07 Dezembro 2021
"Muitas vezes, a incapacidade de alimentar a chama do amor leva ao congelamento de todo vínculo e à dissolução da própria substância do matrimônio."
A opinião é do cardeal italiano Gianfranco Ravasi, prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado em Il Sole 24 Ore, 05-12-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A vida de família perde toda a liberdade e a beleza quando se funda no princípio do “eu te dou” e “tu me dás”.
Se vocês temem a solidão, não se casem!
Essas são duas considerações duras sobre a família. Elas nascem também do pessimismo dos respectivos autores e do seu contexto; no entanto, contêm uma verdade até óbvia que merece atenção. O tema da vida de família, de fato, é delicado e requer um compromisso sério e severo, mesmo no meio das alegrias e satisfações que também envolve.
Capa do livro “Casa de bonecas” (1879),
do escritor norueguês Henrik Ibsen
(Foto: Editora Moinhos)
A primeira frase é retirada do drama “Casa de bonecas” (1879), do famoso escritor norueguês Henrik Ibsen, uma história de falsidade, mesquinhez, chantagem e hipocrisia. No fim, assiste-se ao esfacelamento de uma família, e uma das raízes mais vigorosas dessa crise está justamente no interesse e no egoísmo. Se, em família, desaparece a gratuidade do amor, a generosidade e a reciprocidade, é inevitável que se perca todo frescor, liberdade e beleza do estar junto e se reduza a uma “sociedade” regida por uma espécie de contrato rígido e exigente.
Pode-se, então, cair no outro vício delineado com intrépido orgulho por Anton Tchekhov nas anotações dos seus “Cadernos”. O célebre escritor russo, que cresceu em uma família dividida e desfavorecida, teme aquela terrível solidão a dois que às vezes desfigura o casal e faz isso com aquele seu conselho paradoxal de não se casar para, no fim, não ficar sozinho.
O fato é que, muitas vezes, a incapacidade de alimentar a chama do amor leva ao congelamento de todo vínculo e à dissolução da própria substância do matrimônio.
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Vida de família. Artigo de Gianfranco Ravasi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU