02 Setembro 2021
“Desejo que todos nós vivamos este Tempo da Criação com os olhos, com o coração e com seus pés. Com os olhos, para que possamos amadurecer um olhar contemplativo sobre a natureza. Com o coração, para que possamos ouvir o grito da terra que se une ao dos pobres. Com os pés, para não ficarmos parados, prisioneiros dos velhos paradigmas, mas tenhamos a coragem de caminhar rápidos, aliás, de correr para um novo horizonte mais humano. E fazer isso juntos”.
O ensejo é do Padre Josh Kureethadam, coordenador do setor de Ecologia e Criação do Dicastério para Serviço de Desenvolvimento Humano Integral (disponível aqui, aqui e aqui). Dedicado ao tema “Andemos nós também em novidade de vida (Rm 6,4). A transição ecológica para o cuidado da vida”, o atual décimo sexto dia nacional de cuidado da criação (que está ligado ao dia mundial de oração, instituído pelo Papa Francisco em 2015) e os trinta e quatro dias sucessivos dedicados à reflexão sobre a casa comum acontecem em um momento crucial.
Há poucas semanas, 234 especialistas, reunidos sob a égide da ONU no Painel Internacional sobre Mudanças Climáticas (IPCC), lançaram um código vermelho para o mundo: uns poucos anos mais e será impossível controlar o aquecimento global. Para evitar o pior, daqui há dois meses, os líderes internacionais serão chamados para decidir na Conferência do Clima da ONU (COP26), em Glasgow, quais ações concretas tomar. “A angústia pela situação ambiental é grande: estamos à beira do abismo - sublinha o padre Josh -. Mas também tenho uma forte esperança”.
A entrevista com Josh Kureethadam é editada por Lucia Capuzzi, publicada por Avvenire, 01-09-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
O que lhe dá esperança?
Tenho o hábito de recitar todos os dias o Salmo 127 e muitas vezes me detenho na frase: "Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam". A nossa "casa comum" tem um ótimo construtor: Deus, claro que também nós devemos ser bons co-jardineiros... É também um sinal de esperança que o Tempo da Criação tenha um caráter ecumênico. O empenho de cuidar da criação é mais forte do que qualquer divisão. Com este espírito, no dia 4 de outubro, haverá um grande encontro de líderes religiosos no Vaticano.
No entanto, mesmo agora, muitos cristãos, incluindo tantos católicos, estão se perguntando o que ecologia tem a ver com a fé ...
É bastante estranho. O Cristianismo não é um espiritualismo vago, é a religião da Encarnação. O mundo diz respeito a nós. Os sofrimentos dos pobres nos dizem respeito, porque Cristo se identifica com eles. E entre esses pobres, está a nossa casa comum, tão ferida. Ficar indiferente a esta dor significa ignorar a dor de Jesus.
A mensagem da Igreja italiana para este Dia centrou-se no conceito de transição ecológica. O que isso significa?
O caminho para implementar uma transição ecológica autêntica, e não um simples slogan, é aquele indicado na Laudato Si'. Implica, em primeiro lugar, ver a crise ambiental e a crise social como uma emergência única. Exige também um olhar contemplativo sobre a realidade: não é simples matéria inerte, mas palpitante obra de Deus. Os Padres da Igreja recordavam-nos que o Senhor se revela em duas obras: o livro das palavras, ou seja, as Escrituras, e o livro de obras, a Criação. Para isso, é necessário que esses temas se tornem parte integrante da formação, da catequese e dos estudos. A abordagem também deve ser comunitária.
Não podemos “terceirizá-la” apenas a políticos e especialistas. Somos "ecclesia", ou seja, uma comunidade e, como tal, devemos assumir a responsabilidade pela nossa casa comum. Portanto, todos devemos contribuir para a mudança do paradigma tecnocrático, caso contrário, as mudanças serão apenas retoques cosméticos. Daí o empenho em mudar os nossos estilos de vida.
Quando se trata de mudar o paradigma e os estilos de vida, muitos agitam o espectro da destruição do sistema econômico e de um empobrecimento geral. Economia e ecologia são realmente incompatíveis?
É exatamente o oposto. Os especialistas dizem isso e nós vemos com nossos próprios olhos: onde a terra sofre, sofrem as populações que nela habitam. Isso não quer dizer que a transição ecológica não tenha custos. Ela os tem: entre 3 e 5% do PIB mundial, dizem os especialistas. No entanto, o aquecimento global nos custa três ou quatro vezes mais: entre 15 e 20% do PIB mundial.
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“Onde a Terra sofre, sofrem as pessoas que nela habitam”. Entrevista com Josh Kureethadam - Instituto Humanitas Unisinos - IHU