15 Setembro 2022
Que a guerra na Ucrânia não esteja destinada a terminar em breve também parecia claro para os 81 líderes religiosos reunidos em torno da gigantesca mesa do congresso das religiões em Nursultan, Azerbaijão. Até os sinais vindos do Patriarcado de Moscou indicam um horizonte de referência agora demasiado polarizado. Ouvindo o teor da mensagem enviada pelo Patriarca Ortodoxo Kirill e lida na sua ausência pelo Metropolita Antonij, número dois do Patriarcado, foram muitos que naquela sala não tiveram dúvidas a respeito. Afinal, Kirill continua sendo um dos principais defensores de Putin e, sem recuar um centímetro, reiterou que o conflito contra Kiev é moralmente justo também por atuar como barreira à corrupção moral do Ocidente.
A reportagem é de Franca Giansoldati, publicada por Il Messaggero, 14-09-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Praticamente o contra o mal: “Assistimos a distorções de fatos históricos e manipulações sem precedentes da consciência de massa. Não é por isso que há cada vez menos amor, misericórdia, compaixão na sociedade? Cada vez mais ouvimos e lemos no espaço público palavras cheias de ódio contra povos inteiros, culturas e religiões”. Em outra passagem, no entanto, a influência dos países que aderem à OTAN é indicada negativamente, embora não sejam explicitamente mencionadas: “O percurso de ditadura, rivalidade e confronto escolhido por alguns governantes deste mundo leva a humanidade à destruição. E nestas condições, é a fé que pode tornar as pessoas sóbrias, trazê-las de volta ao caminho do diálogo e da cooperação, porque nas religiões tradicionais os princípios morais fundamentais da existência humana permanecem inabaláveis”.
O Patriarca de Moscou nestes meses dramáticos desempenhou um papel importante, mostrando-se muito inflexível na defesa das medidas tomadas por Putin e oferecendo ao Kremlin anteparos de valores: desde a bênção das tropas, até homilias densas de referências, até o apoio espiritual.
O Metropolita Antonij chegou a Nursultan à frente de uma delegação para falar com o Papa sobre diálogo e perspectivas de paz, a tal discurso quis acrescentar uma nota pessoal que substancialmente refletia aquela do patriarca. Assim, denunciou o sistema de informação mundial que nas redes sociais criou um inimigo, apontando-o "com o dedo e expondo-o ao ódio de todos". Ele acrescentou que o mundo acabou assim sob a ameaça de um conflito global e a ameaça de uma catástrofe nuclear. Antonij se perguntou por que a comunidade mundial não presta mais atenção às injustiças nos países do terceiro mundo, ou às perseguições dos cristãos, ou investiga as raízes do terrorismo para realmente entender como conter as desigualdades na terra.
Claro que não faltaram polêmicas na sala. Especialmente quando o presidente cazaque, organizador do encontro das religiões - presentes budistas, ortodoxos, judeus, muçulmanos xiitas e sunitas, protestantes, luteranos, xintoístas, católicos - concedeu - como é tradição - uma série de prêmios às personalidades mais proeminentes que mais se distinguiram no diálogo entre os povos. O metropolita Antonij foi incluído na lista dos agraciados que, após receber o prêmio, teve uma longa conversa bilateral com o Papa Francisco em uma sala isolada. O presidente dos bispos poloneses Stanislaw Gadecki não conseguiu se segurar sobre a escolha de incluir o Patriarcado entre os premiados. “É algo totalmente negativo. Pelo que o premiam? Pelo diálogo? Todas as nossas tentativas nos últimos meses de dialogar com Putin e o Patriarcado não deram nenhum resultado. Pelo contrário, Kirill abençoou os soldados russos para irem combater contra seus irmãos. E, assim fazendo, não protegeu o povo russo. Uma linha que certamente não é a do diálogo. Estou muito surpreso com este prêmio, é algo grave”.
De qualquer forma, o encontro entre o Papa e Antonij serviu efetivamente para desfazer alguns nós depois das dificuldades que surgiram com a guerra que levaram ao cancelamento do encontro que Francisco e Kirill haviam programado em Jerusalém para junho. O Patriarca também ficou irritado com uma entrevista do Papa na qual ele foi definido como coroinha do estado, praticamente um fantoche de Putin, de acordo com uma tradução errada do italiano para o russo que inicialmente teve o efeito de enfurecer o Patriarca. Em Nursultan, o número dois do Patriarcado tenta desatar os nós e imagina um encontro para o futuro, deixando claro que o anterior “foi impossibilitado pelo Vaticano. Para a próximo, agora teremos que trabalhar juntos”.
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Rússia, Patriarca Kirill contra governos da OTAN: "Suas escolhas levarão à destruição" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU