26 Mai 2021
"Ao lado das grandes riquezas que são produzidas, a degradação ambiental cresce em uma progressão geométrica. A humanidade vive uma das maiores encruzilhadas da história humana. Das duas uma: ou nos salvamos todos ou pereceremos todos. Desta vez não haverá uma arca de Noé para salvar um casal de cada espécie. Em 2002, Leonardo Boff já advertia: 'Ou o ser humano se torna o anjo protetor da Mãe Terra e da Irmã Água ou ele será o anjo exterminador da nossa única casa comum, o planeta Terra'. Ou recriamos a vida com relações sociais justas e estruturas de fraternidade ou vai acontecer a extinção da raça humana com uma infinidade de outras espécies.", escreve Frei Gilvander Moreira [1], 25-05-2021.
Gilvander Moreira é Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente da CPT, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH e de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG.
Está gravemente ferido e sendo torturado cotidianamente o paraíso terrestre criado por Deus nas ondas da evolução, Planeta Terra, nossa Única Casa Comum. A utilização abusiva de produtos químicos está envenenando os solos e as águas. O excesso de gás carbônico decorrente das indústrias e a destruição das florestas tropicais comprometem inexoravelmente a saúde da estratosfera e reduzem a fotossíntese, que fabrica o oxigênio essencial à nossa vida. A própria existência do ser humano está em perigo. A humanidade vive em alto risco. A vida na terra está ameaçada. Em 1945 aconteceu um dos maiores atos de terrorismo de Estado: as bombas atômicas jogadas sobre as cidades japonesas de Hyroshima e Nagasaki.
Em 2006, a Ong WWF divulgou relatório anual sobre as condições de vida e capacidade dos bens naturais e comuns do Planeta Terra. Quinze anos atrás, as informações reveladas já eram alarmantes: “os seres humanos já usam recursos naturais a uma taxa 25% maior do que a capacidade do planeta de regenerá-los.” Se não houver uma mudança de modelo de desenvolvimento e de comportamentos, em 2050 “a Humanidade precisará de dois planetas Terra para prover suas necessidades.” Demonstrou também que entre 1970 e 2003, o planeta perdeu 30% de sua diversidade biológica, “o que indica que as extinções de espécies estão se acelerando.”[2]
O relatório do “Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas” (IPCC)[3], de 02 de Fevereiro de 2007, já era de alerta máximo. As calotas polares de gelo estão se derretendo, no polo Norte e no polo Sul. Mudanças climáticas para pior estão acontecendo de forma muito rápida. As ondas e os ventos estão mudando em frequência e força. Alertavam que “haverá tempestades muito fortes, furacões, mais calor”, porque a produção industrial depende de combustíveis fósseis, como petróleo e carvão ou gás mineral, associada ao desmatamento em grande escala. A “Revolução Industrial” e o desenvolvimento econômico capitalista estão destruindo o mundo e a própria humanidade.
“Nós perdemos a comunhão com o planeta”, afirmou o fotógrafo mineiro Sebastião Salgado, ao apresentar o projeto “Gênesis”, exposição de 40 fotos inéditas, em 2006, em Belo Horizonte: “Meu objetivo é encontrar e revelar um mundo onde a natureza e os animais vivem em equilíbrio ecológico. É absurda esta noção moderna de que humanidade e natureza estão, de alguma maneira, separadas. Nosso relacionamento com a natureza e com nós mesmos está em crise”, advertia o fotógrafo. “O projeto “Gênesis” é uma tentativa de reconectar nossa espécie com nosso planeta. Estou me dedicando a este mundo de pureza com o objetivo de registrar as faces imaculadas da natureza e da humanidade”, apontava Salgado.[4]
Diz a sabedoria popular: na frente estão as matas, depois o ser humano passa e deixa um deserto atrás de si. Crise hídrica já se sente no mundo inteiro, salvo raríssimas exceções. Em muitas regiões já se experimenta o colapso hídrico. Pressionando por privatização, as empresas transnacionais estão de olho gordo no “petróleo azul”: a água. Em alguns lugares do planeta a água já é controlada com poder das armas. A vida na Terra está ameaçada, a nossa única casa comum está ficando sem esse combustível sagrado: a água.
Ao lado das grandes riquezas que são produzidas, a degradação ambiental cresce em uma progressão geométrica. A humanidade vive uma das maiores encruzilhadas da história humana. Das duas uma: ou nos salvamos todos ou pereceremos todos. Desta vez não haverá uma arca de Noé para salvar um casal de cada espécie. Em 2002, Leonardo Boff já advertia: "Ou o ser humano se torna o anjo protetor da Mãe Terra e da Irmã Água ou ele será o anjo exterminador da nossa única casa comum, o planeta Terra".[5] Ou recriamos a vida com relações sociais justas e estruturas de fraternidade ou vai acontecer a extinção da raça humana com uma infinidade de outras espécies.
Ignorando totalmente a realidade descrita acima, obcecados pela idolatria do mercado, para atender à ganância dos agronegociantes, no meio da pandemia da covid-19, na calada da noite, dia 13 de maio de 2021, Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo Estrutural e Institucional, 70% dos/as deputados/as da Câmara Federal (300 votos a favor e 122 contra) aprovaram o Projeto de Lei 3.729/2004, sem debate junto à comunidade científica e atropelando os coletivos e movimentos socioambientais, associações de comunidades tradicionais e povos originários, desrespeitando o direito internacional de Consulta Livre, Prévia e Informada, garantida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da ONU, configurando um grande desrespeito a todo o povo brasileiro e expedindo “aviso prévio” para o aumento vertiginoso da devastação ambiental ao arrepio das leis ambientais atuais, violando a Constituição, inclusive, exterminando as condições de vida em um futuro breve.
O PL 3729, na prática, acaba com o licenciamento ambiental no país, deixando a "boiada passar". Viola o art. 225 da Constituição, que diz: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Já está demonstrado cientificamente que foi o exagero de desmatamento que fez eclodir a pandemia da covid-19 que, potencializada pela política genocida do desgoverno federal, já ceifou a vida de mais 460 mil brasileiros/as.
Esse PL famigerado, que não faz sequer menção às mudanças climáticas do planeta, propõe isenção de licenciamento ambiental (dispensa de Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação e do parecer técnico de especialistas dos órgãos ambientais) em treze tipos de atividades brutalmente impactantes, entre elas: a agricultura mercadológica, a monocultura de eucalipto, a pecuária extensiva, outorga sobre o uso das águas, obras de saneamento básico, construção de estradas, portos e de redes de distribuição de energia. Cria e torna regra a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), “licenciamento autodeclaratório” emitido pela própria empresa, via internet, “para inglês ver”. Um grande absurdo que restringe a atuação de órgãos fundamentais como ICMBIO [6], FUNAI [7], IPHAN [8], Ministérios da Agricultura e da Saúde. Ameaça Unidades de Conservação, Terras Indígenas não demarcadas (41%), Territórios Quilombolas não titulados (87%), ao desobrigar estudos e laudos socioambientais nessas áreas de multiespécies e territórios tradicionais. Assim, o PL 3729/04 flexibiliza indiscriminadamente as regras para liberação de obras com o objetivo de favorecer o agronegócio, grandes empreendimentos econômicos, mineradoras, entre outros setores empresariais capitalistas. Mais do que nunca precisamos defender a Floresta Amazônica, o Cerrado, a Mata Atlântica, a Caatinga, o Pantanal, os Pampas e todos os seres vivos que lutam e vivem nesses biomas.
Defender a preservação ambiental tornou-se necessidade para garantirmos condições objetivas de vida. Considerar “autodeclaração” de empresários e empresas como se fosse licenciamento ambiental é “colocar raposa para cuidar de galinheiro”. Flexibilizar ainda mais o licenciamento ambiental é um atentado irreversível aos biomas e a todo o povo. Se for aprovado também no Senado Federal, o PL 3729 permitirá que processos que garantem a proteção do meio ambiente sejam fragilizados ainda mais, aumentando o risco de grandes impactos para povos indígenas, quilombolas, Unidades de Conservação e serão abertas as porteiras para a implementação de grandes projetos do interesse do grande capital à revelia da preservação ambiental. Por isso, exigimos que o PL 3729 seja rejeitado no Senado Federal, pois é um retrocesso inadmissível com relação às leis de crimes ambientais. Basta de devastação ambiental! Não ao PL 3729/04. Exigimos seu veto, já!
1 - "Exigimos que o Senado rejeite o PL 3729. Desmonte do Licenciamento Ambiental, NÃO" (Frei Gilvander)
2 - Atingidos/MAB na luta contra ArcelorMittal, em Itatiaiuçu, MG = Vale S/A. REPARAÇÃO JUSTA! - 19/5/21
3 - Quilombo Pontinha, Paraopeba, MG, exige REPARAÇÃO INTEGRAL da Vale. Renato Moreira-Vídeo 2 - 15/5/21
4 - "Rodoanel em BH e RMBH, absurdo dos absurdos: mais crimes sociambientais"-José Geraldo, MAB-Vídeo 15
5 - Quilombo Pontinha, em Paraopeba, MG, violentado pela Vale S/A. (Renato Moreira) – 13/5/2021 –Vídeo 1
6 - Lugares, Pessoas, Bens Naturais e Culturais Ameaçados pelo Rodoanel de BH e RMBH: a ALÇA SUL
7 - Luta contra a mineração em Minas Gerais e na Amazônia e os territórios indígenas
8 - Frei Gilvander aponta brutal devastação socioambiental que Rodoanel causará em BH e RMBH - Vídeo 5
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Sem Licenciamento Ambiental, futuro exterminado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU