08 Fevereiro 2025
Presidente isenta ministra no processo da licença para a Petrobras, mas insiste no equívoco de que petróleo da foz é necessário para a transição energética.
A reportagem foi publicada por ClimaInfo, 06-02-2025.
Os “desenvolvimentistas do século passado”, que defendem a exploração máxima de recursos minimizando os impactos socioambientais, acusam a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, de barrar o “progresso” do Brasil. Um discurso arcaico, colonialista, mas que cai como uma luva para os defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” no licenciamento do poço de combustíveis fósseis que a Petrobras quer perfurar no bloco FZA-M-59, na foz do Amazonas.
Na 4ª feira (5/2), porém, o presidente Lula saiu em defesa da ministra. Dois dias após se comprometer com o novo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), em “destravar” o quanto antes a licença para a petroleira perfurar no bloco, localizado no litoral amapaense, Lula disse, em entrevista a rádios de Minas Gerais, que Marina não é responsável pelo “atraso” na liberação do documento apontado. “Atraso”, claro, que só existe na visão dos “desenvolvimentistas”, já que o IBAMA, responsável pela análise, está apenas cumprindo o que determina a legislação ambiental brasileira.
“Há uma confusão na imprensa, sei lá causada por quem, de tentar jogar em cima da companheira Marina a responsabilidade pela não aprovação da exploração de petróleo na Margem Equatorial do Rio Amazonas [foz do Amazonas]. A Marina não é a responsável”, disse o presidente da República, em fala destacada por O Globo, Estadão e Eixos.
Desde que o IBAMA negou pela primeira vez a licença para a Petrobras perfurar um poço no FZA-M-59, em maio de 2023, Marina Silva vem sendo questionada, muitas vezes em tom acusatório. Em todas as vezes a ministra respondeu o óbvio, como mostrou mais uma vez O Globo: o IBAMA é um órgão de Estado – não de governo – que segue as leis. Como tal, suas decisões são tomadas após o cumprimento de uma série de ritos legais. Não é o IBAMA, ou o Ministério do Meio Ambiente (MMA), quem decide a política energética brasileira, já frisou várias vezes Marina. Logo, não é o IBAMA, ou o MMA, quem decide se o Brasil vai ou não explorar combustíveis fósseis na foz do Amazonas ou em qualquer outra bacia geológica brasileira.
Ao defender publicamente Marina, Lula mostra ter entendido suas competências. No entanto, o presidente voltou a falar em “solução” para a liberação da licença, o que continua alimentando que uma decisão técnica terá desfecho político.
Além disso, Lula voltou a repetir que o Brasil precisa do petróleo da foz do Amazonas, mesmo sem saber se de fato existem combustíveis fósseis lá. E que esse suposto petróleo é necessário porque será o dinheiro desse óleo que vai financiar a transição energética brasileira. O que é uma falácia, já que as fontes renováveis já dominam a matriz elétrica nacional sem qualquer centavo dos combustíveis fósseis.
Se de fato quiser usar dinheiro de petróleo e gás fóssil para investir em fontes renováveis de energia, bastaria ao governo redirecionar subsídios. Como mostra um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), para cada R$ 1 aplicado em subsídios pelo governo federal em fontes renováveis, outros R$ 4,52 são aplicados pelos cofres públicos na indústria de combustíveis fósseis – 82% do total.
Enquanto não é feito esse ajuste, necessário tanto pelo aspecto fiscal como pela necessidade climática, a pressão política pela licença para a Petrobras perfurar um poço na foz do Amazonas continua. Não à toa a presidente da petroleira, Magda Chambriard, disse no dia seguinte à promessa de Lula para Davi Alcolumbre que respondeu todas as demandas do IBAMA em novembro do ano passado, informam Valor e Agência Brasil. E que a Unidade de Estabilização e Despetrolização (UED) de Oiapoque (AP) requisitada pelo órgão ambiental deverá ficar pronta em março.
Questionado sobre prazos, já que há gente do governo dizendo que a licença para o FZA-M-59 sairá em 30 dias, o IBAMA informou na 3ª feira (4/2) que o pedido da Petrobras para explorar petróleo na foz do Amazonas ainda está em análise pela equipe técnica do órgão e que não há prazo para uma resposta, relata o g1. Algo que o presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, já havia dito antes. Mas que Davi Alcolumbre e a turma do governo que está com medo da repercussão de uma licença para explorar combustíveis fósseis no ano da COP30 parecem não [querer] escutar.
Folha, Valor e CNN também repercutiram o assunto.
Em tempo 1: Na mesma entrevista para rádios mineiras em que defendeu Marina Silva, o presidente Lula também elogiou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. Defensor ferrenho da exploração de combustíveis fósseis na foz do Amazonas, da conclusão das obras da usina termonuclear Angra 3 e até mesmo de implantar pequenos reatores atômicos para gerar eletricidade em comunidades isoladas da Amazônia, Silveira “é um ministro extraordinário” e “tem feito um trabalho excepcional” à frente da pasta, segundo Lula. Por isso, o ministro fica onde está, disse o presidente, dando fim às especulações sobre a saída de Silveira do MME, informam Valor, Estadão e Poder 360.
Em tempo 2: Mal foi elogiado por Lula e confirmado na pasta, Alexandre Silveira voltou a soltar a voz, a mesma que ficou muda durante as negociações para o Congresso retirar os “jabutis” que beneficiam gás fóssil e carvão do projeto de lei para regular as eólicas offshore. Assim, o ministro de Minas e Energia contou que o governo vai discutir em 18 de fevereiro a adesão do Brasil à Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (OPEP+), relata o g1. “É fundamental que a gente participe desses fóruns de discussão que nos permitem avançar em especial na visão estratégica de desenvolvimento econômico, com sustentabilidade e resultados sociais. Vemos a plataforma OPEP+ como uma plataforma fundamental para essa estratégia”, declarou o ministro. Já em relação à licença para a foz do Amazonas, Silveira disse à CNN que a Petrobras cumpriu todas as exigências do IBAMA e que acredita que a autorização saia “ainda este ano”. E o ano da COP30 está apenas começando…