28 Junho 2022
O preço da guerra é medido em vidas. Sabem disso no Afeganistão e comprovaram o mesmo no Iraque. Na Líbia também, onde os mísseis da OTAN, em nome da liberdade, deixaram um rastro de morte entre aqueles que, paradoxalmente, pretendiam libertar. São crimes impunes que a Aliança Atlântica nunca quis esclarecer.
A reportagem é de Danilo Albin, publicada por Público, 26-06-2022. A tradução é do Cepat.
A poucos dias dos membros da OTAN se reunirem em Madri, sob rigorosas medidas de segurança, o jornal Público teve acesso a um relatório do Instituto Watson, um prestigioso centro de estudos sobre assuntos internacionais, da Universidade Brown, com sede em Rhode Island (Estados Unidos).
O mencionado instituto realiza um acompanhamento detalhado do número de mortes decorrentes das principais intervenções militares lançadas pelos Estados Unidos e a OTAN, após os atentados de 11 de setembro de 2001. Essas campanhas militares ocorreram em cenários como Afeganistão, Paquistão, Iraque e Síria.
De acordo com os números abordados nesse relatório - elaborado a partir de diferentes fontes de dados consultadas por seus autores -, estima-se que 350.800 civis desses países “morreram de forma violenta em consequência das guerras”. “As pessoas que vivem em zonas de guerra foram assassinadas em suas casas, nos mercados e nas estradas. Morreram por causa de bombas, balas, fogo, artefatos explosivos improvisados e drones”, descreve o Instituto Watson.
As vítimas civis também incluem aqueles que “morrem em postos de controle, quando são retirados da estrada por veículos militares, quando pisam em minas ou bombas de fragmentação, quando coletam lenha ou cuidam de seus campos e quando são sequestrados e executados por vingança ou intimidação”. Todos “assassinados pelos Estados Unidos, por seus aliados e pelos insurgentes e sectários nas guerras civis produzidas pelas invasões”.
O pesadelo não termina quando a bomba explode ou alguém dispara sua arma. “A guerra também pode levar à morte semanas ou meses após as batalhas”, descreve. “Muitas vezes, morrem mais pessoas em zonas de guerra em consequência das infraestruturas danificadas e das más condições sanitárias, provenientes das guerras, do que diretamente de sua violência”.
Só a aventura no Afeganistão, lançada pelos Estados Unidos e a OTAN, em 2001, deixou um saldo de 46.319 civis assassinados. Estima-se que outras 185.000 pessoas que não estavam lutando em nenhum dos lados morreram no Iraque. Na Síria, o número chega a 95.000. No Paquistão, foram registradas até 24.099 mortes.
A Líbia foi outro cenário escolhido pela OTAN para intervir com suas máquinas de guerra. Em março de 2011, vários Estados membros da Aliança Atlântica – entre eles, Estados Unidos, Reino Unido e França – iniciaram uma série de ataques marítimos e aéreos contra as forças do coronel Muammar Kadafi.
“Segundo a OTAN, em sua campanha militar aérea e marítima de sete meses, mais de 9.700 missões de combate foram realizadas e mais de 5.900 alvos militares foram destruídos”, aponta um relatório publicado um ano depois pela Anistia Internacional.
A organização de direitos humanos documentou que os ataques da OTAN provocaram a morte de “dezenas de civis líbios que não participavam diretamente das hostilidades”, enquanto outros ficaram feridos.
Em janeiro e fevereiro de 2012, uma delegação da Anistia Internacional visitou vários locais situados dentro ou perto das cidades de Trípoli, Zlitane, Sirte e Brega, “nos quais parecia ter havido vítimas civis em consequência de ataques da OTAN”. Lá, inspecionou os danos causados e os restos de projéteis, entrevistou sobreviventes dos ataques e outras testemunhas, e obteve cópias das certidões de óbito das vítimas.
Após essa visita, a Anistia Internacional conseguiu registrar um total de 55 mortes de civis, incluindo 16 crianças e 14 mulheres. De fato, “dezenas de civis morreram em ataques aéreos da OTAN contra casas particulares em zonas residenciais e rurais”, apontava o relatório.
A Aliança Atlântica admitiu que havia matado civis na Líbia com base em uma “falha técnica”. Tudo chegou a esse ponto. Não houve investigação independente, nem consequências de qualquer tipo para aqueles que cometeram tais atrocidades.
“A OTAN não presta contas e nem repara danos em casos de operações como as realizadas na Líbia. Ninguém fez nenhuma investigação, muito menos independente, sobre o custo do sofrimento dessas intervenções”, afirma Alejandro Pozo, pesquisador do Centro Delàs de Estudos pela Paz e autor de La guerra contra el terror (Icaria).
O trabalho realizado pela Universidade Brown também incide no número de deslocamentos provocados pelas intervenções militares realizadas pelos Estados Unidos e a OTAN desde 2001. Segundo esse relatório, as guerras posteriores ao 11-S “deslocaram à força ao menos 38 milhões de pessoas”, em lugares como Afeganistão, Iraque, Paquistão, Líbia e Síria. Esse número, destaca o estudo, “supera os deslocados por todas as guerras desde 1900, exceto a Segunda Guerra Mundial”.
Entre outros aspectos, o relatório destaca que os refugiados de guerra “costumam perder o acesso a um fornecimento estável de alimentos ou a seus empregos, o que provoca um aumento da desnutrição e da vulnerabilidade a doenças”. São as outras consequências das guerras do século XXI.
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As guerras dos Estados Unidos e da OTAN deixam mais de 350.000 mortos e 38 milhões de deslocados no século XXI - Instituto Humanitas Unisinos - IHU