19 Junho 2023
"A Companhia se livra do problema, mas não evita possíveis desfechos. Se a comunidade do Centro Aletti, formada pelo grupo dos jesuítas, por consagradas e um núcleo de padres não jesuítas, resistisse sem rachaduras; se pudesse ser encontrado um bispo, talvez nas áreas da Eslovênia ou da Croácia, que concordasse em incardinar na diocese o pe. Marko; se, além dele, o próprio bispo concordasse em reconhecer a comunidade em nível diocesano; então poderia haver um futuro para o Centro Aletti e para a sua produção artística. Os jesuítas do centro, evidentemente, também deveriam sair da Companhia", escreve Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por Settimana News, 18-06-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A Companhia de Jesus pode prescindir do Pe. Marko Rupnik, de seu brilhantismo artístico e de seu ministério? A resposta é “sim". A decisão da expulsão tomada em 9 de junho e publicada no dia 15 é prova disso.
O P. Rupnik pode prescindir de pertencer aos jesuítas? Pode-se dizer que "sim, se": se algumas condições forem atendidas.
As vítimas que denunciaram seu comportamento impróprio ficarão satisfeitas? Pode-se dizer que "não", visto que a expectativa que prevalece é a da demissão do estado clerical. Embora se possa apreciar a decisão da Companhia.
As perguntas das mídias vão parar? Muito provavelmente "não", devido às zonas cinzentas dos procedimentos e das disposições adotadas no caso, também em relação ao papel do Papa Francisco.
O comunicado dos jesuítas, assinada pelo responsável pelas comunidades que operam em Roma, pe. Johan Verschueren, anuncia a decisão do preposto geral de demitir o pe. Marko Ivan Rupnik. A decisão terá efeito um mês após a entrega da disposição ao interessado.
A censura grave é de natureza disciplinar e não penal. Esta última só pode ocorrer após um processo judicial que, no caso de abusos graves, cabe ao dicastério da doutrina da fé ou a um tribunal (diocesano ou interno às ordens) sob seu mandato.
O caráter disciplinar é sustentado pela motivação, “recusa obstinada em observar o voto de obediência”. É uma acusação verdadeira: o interessado não obedeceu às disposições que lhe dizem respeito: pregação, confissão, direção espiritual, celebrações públicas, atividade artística, viagens para fora da região onde fica Roma e o Vaticano.
Nunca atendeu aos repetidos convites do "grupo de referência" para encontros de esclarecimento, nem buscou diálogos com coirmãos, exceto aqueles da sua própria comunidade, nem aceitou as soluções propostas. Para surpresa de seus superiores, foi revelada a existência de uma empresa de sua propriedade, contrariando o direito canônico e religioso. Mas a violação do voto de obediência é uma acusação bastante genérica, que não entra no mérito das acusações de que Rupnik é objeto. E, portanto, não prejudica uma pluralidade de resultados.
É improvável imaginar que Rupnik recorrera da decisão, porque dificilmente seria aceito e, se fosse aceito, iniciaria uma longa série de investigações. Também iria contradizer o seu comportamento até agora.
No texto do comunicado, a questão dos abusos é considerada central para o trabalho do "grupo de referência". As denúncias vieram de diferentes fontes por fatos ocorridos em um período de mais de 30 anos. Somando os dois processos já concluídos, chega-se a mais de 20 testemunhos de vítimas. Sua credibilidade é considerada muito alta. Rupnik recusou-se a "mudar de comunidade e aceitar uma nova missão ... (também para) dar um sinal claro às numerosas pessoas ofendidas que testemunhavam contra ele, (e) para entrar num percurso de verdade".
A Companhia se livra do problema, mas não evita possíveis desfechos. Se a comunidade do Centro Aletti, formada pelo grupo dos jesuítas, por consagradas e um núcleo de padres não jesuítas, resistisse sem rachaduras; se pudesse ser encontrado um bispo, talvez nas áreas da Eslovênia ou da Croácia, que concordasse em incardinar na diocese o pe. Marko; se, além dele, o próprio bispo concordasse em reconhecer a comunidade em nível diocesano; então poderia haver um futuro para o Centro Aletti e para a sua produção artística. Os jesuítas do centro, evidentemente, também deveriam sair da Companhia.
A hipótese não é apenas fantasiosa, sobretudo se o bispo em questão não encontrasse forte oposição da Santa Sé. Mas há outra condição: a sustentabilidade econômica. As edições Lipa não são financeiramente relevantes e as atividades de retiros e semanas de formação estão em declínio. Mas o atelier Aletti Center já comunicou publicamente que pretende continuar a sua atividade, as viagens de Pe. Marko visam angariar novas obras e o centro de Santa Severa abriu a possibilidade de hospedagem também para turismo e férias.
Não é fácil imaginar que todas as condições mencionadas possam se confirmar e garantir um futuro. Tudo ainda pode implodir. São facilmente previsíveis reações bastante negativas nas comunidades locais, uma renovada "insistência" das mídias, e, acima de tudo, a reação das vítimas. A discussão sobre a possível “desmontagem” das obras de mosaico e a profunda perplexidade das áreas católicas até então simpatizantes da espiritualidade e das orientações do Centro Aletti são sinais bastante pesados.
As perguntas mais incômodas dizem respeito ao papel do papa no caso. Não convenceram nem mesmo suas palavras muito claras, ditas em entrevista à agência AP que, em janeiro passado, o questionou sobre o caso: "Não tive nada a ver com isso".
Não menos inquietadoras são as investigações sobre o papel do card. Tomáš Špidlík (1919 – 2010), grande amigo e protetor do Centro: algumas das vítimas afirmaram que ele sabia de tudo e não interveio.
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Rupnik: fora da Companhia. Artigo de Lorenzo Prezzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU