15 Mai 2011
Toowoomba, cidade de 95 mil habitantes ao leste da Austrália (a 132 mil km de Brisbane) tinha uma certa fama como ponto de chegada da Dingo Fence, a barreira dos 5.320 km destinada a proteger as ovelhas dos dingos, os temidos cães selvagens. Desde o dia 2 de maio, é a cidade cujo bispo católico, Dom William Morris (67 anos), foi demitido por Roma.
A reportagem é de Philippe Clanché, publicada na revista Témoignage Chrétien, 11-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Decisões semelhantes são geralmente o resultado de uma história de escândalos sexuais e financeiros. Mas não neste caso. O bispo dessa diocese de 130 mil habitantes, dos quais 28% são católicos, sofre, assim como outros, com a falta de padres: são só cerca de 50. Em uma carta pastoral de 2006, ele havia declarado estar disposto, se a lei da Igreja evoluísse, a ordenar mulheres e homens casados, ou fazer com que padres anglicanos e luteranos celebrassem em sua diocese.
Outros responsáveis eclesiásticos, há muito tempo, pediram que o debate sobre esses temas seja reaberto. Então, por que Dom Morris se encontra novamente exposto ao ridículo? O problema das ordenações parece ser a gota que transbordou o copo para um bispo sob observação há anos por parte de Roma.
Penitência
Em 1998, houve um encontro em Roma entre altos representantes da Santa Sé, Joseph Ratzinger à frente, e os bispos australianos, incluindo William Morris, no cargo desde 1993. O documento final indicava, entre outras recomendações, que "deve ser eliminado o uso ilícito da administração coletiva do sacramento da penitência".
Alguns bispos resistiram, deixando, por exemplo, seus padres livres para celebrar esse sacramento de acordo com o seu juízo. E as celebrações penitenciais coletivas continuaram na diocese de Toowoomba, já que o bispo se baseava em uma disposição do direito canônico que permitia exceções ("Se não houver muitos confessores disponíveis", Cânon 961).
Com a carta de 2006, o Vaticano entrou em ação. Dom Morris se recusou a ir a Roma em uma primeira convocação oficial, sob o pretexto de ocupações pastorais. Um bispo norte-americano, Charles Chaput, conservador e inimigo jurado de Obama, foi então nomeado visitador apostólico. Passou três dias na diocese australiana em abril de 2007 e apresentou o seu relatório ao Vaticano no mês seguinte.
Gravata ao invés de clergyman
As pessoas entrevistadas pelo visitador haviam criticado o prelado pelo seu estilo de se vestir: o fato de ter abandonado o colarinho romano pela gravata e o fato de aparecer em algumas fotos com uma "atitude de palhaço".
Mas deixemos de lado o debate teológico. Até um programa de educação sexual nas escolas católicas da diocese de Toowoomba teria tornado mais pesada a ficha criminal de Dom Morris. Naquele ano, o bispo rebelde recebeu um primeiro convite para renunciar. A partir desse momento, ele poderia apenas adiar o prazo, em uma batalha desigual com a Congregação para os Bispos.
Dom Morris lamenta hoje não ter podido se defender, não ter tido acesso ao relatório que lhe dizia respeito. De fato, a lei da Igreja não prevê um processo com relação aos bispos aos quais o papa retira o cargo. "Constatei, e outros comigo, que Roma controla os bispos com o medo. Se você fizer perguntas ou falar sobre assuntos que Roma declara fechados, você vai ser rapidamente censurado e será apresentado como incapaz para dirigir uma diocese", escreveu ele aos seus padres, o bispo demitido que se recusa a reconhecer as suas falhas. Ele se considera vítima de uma campanha de difamação orquestrada pelos seus fiéis tradicionalistas.
E essa "polícia do Templo", termo usado pela imprensa local, desfrutou ouvidos atentos por parte de Roma. A notícia da remoção de Dom Morris causou tumultos na Austrália, e um site especializado decidiu não divulgar mais comentários. No dia seguinte à remoção, 500 fiéis manifestaram-se em solidariedade ao seu bispo.
"Ele era um líder e um visionário", disse um jovem de 23 anos. Como em Evreux, em 1995, após a remoção de Jacques Gaillot, a ferida vai demorar algum tempo para cicatrizar. Se é que vai fechar.
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Dom Morris, um Gaillot australiano? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU