03 Março 2018
A Igreja em Roraima tem sido a fonte de solidariedade aos milhares de venezuelanos que ultrapassam a fronteira do país fugindo da situação delicada por que passa o país, decorrente da crise econômica, política e institucional. Junto com entidades da sociedade civil e pessoas de boa-vontade tocadas pelas necessidades humanas dos migrantes, somam-se forças para dar abrigo, alimentação e assistência.
A reportagem é publicada por CNBB, 02-03-2018.
O bispo de Roraima, dom Mário Antônio da Silva, fala em entrevista, da situação atual dos venezuelanos que estão em Pacaraima (RR) e Boa Vista (RR), abrigados em ginásios, em quitinetes alugadas ou em situação de rua. Na última semana, durante a reunião do Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o presidente do regional Norte 1 da entidade falou aos bispos e solicitou apoio de toda a Igreja no Brasil para continuar implementando as ações que já ocorrem em paróquias e também por iniciativa do Centro de Migrações e Direitos Humanos da diocese.
O bispo explica que os recursos financeiros são o maior desafio, uma vez que, embora busquem projetos que sustentem tantas ações, muitas vezes falta a possibilidade de concretizar os projetos, por falta de recursos.
Como está a situação dos venezuelanos que chegam em Roraima?
Atualmente, em Roraima, estima-se a presença de cerca de 50.000 venezuelanos. Destes, anexamos os dados, do ano de 2017, disponibilizados pela Polícia Federal, sobre os registros de pedidos de Residência Temporária e Solicitações de Refúgio.
Migrantes venezuelanos dormem ao relento na
Praça Simón Bolívar em Boa Vista (RR)
(Foto: Amazônia Real/Yolanda Mêne)
A realidade dos venezuelanos, principalmente em Pacaraima e Boa Vista, se distingue em cerca de 1500 em situação de abrigamento, realizado em acomodações provisórias, em 2 ginásios poliesportivos, sendo apenas 1 deles pouco mais estruturado para o atendimento dos indígenas. O ginásio que atende os não-indígenas está sem estrutura e sem muitas condições de ser considerado Abrigo, falta água, alimentação e acomodação segura para os venezuelanos. Em Pacaraima, que conta somente com um abrigo exclusivo para os indígenas, a situação também não é muito diferente, cabendo à sociedade civil e à Igreja a manutenção alimentar das pessoas abrigadas.
Fora estes que estão, bem ou mal, abrigados, existe uma multidão de pessoas que alugam pequenas casas (quitinetes) de quarto, sala e cozinha, onde ficam entre 15 e 20 pessoas, que se alternam para o descanso, pois a casa não cabe todos ao mesmo tempo. Outras vezes, mulheres e crianças ficam dentro da casa e homens dormem fora. Outra realidade é daqueles que se encontram em situação de rua. São famílias inteiras que chegam diariamente à cidade e não encontram nenhum abrigo, nenhuma referência, nenhum amparo. Vivem, exclusivamente, de bicos e da generosidade de pessoas que vão às praças e sinais de trânsito para lhes fornecer alimento, alguma roupa, itens de higiene, etc.
A Igreja tem sido porto-seguro para estes migrantes em busca de refúgio. Quais ações tem acontecido no âmbito da diocese?
Em Pacaraima, a paróquia Sagrado Coração, sob a coordenação de padre Jesus Lopez Fernandez de Bobadilla, é referência no atendimento aos imigrantes venezuelanos. Oferece café da manhã para cerca de 800 pessoas, de segunda a sábado. Também abriu o Centro de Pastoral dos Imigrantes, que faz o atendimento diário às pessoas que chegam, distribuindo cestas básicas, ajudando na documentação e fazendo os encaminhamentos necessários. Aos domingos, celebração em espanhol para o atendimento religioso dos imigrantes.
Em Boa Vista temos os mais diversos atendimentos, como descrito a seguir. Na paróquia Nossa Senhora da Consolata são oferecidas cerca de 300 refeições, 4 vezes na semana, além de fazer o acolhimento e encaminhamento para diversas necessidades. A partir de março, a paróquia cederá uma sala para o trabalho com as mulheres imigrantes, que será feito pela equipe das Irmãs Scalabrinianas.
