24 Novembro 2021
Na mais recente edição dos Cadernos IHU Ideias (número 326), o Prof. Dr. Oswaldo Giacoia Junior (Unicamp e PUCPR) reflete sobre a “Técnica e a Ética no contexto atual” a partir da obra seminal de Hans Jonas intitulada “O Princípio Responsabilidade. Ensaio de uma Ética para a Civilização Tecnológica”. Segundo Giacoia, vários conceitos levantados por este filósofo nesta obra podem iluminar os desafios contemporâneos oriundos da transição climática ou do Antropoceno, como alguns pesquisadores preferem classificar nossa época.
“Em 1979, quando Hans Jonas publicou O Princípio Responsabilidade. Ensaio de uma Ética para a Civilização Tecnológica, noções como heurística do medo, a contraposição entre responsabilidade e esperança, assim como a postulação de um direito próprio da natureza constituíam perspectivas marcadamente inovadoras nos planos da filosofia, das ciências, da ética, da política e da educação. Penso que continuam a sê-lo ainda hoje”, escreve Giacoia.
“Em ligação com tais noções, apresenta-se um dos aspectos mais característicos na obra de Hans Jonas: a crítica do antropocentrismo hegemônico na tradição ético-religiosa e filosófico-política do Ocidente, que se desdobra numa proposta de revisão de seu estatuto, sem implicar, no entanto, uma depreciação do humanismo, e menos ainda uma negação do valor da dignidade humana. Com a postulação de um direito próprio da natureza, Jonas tem em vista uma prerrogativa inerente às entidades naturais e à vida em geral – às futuras gerações, de seres humanos e não humanos -, que revoluciona as categorias assentes, tanto jurídicas quanto ético-filosóficas, e que resulta numa reconsideração do humanismo como perspectiva filosófica”.
Hans Jonas cria um sistema de direitos capaz de abarcar não apenas aspectos geológicos, biológicos, antropológicos e tecnológicos e suas eventuais conjugações, mas extrapola o direito como um fio condutor e garantidor da vida e da dignidade dos seres e das gerações ainda por vir. “A posição de Jonas a este respeito é efetivamente sui generis, pois difere essencialmente, quanto aos seus fundamentos, das múltiplas variantes das éticas, ao ampliar seus limites, pela atribuição de relevância moral – e, por conseguinte, valores, direitos e prerrogativas - não apenas a seres não-humanos, como às demais espécies naturais, com inclusão do conjunto dos ecossistemas, mas também a entidades inexistentes, como, por exemplo, as futuras gerações de seres humanos e não humanos”.
Imagem: Capa dos Cadernos IHU Ideias número 326, de Oswaldo Giacoia Junior.
“Na ótica do antropocêntrico tradicional, não faria sentido estender de tal modo o campo da responsabilidade, pois este conceito estaria vinculado ao plano das relações humanas, único âmbito de atuação de sujeitos éticos. É o que pensa, por exemplo, Jürgen Habermas: ‘A comunidade de seres morais, que outorgam leis a si mesmos, reporta-se, na linguagem de direitos e deveres, a todas as relações que carecem de regulação normativa; entretanto, apenas os membros dessa comunidade podem obrigar-se reciprocamente em termos morais, e esperar um do outro um comportamento conforme às normas’”, assevera Giacoia.
“A urgência metafísica de uma heurística do medo, em Hans Jonas, formula-se na contracorrente de um tal entendimento, e se assevera perante a iminência da possibilidade de destruição das condições de uma vida autenticamente humana sobre a terra, fazendo apelo à necessidade da introdução de novos marcos regulatórios da ação coletiva, princípios e estratégias normativas de alcance nacional e internacional. O reconhecimento de um direito próprio da natureza é uma medida urgente em face do perigo representado pelo potencial destrutivo da moderna tecnociência, com sua ampla capacidade de devastação. Esta vulnerabilidade radical é o anverso de um dever de proteção, ancorado num senso amplo de responsabilidade ética e jurídica, brotado da desmesura deste poder”.
Confira o texto na íntegra, aqui.
Oswaldo Giacoia Junior. Professor Titular do Departamento de Filosofia da Unicamp desde 2013 e professor do Programa de Pós Graduação em Filosofia da PUCPR desde 2020. Graduado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1976), em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (1976). Mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1983) e Doutor em Filosofia pela Freie Universität Berlin (1988). Pós-doutorado pela Freie Universität Berlin (93-94), Viena (97-98) e Lecce (2005-2006).
Sua pesquisa concentra-se na área de Filosofia Moderna e Contemporânea, com ênfase em História da Filosofia, Ética e Filosofia do Direito, ocupando-se de temas como: teoria da cultura, ética pura e aplicada, filosofia do direito, filosofia social, política e da história, filosofia clássica francesa e alemã, especialmente com as obras de Augusto Comte, Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietzsche.
Dentre as diversas publicações do professor, destaca-se os cinco últimos lançamentos: Agamben. Por uma Ética da Vergonha e do Resto, pela editora São Paulo, 2018; Política. Nós Também (Não) Sabemos Fazer, pela editora Petrópolis: Vozes, 2018; A Escola de Kyoto e suas Fontes Orientais, publicado pela editora Campinas: PHI, 2017; Budismo e Filosofia em Diálogo, pela editora Campinas: PHI, 2014; Heidegger Urgente. Introdução a um Novo Pensar, publicado pela editora São Paulo: Três Estrelas, 2013.
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Técnica e Ética no contexto atual. Artigo de Oswaldo Giacoia Junior - Instituto Humanitas Unisinos - IHU