
Palavras que foram, não por acaso, recordadas num editorial do diretor do jornal L'Osservatore Romano, Giovanni Maria Vian.
"Nos abraçamos uma primeira vez, depois uma segunda e de novo e de novo. Como dois irmãos que se encontram depois de uma longa separação", comentou Atenágoras.
"Vocês todos compreenderam que a minha viagem não foi somente um fato singular e espiritual: tornou-se um acontecimento que pode ter grande importância histórica, o ponto de partida de novos, grandes acontecimentos, que podem ser altamente benéficos para a Igreja e a Humanidade", disse Paulo VI.
O acontecimento histórico sucessivo foi a remoção das excomunhões recíprocas, no dia 7 de dezembro de 1965, simultaneamente em Roma e em al Fanar, o Vaticano ortodoxo em Istambul, a antiga Constantinopla. Punha-se fim, desta maneira, a dez séculos de separação e de penosos dissabores entre os cristãos.
Desde então, muitos gestos na mesma direção foram tomados pelos sucessoers dos protagonistas de então, mas as diferenças teológicas que emergiram no início do segundo milênio permanecem, principalmente sobre o papel do sucessor de Pedro.
"A mim cabe, como bispo de Roma, permanecer aberto às sugestões que vão na direção de um exercício do meu ministério que o torne fiel ao significado que Cristo quis lhe dar e às necessidades atuais da evangelização", admitiu Francisco na Exortação Apostólica "Evangelii gaudium", recordando que "também o papado e as estruturas centrais da Igreja universal necessitam de ouvir o apelo à conversão pastoral".
Uma delegação da Comunidade de Santo Egídio ontem, dia 05-01-2014, já estava em Jerusalém para encontrar os responsáveis das diversas comunidades religiosas presentes.
As comunidades hebraicas italianas se alegram com a viagem de um Papa que, como explica o rabino Di Segni, já deu "muitos sinais". Entre estes, "a carta enviada ao jornal La Repubblica em resposta às solicitações de Eugenio Scalfari onde emerge com clareza, na visão do Papa, o papel de testemunho do povo hebraico como fonte de inspiração para todo o universo cristão".
Aquele texto - explica Di Segni - "assinalou um considerável passo adiante nas relações entre hebreus e cristãos".
Nota da IHU On-Line:
1.- No dia 5 de janeiro de 1964, às 21h30min, na Delegação apostólica de Jerusalém, houve o primeiro encontro de Paulo VI com Atenágoras. A conversa foi publicada por Daniel Ange (Paul VI, um regard prophétique", 1979) e republicado recentemente por Alfredo Pizzuto ("Paolo VI in Terra Santa", 2012). A conversa era para ter sido reservada, mas foi registrada pelos microfones da Rai que por um descuido não foram desligados.
Eis o início da conversa:
Paulo VI:
Exprimo-lhe toda a minha alegria, toda a minha emoção. Penso que este é realmente um momento que vivemos na presença de Deus.
Atenágoras:
Na presença de Deus. Repito: na presença de Deus.
Paulo VI:
E eu não tenho outro pensamento enquanto falo com o senhor, que aquele de falar com Deus.
Atenágoras:
Estou profundamente comovido, Santidade. As lágrimas me vêm aos olhos.
Paulo VI:
Como este é um verdadeiro momento de Deus, devemos vivê-lo com toda a intensidade, toda a retidão e todo o desejo...
Atenágoras:
... de andar avante...
Paulo VI:
... de fazer avançar os caminhos de Deus. Vossa Santidade tem alguma indicação, algum desejo que posso realizar?
Atenágoras:
Temos o mesmo desejo. Quando tomei conhecimento pelos jornais que o senhor decidira visitar este País, me veio imediatamente a ideia de expressar o desejo de lhe encontrar aqui e estavo certo que teria o consentimento de Vossa Santidade...
Paulo VI:
... positivo...
Atenágoras:
... positivo, porque tenho confiança em Vossa Santidade. Eu lhe vejo, sem adulações, nos Atos dos Apóstolos. Vejo-lhe nas cartas de São Paulo de quem o senhor leva o nome; vejo-lhe aqui, sim, lhe vejo...
Paulo VI:
Falo-lhe como irmão: saiba que eu tenho a mesma confiança no senhor.
A íntegra da conversa, em italiano, pode ser lida aqui.
2.- Para compreender melhor a histórica viagem de Paulo VI à Terra Santa, em janeiro de 1964, veja a bela reportagem, de 38 minutos de duração, em italiano, produzida pela RAI. Para ver o vídeo, clique aqui.
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O Papa na Terra Santa nas pegadas de Paulo VI - Instituto Humanitas Unisinos - IHU