Indígenas warao da Venezuela nas ruas de Boa Vista
(Foto: Amazônia Real/Yolanda Simone)
A paróquia São Francisco e a Área Missionária São Raimundo Nonato estão iniciando turmas para aulas de Português para imigrantes. Na Área Missionária ainda se tem o desafio de equipar as salas para melhor encaminhamento dos estudos. Diversas ações são realizadas por outras Paróquias, como missas em Espanhol, distribuição de alimentos, cestas básicas, roupas e remédios.
A Pastoral Universitária realiza trabalhos de cooperação com diversas entidades, desde aulas de Português à incidência política e social. Serviço Jesuíta aos Migrantes e Refugiados e o Projeto Fé e Alegria estão iniciando seus trabalhos na Diaconia São Bento.
E o Centro de Migrações e Direitos Humanos, como funciona esta iniciativa?
O Centro de Migrações e Direitos Humanos (CMDH) da diocese de Roraima é o Centro de Referência para os imigrantes venezuelanos. O trabalho começa pela regularização e documentação dos imigrantes. Através de parceria com a Polícia Federal e Pastoral Universitária, auxilia no preenchimento dos formulários de solicitação de Refúgio e Residência Temporária. Encaminha para outras necessidades de documentação e presta serviço de assessorias diversas. Atende às famílias em situação de vulnerabilidade através de diversas ações e parcerias. Com o Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), oferece bolsas de subsistência. Com projetos da diocese e outros parceiros, além de doações da sociedade civil, distribui alimentos, roupas, calçados, brinquedos, livros e materiais escolares. Oferece orientações sobre as mais diversas demandas apresentadas pelos atendidos. Assessoria jurídica, assistencial e acompanhamento das famílias, com atendimentos na própria sede e visitas domiciliares. Oferece serviço de escuta e atende aos convites/chamados para aulas, palestras, incidência política, movimentos sociais e culturais. Formação profissional e de voluntariado, através de oficinas, com a temática migração e refúgio, lhes oferecendo apoio financeiro para o deslocamento para o Centro.
O senhor havia apresentado esta realidade aos bispos na reunião do Conselho Permanente, aqui em Brasília, e pontuou algumas questões. O que precisa ser feito e quais serão as ações concretas?
O primeiro desafio é a manutenção econômica de todas as ações desenvolvidas pelo CMDH, visto que a realidade da Diocese não dispõe de recursos suficientes, em vista da crescente demanda que se apresenta. Outro desafio é o atendimento humano de quem nos procura, visto que o CMDH não dispõe de estrutura para os atendimentos que realiza, principalmente para o atendimento das vulnerabilidades mais graves. Além disso, falta estrutura adequada para o armazenamento e distribuir as doações recebidas.
Talvez o desafio mais urgente é a condição de oferecer alimentos às famílias que nos procuram em busca de ajuda. Temos uma demanda diária e não conseguimos atender, visto que dependemos de doações e projetos, que não suprem as necessidades.
Mais um desafio é a incidência junto ao Poder Público, em busca da implementação de Políticas Públicas que atendam à realidade que estamos vivendo.
Recursos financeiros são o maior desafio, afinal. Embora busquemos projetos que sustentem tantas ações, muitas vezes nos falta a possibilidade de concretizar os projetos, por falta de recursos.
Nossas ações concretas serão a busca de parcerias para a continuidade de todo o trabalho, bem como o início das atividades da Pastoral do Migrante, que está sendo implementada na Diocese. Nossa missão é transformar a sociedade, superando a violência contra o imigrante que, como o Papa Francisco afirma, “não é um perigo, mas está em perigo”. Continuaremos despertando as comunidades para o desempenho de seu papel como cristãs.
Para doações em dinheiro, a diocese disponibilizou uma conta:
Diocese de Roraima
CNPJ 05.936.794/0001-13
Banco Do Brasil
Agência: 2617-4
Conta Corrente: 20.355-6
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“Desafio mais urgente em Roraima é oferecer alimentos às famílias”, constata bispo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU